Desde que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood passou a indicar 10 (ou até dez, como é agora) candidatos na categoria principal, um estranho desencontro se fez presente: como o Melhor Filme do ano não é, ao menos, um dos mais bem dirigidos? Afinal, em Melhor Direção continuam sendo apenas cinco os concorrentes. Ainda que uma exceção tenha ocorrido – quando Argo (2012) foi premiado, mas Ben Affleck sequer foi indicado – ela serve, também, para confirmar a regra. Sendo assim, dos nove finalistas desse ano, quatro saem em desvantagem porque seus realizadores não foram indicados. Entre os cinco restantes, dois ganharam o Globo de Ouro (Drama / Musical ou Comédia), e um terceiro foi premiado como Melhor Elenco no SAG Awards. Em um ano tão dividido, a tendência vai, portanto, para aquele escolhido no Producers Guild of America Awards – o Sindicato dos Produtores de Hollywood. Será ele, então, o favorito? Confira as nossas apostas para Melhor Filme!
Indicados
- Ford vs Ferrari (Peter Chernin, Jenno Topping, James Mangold)
- O Irlandês (Martin Scorsese, Robert De Niro, Jane Rosenthal, Emma Tillinger Koskoff)
- Jojo Rabbit (Carthew Neal, Taika Waititi)
- Coringa (Todd Phillips, Bradley Cooper, Emma Tillinger Koskoff)
- Adoráveis Mulheres (Amy Pascal)
- História de um Casamento (Noah Baumbach, David Heyman)
- 1917 (Sam Mendes, Pippa Harris, Jayne-Ann Tenggren, Callum McDougall)
- Era uma Vez em…Hollywood (David Heyman, Shannon McIntosh, Quentin Tarantino)
- Parasita (Kwak Sin Ae, Bong Joon-Ho)
FAVORITO
1917
O épico de guerra de Sam Mendes não ganhou apenas o prêmio do PGA. Ele foi também escolhido como o melhor do ano no Globo de Ouro (em Drama), acumulou nove indicações ao Bafta (inclusive a Melhor Filme e Melhor Filme Britânico) e foi premiado pelos críticos de Dallas-Fort Worth, Denver e Kansas, além de ter sido eleito um dos dez melhores do ano no National Board of Review. Isso é suficiente para fazer dele o óbvio vencedor? Longe disso. Mas o coloca numa confortável posição de favorito, o que numa temporada em que as campanhas foram reduzidas (a entrega do Oscar se dará quase um mês do que geralmente acontecia em anos anteriores), pode acabar sendo decisivo. Há muitos outros motivos, no entanto, que fazem de 1917 o mais provável a ser premiado nesta categoria deste ano – e o nosso editor Francisco Russo as apontou com precisão nesse artigo especial!
MERECE
Era uma vez em… Hollywood
Tarantino vai, finalmente, ganhar seu Oscar de Melhor Filme, após três indicações – Pulp Fiction: Tempo de Violência (1994), Bastardos Inglórios (2009) e Django Livre (2012) foram indicados na categoria principal – com Era uma vez em… Hollywood? É melhor não duvidar, pois tal resultado está longe de ser impossível. Afinal, já ganhou o Critics Choice, o Globo de Ouro e o Satellite (os dois últimos como Comédia ou Musical), teve 10 indicações ao Bafta, foi eleito um dos melhores do ano no National Board of Review e na Sociedade Nacional dos Críticos de Cinema dos EUA. Por outro lado, foi escolhido o melhor do ano apenas pelos críticos do Havaí, Las Vegas, Oklahoma, São Francisco, St. Louis e Iowa – ou seja, nenhuma associação regional de maior prestígio, como Nova Iorque, Los Angeles ou Washington, por exemplo. Porém, estamos falando de Quentin Tarantino, um nome que, mais do que um excelente cineasta, é uma verdadeira marca no cinema moderno, um realizador com fãs no mundo todo e que merece, pelo menos uma vez em toda a sua brilhante carreira, um reconhecimento a altura da sua genialidade. Ainda mais por um filme tão singular e impressionante quanto esse.
TORCIDA
O Irlandês
Estávamos há pouco falando de Quentin Tarantino, mas o que dizer, então, de Martin Scorsese – esse, sim, o maior cineasta vivo? Nada menos do que nove longas assinados por ele já foram indicados na categoria principal, mas apenas um ganhou: Os Infiltrados (2006). Ou seja, não está mais do que na hora de uma nova consagração? O Irlandês é um épico mafioso como há muito não se via, porém completamente sintonizado com o que há de mais moderno na arte cinematográfica – tanto que, com dez indicações ao Oscar, concorre, entre elas, a Melhores Efeitos Visuais, e foi produzido pela gigante do streaming Netflix! Estrelado por alguns dos seus parceiros mais frequentes – Robert De Niro, Joe Pesci e Harvey Keitel, com a incrível adição de Al Pacino – conquistou outras dez indicações ao Bafta e cinco ao Globo de Ouro. Considerado o melhor filme do ano pelo National Board of Review e pelos críticos de Nova Iorque, San Diego e North Texas, ganhou também o prêmio de Melhor Elenco no Critics Choice. Ao todo, soma até agora 58 vitórias e impressionantes 297 indicações! É muita coisa, e uma vitória no Oscar viria para coroar uma trajetória absolutamente singular de um realizador único!
AZARÃO
Parasita
Estamos vivendo a ‘Febre Parasita’, não é mesmo? Desde que conquistou a Palma de Ouro no Festival de Cannes, no ano passado, essa produção sul-coreana só tem colhido láureas por onde é exibida. E se conquistou histórias seis indicações no Oscar – o primeiro longa da Coreia do Sul a conseguir tal feito – é também certo que o prêmio de Melhor Filme Internacional já é seu. Mas conseguirá repetir o feito na categoria principal? Muitos apostavam que o mexicano Roma (2018), no ano passado, conseguiria – mas não foi bem assim. Aliás, nos 91 anos anteriores da premiação da Academia, sempre que um longa estrangeiro era indicado em ambas categorias, ele invariavelmente perdia na principal. Ou seja, se ganhar, mais um recorde será marcado! Escolhido como o melhor filme do ano (e não apenas estrangeiro) pela Aliança de Mulheres Jornalistas de Cinema, foi agraciado também pelos críticos de Austin, Central Ohio, Chicago, Detroit, Georgia, Houston, Los Angeles, Phoenix, Seattle, Southeastern, Toronto, Utah, Vancouver e Washington, além de premiado pela Sociedade Nacional de Críticos de Cinema dos EUA. Ou seja, o voto da crítica é dele. Mas quem faz as escolhas no Oscar é a indústria, que costuma ser bem mais conservadora. Enfim, se ganhar, não será uma surpresa, mas é melhor não apostar todas as fichas nessa opção.
POLÍTICO
Coringa
Campeão de indicações neste ano, concorrendo em 11 categorias, desde que ganhou o Leão de Ouro de Melhor Filme no Festival de Veneza Coringa tem deixado qualquer um na audiência, no mínimo, impressionado. É difícil ficar indiferente a essa retomada da trajetória do mais famoso inimigo do Batman – sim, estamos falando de um filme baseado em personagens das histórias em quadrinhos. Em toda a história do Oscar, apenas um outro título de mesma origem chegou tão longe – justamente no ano passado, com Pantera Negra (2018)! Mas conseguirá esse de agora um resultado diferente, além de apenas marcar presença com todo esse destaque? Dificilmente. Tanto que, todo mundo, ao falar dessa produção, menciona primeiro a performance hipnotizante de Joaquin Phoenix como protagonista – ele é o favorito a Melhor Ator – e menos do longa em si. Dono de outras 11 indicações ao Bafta e quatro ao Globo de Ouro, além de 7 ao Critics Choice, o thriller dirigido por Todd Phillips esteve presente em absolutamente todas as disputas desta temporada, mas ganhou apenas uma, a da Sociedade dos Críticos de Cinema de Phoenix! E nenhuma mais! Cara de muitos movimentos de protesto ao redor do mundo nos meses recentes, a máscara deformada do palhaço triste tem tudo para ser um dos símbolos mais marcantes do último ano – mas não no Oscar.
SEM CHANCES
Adoráveis Mulheres
Praticamente todas as versões anteriores para o cinema do clássico de Louisa May Alcott foram indicadas ou premiadas no Oscar. As Quatro Irmãs (1933) teve três indicações – inclusive Filme e Direção – e ganhou como Roteiro Adaptado. Quatro Destinos (1949) conquistou duas indicações, e ganhou como Melhor Direção de Arte em Filme em Cores. O primeiro Adoráveis Mulheres (1994) angariou três indicações, mas teve menos sorte do que seus antecessores. Como se vê, nenhum foi tão longe quanto o atual Adoráveis Mulheres, que somou seis indicações! Mas terá alguma chance de alcançar o troféu máximo? Praticamente, zero. Muito disso se deve ao fato de Greta Gerwig ter sido preterida na disputa de Melhor Direção – uma das maiores injustiças desse ano. Em uma temporada tão “masculina” – dos nove indicados, apenas três passariam no Teste de Bechdel – é difícil imaginar que a Academia abriria espaço para um título tão sensível quanto esse – por mais que devesse, que fique bem claro. Indicado a praticamente tudo, foi premiado como Melhor Filme do ano apenas pelos críticos de Boston.
SURPRESA
Ford vs Ferrari
O que esse filme, dirigido por James Mangold, está fazendo aqui? Poucos apostavam que conseguiria tal espaço, e se fosse como no ano passado, quando apenas oito longas foram indicados, é de se apostar que seria esse a ser deixado de fora. Indicado em quatro categorias – dos nove concorrentes, é o com o menor número de indicações – foi indicado a Melhor Filme apenas no Critics Choice e na premiação dos críticos da Georgia, Las Vegas, North Texas, Seattle e de Indiana. A única vitória, no entanto, veio no Satellite, onde ganhou como Melhor Drama. Por outro lado, foi esnobado no Globo de Ouro e no Bafta, dois dos mais fortes precursores do Oscar. Ford vs Ferrari está longe de ser um filme ruim, mas também lhe falta aquele algo a mais que o torne especial, memorável. É numa vala um tanto comum em que encontra seu espaço, e ali deverá permanecer.
CONTROVERSO
Jojo Rabbit
Hollywood adora esse tipo de filme, que mostra grandes tragédias da humanidade sob os olhos pueris de uma criança – basta lembrar de todos os prêmios conquistados por A Vida é Bela (1997). Por outro lado, muitos lembrarão de O Menino do Pijama Listrado (2008), que tinha premissa bastante similar, mas foi felizmente ignorado da maior parte das premiações daquela temporada. Como se percebe, mais ou menos a cada dez anos um novo exemplar desse gênero melodramático até a medula surge, e Jojo Rabbit é apenas o exemplo da vez. O protagonista é um garoto que tem como amigo imaginário o próprio Adolf Hitler, os nazistas de verdade ou são idiotas, ou gays (ou as duas coisas), e a boa alma da história é morta no meio da trama. Com seis indicações ao Oscar, concorreu ao Globo de Ouro como Melhor Filme em Comédia ou Musical, foi ignorado no Bafta nas categorias principais e ganhou como Melhor Filme em absolutamente lugar nenhum durante essa temporada – apenas no Festival de Toronto, no ano passado, mas lá a escolha é feita pelo voto popular.
VELHA HOLLYWOOD
História de um Casamento
A Academia adorava premiar grandes dramas familiares. Basta lembrar de longas consagrados há alguns anos, como Laços de Ternura (1983), Gente como a Gente (1980) e Kramer vs Kramer (1979). O último a se encaixar nesse subgênero, no entanto, foi Beleza Americana (1999) – e, mesmo assim, sob uma visão bem irônica e sarcástica da ‘tradicional família norte-americana’. História de um Casamento, portanto, seria tranquilamente o favorito caso tivesse sido lançado há três ou quatro décadas atrás. Hoje em dia, obtém um merecido reconhecimento pelos desempenhos registrados por um elenco primoroso. Mas será que merece muito mais do que isso? Indicado a seis Oscars, foi ignorado na categoria principal do Bafta, e como Melhor Filme do ano foi premiado apenas pelos críticos de Indiana!
ESQUECIDO
Dois Papas
Na premiação do Producers Guild of America, dez filmes foram indicados na categoria principal, de produções para cinema. Os nove aqui citados, mais… Entre Facas e Segredos, de Rian Johnson! No entanto, mesmo que tenha sido indicado ao Globo de Ouro e apontado como um dos dez melhores do ano no National Board of Review, a comédia detetivesca estrelada por Daniel Craig não suscitou tanto amor nos membros da Academia, tanto que a indicaram apenas como Melhor Roteiro Original. Mais impacto, portanto, teve a comédia dramática Dois Papas, do nosso Fernando Meirelles, que recebeu três indicações – além de Roteiro Adaptado, concorre ainda a Melhor Ator e Ator Coadjuvante. Além disso, concorreu a Melhor Filme em Drama no Globo de Ouro (uma categoria de maior prestígio que a de Comédia ou Musical), a Melhor Filme Britânico no Bafta, e a Melhor Filme pelos críticos de Dallas-Fort Worth, St. Louis e no Satellite. Se tivesse entrado na disputa, certamente não seria para ganhar – mas daria um orgulho imenso ver um longa assinado por um brasileiro na disputa mais cobiçada da temporada, não é mesmo?
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