Crítica


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Sinopse

William é um jovem de família rica que nunca teve sucesso na vida. Do futebol à música, ele tentou de tudo para encontrar seu lugar ao sol, mas nada nunca deu certo. Até que um belo dia ele decide se tornar um autor de séries de televisão, mas para isso ele conta com a ajuda de Alice, uma estudante de cinema insegura, e Stive, um ator com talento questionável.

Crítica

A primeira temporada de Alce & Alice é composta de apenas quatro episódios de aproximadamente 25 minutos cada. Sua premissa é bastante simples. Um mauricinho, William (Thiago Prade), tentando deixar para trás o passado de frustrações, resolve criar um programa de televisão, com a ressalva de possuir nenhuma experiência e um nível muito próximo disso de talento. Alice (Kaya Rodrigues), filha de pais extremamente religiosos, com quem entra em atrito após revelar-se estudante de cinema, responde ao anúncio que solicitava alguém para trabalhar na tal produção nova. Sem explicação, a dupla logo vira um trio, com a adição de Stive (Gabriel Faccini), ator desempregado, cujas aptidões são inversamente proporcionais ao comportamento de celebridade. Eles não têm roteiro, fazem pouca ideia do que querem contar, mas se grudam no fiapo oferecido pelo caráter inusitado da figura de um dos personagens, o alce, ou melhor, o homem vestido de animal.

Há, portanto, em Alce & Alice uma série dentro da série. Todavia, a metalinguagem não se restringe a esse dado, pois a criatividade dos roteiristas e dos diretores Diego Barrios e Tiago Rezende, nesse sentido, se espraia a outros âmbitos, haja vista as aberturas absolutamente divertidas que emulam as de seriados norte-americanos famosos – destaque especial à brincadeira com House of Cards, que troca as ruas de Washington pelas de Porto Alegre; e a imitação de Breaking Bad. Para quem passa boa parte do tempo “maratonando” em frente à televisão, vai ser fácil identificar outras brincadeiras ao longo da trama, umas com sabor de irreverência, tais como a aparição de um protótipo de Senhor Madruga na improvável ida ao México, e outras dando o tom estrutural, vide a dinâmica dos depoimentos que remete imediatamente ao procedimento similar de The Office. Ou seja, os criadores estão preocupados não somente com a coerência interna, mas também com encaixar homenagens.

Alce & Alice possuiu um humor totalmente nonsense, com gags de rápida constituição e para absorção expressa. Por mais que tudo soe uma (boa) bagunça, a progressão narrativa é bem construída e dá conta do paralelo entre “realidade” e ficção. Enquanto o programa vai de vento em popa em virtude da adesão dos hipsters que veem qualidade onde nem mesmo a mãe do protagonista enxerga, a dinâmica dos protagonistas se intensifica no sentido da formação de um triângulo amoroso. Tudo bastante pitoresco, sem espaços para nuances ou grandes reviravoltas, como convém ao tipo de humor que os realizadores utilizam. É curiosa e funcional a diferença de texturas das imagens, isso de acordo com a instância do enredo. A série dentro da série tem aspecto cinematográfico, mas propositalmente de filme vagabundo feito no quintal, sem recursos, embora exista a pompa devidamente ridicularizada. A “realidade” tem jeitão televisivo, mesmo, com a prevalência da sucessão de sátiras e um olhar deliberadamente caricatural às pessoas e situações.

Os personagens de Alce & Alice são carismáticos e o texto é alinhavado com cuidado, a despeito de subaproveitamentos pontuais, como a interação promíscua da senadora Tânia Alvarez (Aurea Machado) com a televisão, representada pelo executivo vivido com escracho por Eduardo Mendonça, que poderia ser melhor aproveitada nesse contexto engraçado. A série ainda tem duas participações especialíssimas, uma menor, a do diretor Otto Guerra, que aparece de relance num bar, outra maior, a do também cineasta Jorge Furtado, que chega a arriscar-se (com sucesso) fazendo graça de seu nobre ofício. Thiago Prade, Kaya Rodrigues e Gabriel Faccini se encarregam do espírito despirocado, garantindo nossa simpatia por figuras que sabem praticamente nada do que fazem. A graça do resultado está relacionada ao bem-vindo descolamento da ideia da audiência acima da inventividade, o que permite riscos, às vezes exageros, mas garante boas risadas e momentos de inspiração evidente e louváveis.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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