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Sinopse

Numa Londres abalada pela Grande Depressão, Mary Poppins desce mais uma vez dos céus para reencontrar seu fiel amigo Jack e ajudar Michael e Jane Banks, agora adultos trabalhadores, que sofreram uma perda pessoal. As crianças Annabel, Georgie e John vivem com os pais na mesma casa de 24 anos atrás e precisam da misteriosa babá e do acendedor de lampiões otimista para trazer alegria e magia de volta para suas vidas.

Crítica

Mary Poppins se foi. Longa vida à Mary Poppins! Se a realização do clássico Mary Poppins (1964) foi uma das maiores pedras no sapato de Walt Disney – como tão bem foi relatado em Walt nos Bastidores de Mary Poppins (2013) – da mesma forma o tempo foi justo para fazer desta produção um dos maiores – e mais eternos – sucessos do estúdio. Justamente por isso, causa espanto perceber que se passaram 54 anos até que surgisse essa sequência,O Retorno de Mary Poppins. Por outro lado, entende-se bem o receio: afinal, quanto mais altas as expectativas, mais doloroso poderia ser o tombo caso qualquer tentativa menos pensada desse errado. Felizmente, é exatamente o que não acontece no longa assinado por Rob Marshall. Ele não só é feliz na escolha de sua protagonista – Emily Blunt canta e dança tal qual nos melhores momentos de Julie Andrews – como também é eficiente em recriar o universo mágico e repleto de lições duradouras tão bem delineadas pelo texto original de P.L. Travers.

Os anos se passaram, e agora as crianças Banks são adultas, envoltas pelos mesmos problemas que um dia atormentaram as cabeças de seus pais. Se na primeira vez somente ao término nos damos conta de que a babá que veio do céu está mais preocupada com os pais do que com os filhos – afinal, estes, eventualmente, serão consequências dos primeiros – agora ela ressurge com a mesma missão em mente. Michael (Ben Whishaw) e Jane (Emily Mortimer) seguem próximos, mas o mundo em que vivem está bem diferente. Ele ficou viúvo faz pouco, enquanto que ela segue solteira – e um tanto solitária. É por isso que ambos acabam se apoiando um no outro, deixando pouco tempo para as verdadeiras necessidades dos filhos dele – e sobrinhos dela: Anabel (Pixie Davies, de O Lar das Crianças Peculiares, 2016), John (Nathanael Saleh, de Game of Thrones, 2016) e Georgie (o novato Joel Dawson). As crianças amadureceram muito nesse último ano, o qual enfrentaram sem a mãe por perto. Mas seguem sendo não mais do que isso: crianças. E resgatar parte da magia da infância talvez seja a mais difícil de todas as tarefas.

Assim que Mary Poppins reaparece, Michael e Jane até se perguntam se as fantasias que guardam como lembrança do tempo em que viveram ao lado dela foram reais ou não, mas o mundo adulto é complexo o bastante para acreditar naquilo que escapa a uma percepção mais lógica. “O impossível só é possível para aqueles que nele creem”, é um dos lemas da babá. E será por isso que, por mais racionais que os pequenos tenham sido obrigados a se comportarem nos últimos meses, logo estarão prontos para se desprenderem o suficiente para banhos de espuma entre baleias e golfinhos, visitar espetáculos teatrais em vasos de porcelana ou mesmo flutuar pelos ares sendo levados por balões de gás. Enquanto isso, a trama se aproxima da tragédia diante de um evento inesperado: após ter pedido um empréstimo ao banco para equilibrar as contas, Michael precisa reencontrar os papéis com as ações financeiras dos pais para, com elas, quitar suas dívidas. Caso contrário, a própria casa onde moram é que será usada no débito, deixando a família, literalmente, a ver navios – como bem diria o Almirante Boom, o vizinho e seu canhão.

O roteiro de David Magee (indicado ao Oscar pelos encantadores Em Busca da Terra do Nunca, 2005, e As Aventuras de Pi, 2012) é elaborado quase que milimetricamente em cima do original dos anos 1960. Se em Mary Poppins havia uma visita a um tio que, ao rir, tudo ia pelos ares, em O Retorno de Mary Poppins quem faz uma participação especial é ninguém menos do que a oscarizada Meryl Streep – que responde pela prima que vê tudo de cabeça para baixo. E pequenas mudanças como essa, que pontuam a nova história, fazem dessa, mais do que uma continuação, quase como uma refilmagem. Com isso, ganha-se em nostalgia – principalmente por escolhas como a do multitalentoso Lin-Manuel Miranda, substituindo o limpador de chaminés de Dick Van Dyke à altura – ao mesmo tempo em que se aposta em terreno seguro. Pois, quem nunca se emocionou ao reencontrar antigos amigos que acreditava tê-los perdido de vista? É exatamente o que este filme proporciona: um abraço caloroso, mais do que qualquer descoberta inesperada.

Com efeitos visuais deslumbrantes – as novas sequências animadas são de deixar qualquer um de queixo caído – e um design de produção surpreendente – sem falar nos figurinos da igualmente oscarizada Sandy Powell (Shakespeare Apaixonado, 1998, O Aviador, 2004, e A Jovem Rainha Victoria, 2010), um verdadeiro show à parte – O Retorno de Mary Poppins é mais do que um mero resgate memoralista, e sim uma nova oportunidade de se deslumbrar com as coisas simples da vida, como um tostão do qual nada esperamos ou mesmo o balançar das horas – que podem nos levar tanto para frente quanto para trás, bastando apenas estarmos atentos aos ponteiros do relógio. Agora, uma coisa é inegável: mais do que o talento de Rob Marshall, sempre à vontade no universo dos musicais – aqui tão afiado como nos melhores momentos de Chicago (2002) – ou pela excelência de coadjuvantes pontuais, como Colin Firth, Julie Walters, Angela Lansbury ou o próprio Van Dyke, tudo morria ou ganharia vida nos ombros de Emily Blunt. E ela se sai maravilhosamente bem diante esse gigantesco desafio, sempre afiada nos diálogos, e dizendo ainda mais pelos olhos atentos. É por ela, mais do que por qualquer outro, que essa empreitada, por muitos considerada suicida, resulta em um espetáculo como poucos por aí. Afinal, isso é... supercalifragilisticexpialidoce, não é mesmo?

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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