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Sinopse

Humanos e macacos cruzam os caminhos novamente. César e seu grupo são forçados a entrar em uma guerra contra um exército de soldados liderados por um impiedoso coronel. Depois que vários macacos perdem suas vidas no conflito, César luta contra seus instintos e parte em busca de vingança. Dessa jornada, o futuro do planeta poderá estar em jogo.

Crítica

“A César o que é de César”. E é do líder dos símios, interpretado brilhantemente por Andy Serkis, o percurso dramático de Planeta dos Macacos: A Guerra, seu principal motivo de ser, para além do conflito anunciado em Planeta dos Macacos: O Confronto (2014). Praticamente regresso dos mortos no segundo episódio desta trilogia que agora se encerra num tom melancólico, ele encabeça a reconstrução do lar outrora destruído pelos humanos violentos. O cineasta Matt Reeves, inteligentemente, aposta no torvelinho de sensações que sobrevém uma tragédia provocada por homens amedrontados com a possibilidade patente da supremacia animal. O rei, então, iguala-se aos meros súditos. A raiva irrompe e torna urgente a vingança contra quem lhe impingiu uma dor, talvez, sem igual. A guerra propriamente dita, ou o que dela se espera em termos cinematográficos, ocorre à margem do verdadeiro substrato deste longa-metragem, formado por toda sorte de implicações da fatalidade entre as raças que digladiam.

Em Planeta dos Macacos: A Guerra, causa e efeito estabelecem franco diálogo. A intolerância é um signo constante, presente até mesmo em determinadas ações e reações de seres anteriormente tidos como à prova de impropérios. Para César, deixar seu povo deslocar-se sem liderança, especialmente a sua tão significativa e inspiradora, é um preço pequeno a pagar frente à possibilidade de ir à forra, de enfrentar o Coronel (Woody Harrelson), militar que lhe extirpou alguns dos bens mais preciosos. Assim, descendo irresponsavelmente de seu panteão de nobreza, do status de farol aos demais macacos, ele condena a si próprio e aos seus. O cineasta aposta sobremaneira nessa construção mais emocional e psicológica, preterindo, com sapiência, as cenas puramente de ação, ou melhor, as utilizando parcimoniosamente para substanciar uma visão desiludida do embate fictício que obviamente espelha os duros e frequentes factuais. Assim, o enfrentamento é a combustão dos dramas, não um servidor de banalidades catárticas.

Se no longa-metragem anterior, Koba, o imediato rebelado contra a ponderação de César, é o antagonista, aqui quem cumpre exemplarmente essa função é o Coronel. Há nele ecos de Kurtz, personagem de Marlon Brando em Apocalypse Now (1979), que igualmente se amotina na mata por achar-se dono de uma visão mais abrangente acerca da contenda em voga. O forte vilão guarda outros simbolismos importantes, como uma alusão desbragada ao nazismo. Nesse paralelo, os macacos são equivalentes aos judeus aprisionados em campos de concentração, depois em êxodo. Planeta dos Macacos: A Guerra também possui diversas referências religiosas, sendo a mais evidente delas a crucificação dos animais e a traição de antigos amigos, que remete diretamente a Judas Iscariotes. Dentro desse percurso milimetricamente construído para ampliar a jornada de César, sobra espaço para o surgimento de um alívio cômico, o Macaco Mau (Steve Zahn), que diverte com sua personalidade ingênua.

Planeta dos Macacos: A Guerra ainda ganha pontos pela coragem de despedir-se de figuras importantes da franquia, com isso conferindo mais complexidade à missão do protagonista. Matt Reeves reflete acerca da incomunicabilidade por meio dos efeitos colaterais da mutação da Gripe Símia. Perder o dom da voz e, de quebra, a racionalidade e a consciência, ou seja, ir na contramão da evolução gradativa dos macacos, faz dos humanos criaturas supostamente inferiores. Não são imprevisíveis os rumos que o feroz confronto entre as raças tomarão, vide as demais produções da Saga Planeta dos Macacos, cronologicamente passadas após a nova trilogia. Habilmente, o cineasta utiliza a sensação de inevitabilidade para adensar certos desdobramentos, acentuando dramas como o da menina muda que peregrina com os macacos, símbolo de uma convivência possivelmente pacífica, não houvesse, de ambos os lados, tanto medo de erradicação. Neste filme intenso, a ficção recorre à realidade para agigantar-se.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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