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Sinopse

Ambientado na Ucrânia de 1930, este drama conta a estória de Yuri, um artista nascido numa família de guerreiros cossacos que se esforça para conseguir uma aprovação dos parentes. A vida do rapaz muda quando o Exército Vermelho invade seu país e sua família passa a ser perseguida pelo regime stalinista.

Crítica

A ideia de se fazer um filme sobre a ascensão do comunismo e os primeiros passos rumo à formação da União Soviética ainda nos anos pré-Segunda Guerra Mundial, tendo como ponto de vista a situação dos ucranianos, é bastante pertinente, e deve servir para despertar o interesse do cinéfilo mais afoito – e até mesmo do espectador casual – justamente pela raridade deste ponto de vista, ainda mais quando diz respeito a uma transformação sócio-política tão importante e de tantos reflexos durante o século seguinte. No entanto, o realizador George Mendeluk parece tomar todas as decisões erradas neste Colheita Amarga, filme que tenta se vender como uma mistura de ...E O Vento Levou (1939) com Guerra e Paz (1956), porém frustra cada uma dessas intenções com uma dramaturgia fraca, uma péssima concepção visual e atores tão carentes de emoções que é quase impossível se importar com o que acontece com cada um deles durante os poucos mais de 100 minutos de duração da trama.

No início dos anos 1930, Stalin (Gary Oliver, de Game of Thrones, 2014-2015) decide dar início a sua política de invasão e domínio dos países vizinhos à Rússia, dando vazão ao sonho insano de espalhar à força a doutrina comunista pelo mundo. Este, no entanto, é só o pano de fundo da ação de Colheita Amarga. Afinal, somos convidados a acompanhar o que se desdobra com o jovem Yuri (Max Irons), filho de Yaroslav (Barry Pepper) e neto do grande Ivan (Terence Stamp), um dos maiores guerreiros daquela região. Estamos no interior da Ucrânia, terra de fazendeiros e de homens que já viveram glórias memoráveis, mas que agora decidiram se assentar ao lado de suas esposas e filhos. Essa distinção, no entanto, não é reconhecida pelos enviados do novo regime, que invadem casas, comunidades e igrejas para impor novos costumes e tradições. Negociantes são levados à ruína, famílias são separadas e rebeldes são mortos a sangue frio.

Ao contrário do seu avô, Yuri não é de luta e, sim, de palavras. Ele anseia por se tornar um artista, ao mesmo tempo em que sonha com a bela Natalka (Samantha Barks, de Os Miseráveis, 2012). Em meio à tantas mudanças, decide se mudar para Kiev, onde poderá estudar e adquirir uma profissão. No entanto, ao lado dos colegas, logo se junta ao movimento contrário à nova ordem, e quando menos espera se vê em apuros. Uma vez na prisão, irá contar com a sorte – e também com seus inegáveis talentos – para escapar da morte. Sua jornada de volta à casa não se dará sem tropeços, porém uma promessa lhe mantém vivo e firme para seguir em diante: a certeza de reencontrar seu amor de infância e, ao lado dela, poder, enfim, construir sua própria família.

Bom, diante de tantas palavras bonitas e desenlaces mirabolantes, qualquer desavisado poderá imaginar que estamos diante de um épico inesquecível, repleto de batalhas impressionantes, feitos heroicos, sacrifícios incontornáveis e gestos românticos capazes de levar qualquer um às lágrimas. No entanto, chega a surpreender a eficiência de Colheita Amarga em gerar apenas indiferença e descaso. Está certo que Max Irons, como protagonista, é uma escolha bastante equivocada (o garoto não herdou nada do talento do pai, o vencedor do Oscar Jeremy Irons), enquanto que o veterano Terence Stamp tem pouco a oferecer, justamente porque sua presença não é aproveitada à contento, restringindo-se mais a uma postura de efeito do que alguém que possa, de fato, fazer diferença.

Nada se compara, no entanto, com o despreparo do diretor. Apesar de Mendeluk já ter entregue mais de 70 produções em sua filmografia, esta é uma das poucas que chegou às telas dos cinemas – a maioria foi feita para a televisão – o que demonstra o seu despreparo em lidar com campos abertos e tomadas mais amplas. Assim, pouco se vê do país em desconstrução e da bela natureza ao seu redor, registrados por uma fotografia que nem mesmo publicitária pode ser considerada – de tão tímida, talvez apenas na telinha possa deixar o incômodo de lado. Ainda que tenha sido filmado na região, a impressão que se tem é que a maior parte das cenas foram feitas em um estúdio qualquer, sem maiores atenções ou cuidados. Colheita Amarga junta todos os elementos para se contar uma história grandiosa, mas em poucos minutos deixa claro não saber o que fazer com nenhum deles. E, assim, tem-se um conjunto absolutamente carente de harmonia, repleto de falhas e irregularidades, cujas partes até podem despertar alguma curiosidade individual, mas quando unidas causam apenas frustração e revolta – não entre os personagens, mas do lado de cá da ação.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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