Neste ano, a 23edição do Prêmio Guarani de Cinema Brasileiro registrou 40 filmes – 30 longas brasileiros, 5 estrangeiros e 5 curtas nacionais – indicados em ao menos uma categoria, um verdadeiro recorde para a premiação. No entanto, em 2017 nada menos do que 149 produções em longa-metragem feitas do país chegaram ao circuito comercial – ou seja, quase 120 ficaram de fora da lista dos melhores da temporada, eleitos por dezenas de críticos de cinema de norte a sul do Brasil. E quais desses ‘esquecidos’ são donos de qualidades mais do que evidentes e que, se não fosse a forte concorrência – sinal de vitalidade dos nossos realizadores – certamente teriam sido agraciados com algumas indicações? A lista é grande, e certamente causará surpresa nos menos atentos.

Talvez as ausências mais chocantes sejam as de títulos como A Cidade Onde Envelheço, de Marília Rocha, grande vencedor do Festival de Brasília, Pendular, de Julia Murat, premiado no Festival de Berlim, e Beduíno, do mestre Julio Bressane, todos sem nenhuma indicação. Ainda na categoria de Melhor Filme, causou estranheza as ausências de Era o Hotel Cambridge (que recebeu um total de 6 indicações, inclusive à Melhor Direção), Martírio (um dos favoritos como Documentário, mas com tantos defensores que poderia muito bem estar também na categoria principal), e Gabriel e a Montanha (que, ainda que premiado no Festival de Cannes, recebeu apenas duas indicações).

Duas categorias inéditas movimentaram o Prêmio Guarani neste ano: Melhor Curta-metragem e Melhor Longa de Animação. Na primeira, como foi possível ter ficado de fora títulos como Vando Vulgo Vedita, vencedor da Mostra de Tiradentes, Diamante: O Bailarina, premiado no Cine PE, e Borá, reconhecido no Festival do Rio? Entre as animações, haviam grandes chances de As Aventuras do Pequeno Colombo, premiado no Cine PE, e Bruxarias, uma co-produção com a Espanha, conseguirem uma vaga, o que acabou não acontecendo. Também foi curiosa a situação dos Filmes Estrangeiros: nada menos do que 13 títulos dos Estados Unidos foram citados pelos críticos votantes, porém nenhum obteve a quantidade suficiente de votos para se posicionar entre os cinco finalistas. Longas como Silêncio, de Martin Scorsese, e os oscarizados Corra!de Jordan Peele, Moonlight: Sob a Luz do Luar, de Barry Jenkins, e La La Land: Cantando Estações, de Damien Chazelle, foram alguns dos lembrados. Outros sucessos recentes, como o canadense Blade Runner 2049, de Denis Villeneuve, e o sul-coreano Na Praia À Noite Sozinha, de Hong Sang-soo, premiado no Festival de Berlim, e o inglês Eu, Daniel Blake, de Ken Loach, vencedor do Festival de Cannes, foram outros que por muito pouco não ficaram entre os cinco concorrentes finais.

Cena dos bastidores de Pendular, de Julia Murat

E entre as atuações, quais são as ausências mais notadas? Raquel Karro e Rodrigo Bolzan, de Pendular, certamente estão entre elas. Romulo Braga, premiado no Festival de Brasília por Elon Não Acredita na Morte, era um que ninguém imaginava que pudesse ficar de fora. O drama Entre Irmãs é centrado em duas personagens femininas, porém apenas Marjorie Estiano foi indicada – e o que aconteceu com Nanda Costa? Selton Mello foi citado tanto por Soundtrack como por O Filme da Minha Vida. Daniel Furlan foi revelado com dois filmes – La Vingança e TOC: Transtornada Obsessiva Compulsiva– e as duas protagonistas de A Cidade Onde Envelheço, Elizabete Francisca e Francisca Manuel, possuem performances tão equilibradas que provavelmente dividiram os votos, uma eliminando as chances da outra. Gigante Léo, de Altas Expectativas, e Tom Karabachian, de Fala Comigo, também foram revelações marcantes, que poderiam ter sido lembradas.

Carolina Ferraz é dona absoluta de A Glória e a Graça, em que interpreta uma travesti. Já Camila Morgado, por Divórcio, e Tatá Werneck, por TOC, estão hilárias. Seria preconceito dos votantes do Guarani contra produções de comédia? Afinal, Murilo Benício (Divórcio) e Jesuíta Barbosa (Malasartes e o Duelo com a Morte) também ficaram de fora. E o que dizer de Cauã Reymond, por Não Devore Meu Coração, ou Alexandre Nero e Rodrigo Pandolfo, a dupla de João: O Maestro, todos igualmente ignorados? Entre as mulheres, outra que acreditava-se que teria mais forças era Sabrina Greve (Clarisse ou Alguma Coisa Sobre Nós Dois), da mesma forma que a veterana Irene Ravache (Yvone Kane). Leandra Leal, indicada duplamente, por Bingo: O Rei das Manhãs e por Éden, foi lembrada também por Love Film Festival!

Elisabete Francisca e Francisca Manuel em cena de A Cidade Onde Envelheço

Entre os coadjuvantes, quem mais chegou perto foi Denise Fraga (Fala Comigo) e Dira Paes (Redemoinho), nas mulheres, e Lima Duarte (Deserto), Augusto Madeira (Bingo: O Rei das Manhãs e Malasartes e o Duelo com a Morte) e Felipe Rocha (Como Nossos Pais). Sandra Corveloni poderia ter emplacado tanto por A Glória e a Graça como por Vazante, assim como Vera Holtz viu seus votos serem divididos entre TOC e Malasartes e o Duelo com a Morte. Magali Biff teve que concorrer com sua colega de elenco Cida Moreira, ambas de Deserto, enquanto que Letícia Colin e Cyria Coentro, as duas de Entre Irmãs, também dividiram votos. Julio Andrade, indicado por Redemoinho, concorria com ele mesmo por Éden e Malasartes e o Duelo com a Morte, enquanto que Everaldo Pontes recebeu votos por Comeback e por Clarisse ou Alguma Coisa Entre Nós Dois. A uruguaia Veronica Perrota (Mulher do Pai), premiada no Festival do Rio, o inglês Ralph Ineson (Soundtrack) e o francês Vincent Cassel (O Filme da Minha Vida), além das portuguesas de A Cidade Onde Envelheço, foram os estrangeiros lembrados neste ano, mas nenhum com força suficiente para se qualificar para a próxima fase.

O cineasta Marcelo Caetano foi o artista com o maior número de indicações neste ano – ele concorre em quatro categorias (Filme, Elenco, Roteiro Original e Trilha Sonora), todas por Corpo Elétrico – e como pode, ainda assim, ter sido esquecido? Sim, pois o longa, mesmo com sete indicações (e, entre elas, a Melhor Filme), ficou de fora da de Melhor Direção. Julia Murat (Pendular), Marcelo Gomes (Joaquim) e até a novata Leandra Leal (Divinas Divas) foram outros que chegaram perto, mas não o suficiente. Fellipe Gamarano Barbosa (Gabriel e a Montanha) foi bem lembrado tanto para Direção como para Roteiro Original, assim como Não Devore Meu Coração e a animação Historietas Assombradas chegaram perto de concorrer a Roteiro Adaptado. PendularJoaquim e Mulher do Pai por pouco não entraram na disputa de Roteiro Original. E o que dizer de Pitanga, de Beto Brant e Camila Pitanga, que não conseguiu se posicionar entre os Documentários? Antigos premiados do Guarani, como Walter Carvalho (Um Filme de Cinema) e Jorge Furtado (Quem é Primavera das Neves?) também tiveram seus defensores.

Antonio Pitanga em cena do documentário Pitanga. Mas será que ele foi, mesmo, esquecido?

Como se pode perceber por esse apanhado, a concorrência foi intensa na maior parte das disputas. O 23Prêmio Guarani de Cinema Brasileiro elegeu seus indicados em cada uma das 22 categorias a partir da consulta com os membros da Academia Guarani de Cinema Brasileiro, formada por críticos de cinema de diversos estados brasileiros, muitos deles ligados às principais associações da classe no país – ABRACCINE, ACCIRS, ACCRJ e ACECCINE. A segunda fase, em que os melhores do ano estão sendo apontados a partir dos indicados, conta com a participação de mais de 100 críticos, e os resultados serão divulgados no dia 04 de maio de 2018, aqui no Papo de Cinema!

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