Crítica


7

Leitores


Sinopse

O avanço da AIDS mobiliza a comunidade gay, que está em busca de informações e métodos de prevenção. Cleve Jones vê seus amigos mais próximos serem contaminados, enquanto que Ken e Richard precisam descobrir como levar adiante o relacionamento deles diante desse novo cenário. Ao mesmo tempo, Roma e Diane terão que revistar seus sentimentos uma pela outra, e o que isso significa diante de uma luta muito maior.

Crítica

Eu não quero morrer. E também não quero ferir você”. Essa frase, dita por Ken Jones (Jonathan Majors) ao seu amante, Richard (Sam Jaeger), dá o tom do quarto episódio de When We Rise, minissérie criada e desenvolvida por Dustin Lance Black, cineasta vencedor do Oscar pelo roteiro de Milk: A Voz da Igualdade (2008). Sim, porque após três capítulos nos quais os espectadores foram apresentados a um crescente de esperança e a uma tomada de consciência a respeito a militância LGBT nos Estados Unidos – e, por consequência, no mundo todo – chegou a vez de pisar no freio e enfrentar as consequências – ou repercussões – que não tardaram a se manifestar. Primeiro, o assassinato brutal de Harvey Milk, primeiro político assumidamente gay a se eleger em território norte-americano. Depois, e de forma ainda mais devastadora, o surgimento da AIDS.

Inicialmente batizada de GRID – sigla em inglês para Gay Related Immune Deficiency, ou doença imunodeficiente relacionada aos gays – a AIDS foi logo associada ao comportamento homossexual masculino, e, por isso, esse foi o grupo mais diretamente afetado nos primeiros estágios da epidemia. É por isso que tanto Ken e Richard – um casal apaixonado, porém não-monogâmico, assim como tantos outros iguais a eles naquela época – quanto Cleve Jones (Austin P. McKenzie), um jovem militante e seus amigos, abraçam de imediato a luta e passam a se manifestar publicamente. Primeiro, em busca de maiores esclarecimentos. Depois, atrás de soluções para o problema e em busca de métodos de prevenção.

Você quer dizer que devemos parar de fazer sexo? Se for isso, então vamos todos morrer”. Como permanece até hoje, a AIDS não possui cura. No início dos anos 1980, a situação era ainda mais preocupante. Época do amor livre, da busca por diversos parceiros e de todas as experimentações, seus protagonistas a partir de agora terão que aprender a lidar em como se comportar em suas idas às saunas gays, pontos de pegação e até mesmo flertes nas ruas. Não só a doença está presente, como também a violência que ela acarreta – seja na comunidade, como também no aumento do preconceito e reações extremas. Cleve sente na pele isso, e a trama não se exime em deixar isso claro da forma mais óbvia – e marcante – possível.

Enquanto Ken precisa enfrentar a questão não apenas da homossexualidade, mas também o fato de ser negro – “não existem homens negros gays”, lhe é dito quando parte em busca de ajuda – também sente a brusca despedida de conhecidos e a chegada de outros em novas e problemáticas situações – Christopher / Cecília (Ivory Aquino) irá acrescentar a questão da transexualidade ao debate. Cleve vai parar no hospital, tanto por causa própria como também pelos seus próximos: amigos adoecem, e a AIDS não escolhe suas vítimas. Sua busca por informações visa não apenas acabar com os boatos, mas também ajudar aqueles ainda mais perdidos.

Essa desorientação, por outro lado, se reflete num foro mais íntimo na relação entre Roma (Emily Skeggs) e Diane (Fiona Dourif) – esse é um ponto interessante do roteiro de Lance Black, esse reflexo que promove entre o campo mais amplo e aqueles mais privados. As duas começam o episódio entre farpas, idas e vindas, a primeira cada vez mais alienada no seu pequeno mundinho de protestos, enquanto que a outra, agora mãe e trabalhando como enfermeira, enfrenta uma realidade muito mais cruel e urgente. As duas estão em um processo não apenas de se redescobrirem, mas também identificarem melhor como podem ajudar a si e aos outros – a causa que estão enfrentando não é só das mulheres, dos gays, ou de minorias. É de todos nós. “Ainda não encerramos por aqui”. E isso é verdade. Afinal, ainda há muitos nomes a serem escritos, tanto no mural de lembranças como na história dos que resistiram para contar.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
avatar

Últimos artigos deRobledo Milani (Ver Tudo)