Crítica


7

Leitores


Sinopse

Em 1997, o famoso estilista Gianni Versace foi morto na escadaria de sua mansão pelo serial killer e garoto de programa Andrew Cunanan. Além de analisar o assassinato do designer, a temporada mergulha no trabalho da polícia e do FBI, sobretudo nos fracassos na busca pelo criminoso e no relato do sofrimento dos famíliares de suas vítimas.

Crítica

My brother has a weakness of beauty, but I’m not my brother”. Ou, em bom português: “meu irmão tem um fraco pela beleza, mas eu não sou meu irmão”. Com essa declaração, Donatella, a irmã de Gianni, deixa claro que o jogo dela é diferente daquele praticado pelo irmão. Essa verdade volta com tudo na sequência do desfile, em que os dois entram em conflito sobre qual tom a marca deve seguir: viva, vibrante e colorida, como ele anseia, ou escura, pesada e rígida, como ela prega. Os aplausos mostram estar ao lado dele. Mas por quanto tempo? Afinal, Manhunt, o segundo episódio de American Crime Story: The Assassination of Gianni Versace, está mais preocupado, desde seus instantes iniciais, em desvendar quem são os principais players dessa trama, e menos em investigar os desdobramentos deste trágico episódio. Haverá tempo para isso depois, supõe-se. Agora, é chegado o momento de dar um passo atrás para, quem sabe, ganhar impulso para ir adiante.

Há dois lados nessa história: Gianni Versace, a vítima, e Andrew Cunanan, o assassino. O primeiro vive cercado por muitos: o companheiro de 15 anos, Antonio, a irmã, Donatella, os amantes ocasionais que volta e meia frequentam sua casa, as modelos que defendem suas criações nas passarelas, seus criados, os fãs e tantos outros. O segundo, por outro lado, está mais sozinho do que nunca. Ele até pode se aproximar de um infeliz em situação similar à sua, ou de um ou outro cliente/parceiro de aventuras sexuais, mas nada perdura. Afinal, para cada um com quem se encontra, a persona que apresenta é diferente da anterior. São tantas mentiras, inúmeras fantasias, invenções que se repetem e se sucedem, que, muito provavelmente, nem mesmo ele saiba mais quem é o garoto que está por debaixo de tudo isso.

Gianni está em busca de paz. Quer ver a irmã e o companheiro em sintonia. Quer se expressar através de sua arte. Quer fazer de sua casa, um lar. Andrew também precisa se encontrar. Mas a calma que procura não está dentro de si, e muito menos na construção de um ideal. A tormenta é tanta que pensa só poder se aquietar através da destruição. Da desconstrução. Seja do que está ao seu lado ou, principalmente, daquilo que lhe é inalcançável. Ele não quer ter. Ele precisa ser. E, para isso, o que vislumbra não pode mais existir, lhe deixando sem foco. Mais do que qualquer outra coisa. Custe o que custar.

O problema deste episódio é a inconstância revelada pelo diretor Nelson Cragg (indicado ao Emmy pela fotografia de ACS: The People v. O.J. Simpson, 2016, e de Homeland, 2011). Começa pelo núcleo familiar, e por ali permanece por um bom tempo. Ao mesmo tempo em que vemos Penélope Cruz no domínio total de sua personagem, evitando uma cópia, mas, a partir de um completo entendimento, criando a sua própria Donatella, e de um Edgar Ramirez pronto a se mostrar capaz de mais do que uma mera transformação física, no mesmo instante em que essa percepção começa a prevalecer, somos lembrados de que Andrew Cunanan está logo ali, na esquina. Darren Criss retoma sua figura quase apagada, em simbiose com o ambiente em que escolhe se esconder, deixando à tona o vazio que lhe é característico. Ele perambula por vielas e lugares onde o sol já não mais chega. É somente uma sombra. E ao invés de se focar num ou noutro percurso, Cragg fica alternando entre um e outro, sem oferecer a nenhum a profundidade que exigem.

Manhunt, o nome deste episódio, significa ‘caçada humana’. É um termo bastante comum para ser empregado na busca por criminosos. Após o assassinato de Versace, visto logo no início do episódio de estreia, era de se imaginar que agora acompanharíamos o empenho da polícia em prender o culpado pelo crime. Porém, a força policial mal é vista neste capítulo. Misto de preconceito, descaso, desinteresse ou simples homofobia, é certo que Cunanan só pode se tornar um serial killer por falta de uma ação que o impedisse. Assim, quem é caça e quem é caçador? Encontrar um culpado ou finalmente descobrir a si próprio – é o que os dois lados dessa moeda se perguntam. The Assassination of Gianni Versace segue, no seu segundo episódio, espalhando perguntas e deixando claro ter pouca pressa na sua busca por respostas. Há mais sete capítulos para isso. E só quem persistir até o fim, afinal, as terá. Ou será que não?

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
avatar

Últimos artigos deRobledo Milani (Ver Tudo)

Grade crítica