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Sinopse

Robin volta das Cruzadas e se surpreende ao encontrar Nottingham à beira da falência, com o povo sofrendo nas mãos dos tiranos, no mais completo caos. Ele não deixará que as coisas permaneçam desse jeito e contará com a ajuda de um amigo estrangeiro para se tornar uma lenda que rouba dos ricos para dar aos pobres.

Crítica

A tantas vezes contada história do ladrão que rouba dos ricos para dar aos pobres ganha uma roupagem cinematograficamente contemporânea e mainstream em Robin Hood: A Origem. Isso representa, em termos práticos e bem evidentes, um alinhamento à estética dos tão propalados filmes de super-heróis, porém sem a demonstração da boa qualidade de alguns dos exemplares focados em seres de poderes e/ou obstinação excepcionais. Desde o primeiro encontro entre Robin (Taron Egerton) e sua amada Marian (Eve Hewson) – ladra cuja vestimenta parece ter saído de uma loja de fantasias chiques – sobressai a artificialidade que perpassa integralmente o conjunto. Além das vestes excessivamente alinhadas, da maquiagem e dos cabelos impecáveis que comprometem, sobremaneira, o processo de remonte ao século XII, as interações são superficiais. O então nobre se enamora pela menina que tentava usurpar um de seus cavalos e, antes da convocação para engrossar as Cruzadas, há o desenho do romance excessivamente açucarado e ordinário.

Robin Hood: A Origem passa a emular exemplares ruins de guerra quando detido na suposta dureza do protagonista na Arábia, na caça a insurgentes e na pregação a ferro e fogo das palavras da Igreja Católica. Heroísmos forjados nas caldeiras do lugar-comum, demonstrações de honradez diante do inimigo subjugado, e logo Robin nos é submetido como alguém pretensamente consciente em meio à selvageria. Todavia, o cineasta Otto Bathurst não sustenta a consistência do personagem, fazendo dele um sujeito sem personalidade que segue conselhos e imposições alheias para sobreviver ou a fim de reconquistar a sua Dulcinéia. Com a entrada de John (Jamie Foxx) em cena começa a imitação mal enjambrada da jornada do Batman. O mouro sobrevivente funciona como mentor ao garoto regresso à terra que lhe deu como morto, destituído de suas posses pelo temível Xerife de Nottingham (Ben Mendelsohn, limitado a gritar e rosnar, se assemelhando a um general do Império da Saga Star Wars), e separado da paixão que agora namora com outro. A sequência clipada de treinamento é praticamente copiada do que Christopher Nolan fez em Batman Begins (2005).

Em Robin Hood: A Origem há cenários feitos totalmente em computação e outros construídos à moda antiga. Essas duas técnicas se estranham constantemente no decurso do filme, criando ruídos que soam exatamente como evidências das diversas falhas de execução. Quando principia, de fato, a sua senda de roubos, mantendo durante o dia a identidade de aristocrata elitista e à noite, sorrateiramente, surrupiando as riquezas angariadas para custear a guerra (outra apropriação escancarada da mitologia do Homem Morcego), Robin tende a se tornar simbólico ao povo sofrido. Todavia, o realizador prefere insistir numa dinâmica amorosa comezinha, com o herói sofrendo por ver Marian nos braços do político e honrado Will (Jamie Dornan). Ele chega a mudar drasticamente a tática de atuação, passando a distribuir o dinheiro aos desvalidos por ouvi-la sugestionar isso de soslaio. Portanto, a questão ideológica fica absolutamente comprometida, uma vez que sujeita aos caprichos do coração inquieto do menino levado a ser um defensor dos fracos e oprimidos da Inglaterra.

Robin Hood: A Origem apresenta, ainda, uma série impressionante de ocorrências implausíveis. Robin volta falido, se torna Hood e, como disfarce, começa a esbanjar o dinheiro afanado. Ninguém desconfia que seja ele o mascarado. John é um mouro, ou seja, estranho à paisagem repleta de ingleses. Nenhuma viva alma o percebe, tampouco quando (sem máscaras) ajuda o paladino a escapar, isso depois de ser visto frequentemente como lacaio do fidalgo de fachada. Otto Bathurst consegue a “proeza” de colocar a Igreja Católica como principal vilã, sem estabelecer vínculos encorpados entre a entidade retratada e a real, e sustentar um mal disfarçado elogio à religiosidade, inclusive a ponto de colocar o Xerife de Nottingham como um ateu sem coração. Em suma, um filme totalmente genérico, cujo discurso é tão frágil quanto a concepção das confusas cenas de ação, que se apropria dos códigos narrativos corriqueiros da atualidade e, de quebra, para escancarar o fato de reproduzir a história do Batman, termina com um decalque vergonhoso do Duas-Caras.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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