Crítica


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Sinopse

Depois de salvar a vida do herdeiro do clã japonês chamado Arashikage, o nômade Snake Eyes é aceito no seio dessa pequena comunidade. Ele aprende os caminhos para se tornar um verdadeiro ninja, mas precisa provar sua fidelidade assim que segredos do passado vêm à tona.

Crítica

A iniciativa não é nada inovadora: quando uma franquia começa a fraquejar, ao invés de seguir adiante, meio que ignorando os problemas, uma das soluções pensadas é pisar no freio e se focar no passado, revelando “como tudo começou”. Muitos já fizeram isso – recentemente tivemos King’s Man: A Origem (2021), Tomb Raider: A Origem (2018), Robin Hood: A Origem (2018) e Planeta dos Macacos: A Origem (2011), apenas para ficarmos nos mais conhecidos. O que acontece em G.I. Joe Origens: Snake Eyes, no entanto, está mais próximo ao visto em X-Men Origens: Wolverine (2009): ao invés de reiniciar a saga por completo, escolhe-se apenas um personagem – provavelmente um coadjuvante com capacidade própria de atrair atenção – e debruça-se apenas sobre a sua trajetória. Não que os G.I. Joe possam ser comparados aos X-Men, mas a intenção é a mesma. Assim como os resultados: em ambos os casos, a frustração é imensa.

Tanto em G.I. Joe: A Origem de Cobra (2009) – já haviam explorado a expressão “origem” no título – quanto G.I. Joe: Retaliação (2013), uma das mais interessantes figuras do elenco era o misterioso Snake Eyes, nos dois filmes interpretado por Ray Park (conhecido como o Darth Maul e Star Wars: Episódio I – A Ameaça Fantasma, 1999). A questão, no entanto, é que, por mais popular que fosse a sua presença, ele permanecia durante o tempo todo de máscara – seu rosto não era visto – e sem emitir uma única palavra – motivado por um “voto de silêncio” feito anos antes. Essas duas questões são completamente ignoradas agora, ainda mais que se optou por um astro em ascensão para defender o papel: Henry Golding, que participou do fenômeno Podres de Ricos (2018) e dos simpáticos Uma Segunda Chance para Amar (2019) e Magnatas do Crime (2019). Apesar dos três projetos citados terem seus méritos, ele sempre foi visto mais como o galã do que como um ator versátil com potencial inexplorado. Sua chance de alcançar o estrelato, portanto, parecia haver chegado. Só que não.

Primeiro foi a pandemia do Covid-19, que adiou o lançamento de Snake Eyes por quase dois anos (previsto inicialmente para 2020, chegou em alguns mercados apenas em 2021, em distribuição limitada – muitos cinemas ainda permaneciam fechados – e agora, em 2022, é que ganhou as plataformas de streaming). Mas mesmo se o confinamento não tivesse ocorrido, ainda restaria o principal: um filme ruim. Os diálogos criados por Evan Spiliotopoulos (responsável por pérolas recentes como As Panteras, 2019, e O Caçador e a Rainha de Gelo, 2016) e a dupla Joe Schrapnel e Anna Waterhouse (do frustrante remake Rebecca: A Mulher Inesquecível, 2020) são risíveis, para não dizer incompreensíveis, pois lhes faltam a mínima lógica para soarem, ao menos, convincentes. O argumento, portanto, é tão inadequado quanto: motivado pela vingança, Snake Eyes é capaz de tudo para matar o assassino de seu pai, até mesmo concordando em se unir à Yakuza, a máfia japonesa. O curioso é que pensa estar atuando ao lado dos “mocinhos” (?), e quando esses mostram quem, de fato, são – uma identidade que nunca chegaram a esconder – o garoto passa a fazer jogo duplo, participando de uma série de testes para ingressar na casa Arashikage, tradicionais lutadores ninja de quem primeiro se aproxima com a intenção de trai-los, mas logo passa a atuar ao lado deles.

Uma proposta como a que aqui se encontra, que envolve identidades duplas, reviravoltas de última hora e ameaças exageradas que não chegam a ser cumpridas, é tão corriqueira que se mostra motivo de embaraço diante tamanha previsibilidade. Restaria, portanto, se concentrar nas cenas de ação e nas sequências de efeitos visuais, mas nem esses motivaram maiores investimentos por parte da produção. Em determinado momento, o herói se vê tendo que lidar com três anacondas gigantes tão mal desenhadas – o fundo verde ‘grita’ com o exagero – que até mesmo a interação dos atores com as inserções digitais se revela complicada. O clímax da história envolve casas pegando fogo, inimigos se aliando por conveniência e uma perseguição de motocicletas tão artificial que até mesmo Matrix Reloaded (2003), lançado quase duas décadas antes, se mostra mais no domínio da ação. E quando as esperanças residem sobre uma senhora de mais de oitenta anos para dar fim ao exército de vilões, não se sabe se o tom é o da comédia involuntária ou se tal ideia deveria ser lida como uma possibilidade real. Até mesmo a revolta de um dos personagens principais, uma mudança de rumo necessária para a construção do inimigo de uma eventual sequência, é tão mal elaborada que soa mais como birra de criança do que uma razão sólida a ser desenvolvida.

Henry Golding pode ter seus fãs, mas está longe de ser um intérprete capaz de carregar uma aventura dessas nas costas – se nem Channing Tatum ou Dwayne Johnson, ambos com muito mais carisma, conseguiram nos episódios anteriores, o que dizer desse novato? Mas seria injustiça colocar o crédito desse fracasso apenas na sua conta. Não se pode ignorar que aquele orquestrando esses movimentos é o alemão Robert Schwentke, que até divertiu em RED: Aposentados e Perigosos (2010), mas desde então só tem dado passos em falso (R.I.P.D.: Agentes do Além, 2013, já não havia sido grande coisa, mas ser conhecido por ter enterrado de vez a saga Divergente com Insurgente, 2015, e Convergente, 2016, não fica bonito no currículo de ninguém). O diretor revela desinteresse pelas figuras icônicas que tem à disposição, e mesmo nomes como a Baronesa (a espanhola Úrsula Corberó, de La Casa de Papel, 2017-2021, disparada a pior em cena) ou Scarlett (Samara Weaving, de Casamento Sangrento, 2019) acabam passando quase desapercebidos, como se caprichos sem maior utilidade. G.I. Joe Origens: Snake Eyes tem G.I. Joe de menos e um Snake Eyes reinventado que pouco corresponde à ideia consolidada entre os fãs. Só um milagre para uma mistura dessas dar certo. Algo que, de fato, não acontece.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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