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Sinopse

Com a ajuda de sua filha adotiva, o bandido Rubens decide dar o último golpe antes de se aposentar da vida do crime: assaltar cofres particulares num banco na Avenida Paulista, em São Paulo. Mas, algo dá muito errado.

Crítica

No dia 27 de agosto de 2011, às 23h50min, uma quadrilha quebrou as portas de vidro de um dos maiores bancos na avenida Paulista – nada menos do que a via mais importante e movimentada de todo o país – e, com os alarmes desligados, renderam o segurança. De posse de códigos de acesso e com a participação comprovada de funcionários do local, os invasores por lá permaneceram por cerca de 10 horas (!), sendo que arrombaram quase 200 cofres de clientes privados, levando consigo tudo o que encontraram. Estima-se que tenha sido roubado mais de R$ 500 milhões. Segundo reportagens da época, só o planejamento levou mais de um ano. Cinco homens foram presos e condenados, e, mesmo assim, somente um chegou a cumprir pena, e em regime semiaberto. E ainda que tudo isso tenha sido levantado, tanto a instituição financeira violada – que levou mais de uma semana para apresentar queixa – quanto os correntistas afetados se recusaram a tecer comentários sobre o caso. Como se percebe, a situação é bastante única e repleta de particularidades. No entanto, nada disso está em Assalto na Paulista, que apesar de se apresentar como “inspirado em fatos reais” (o que já se trata de uma redundância, afinal, não existe fatos ‘irreais’), concentra sua trama mais em uma elucubração a respeito dos bastidores desse episódio do que no ocorrido em si.

Aliás, a ideia que permeia a realização é similar, ainda que menos ambiciosa, àquela perseguida por outro longa semelhante: Assalto ao Banco Central (2011). Este, curiosamente, contava com o mesmo protagonista, Eriberto Leão, que mais uma vez entrega um tipo metido a líder, porém incapaz de conter as próprias emoções e servir de exemplo aos homens que agrupa – e será essa falta de controle que acabará colocando tudo a perder. Outro elemento que pode servir de referência é o fato de ser dirigido por Flavio Frederico, cineasta que também havia se aproximado do submundo da contravenção com a cinebiografia Boca (2010). Em ambos os casos, tanto um (Leão) quanto o outro (Frederico) obtiveram resultados mais interessantes. É como se esse trabalho mais recente de ambos fosse como um produto genérico dos esforços anteriores da dupla.

O maior problema de Eriberto Leão, um ator de potencial limitado, nem é tanto quando lhe confiam personagens mais densos ou arriscados – lançado quase ao mesmo tempo, em Maior que o Mundo (2022), no qual se apresenta como uma figura solta e descompromissada, acaba alcançando um efeito mais envolvente – e, sim, quando ele mesmo decide se levar a sério além da conta. Pois é exatamente dessa forma que se apresenta como Rubens, o ‘cérebro’ por trás dessa operação. O que o leva a se envolver nesse golpe, quais suas motivações, como cada um dos membros da gangue foi escolhido e o que esperam atingir como resultado? Pouco se sabe. O roteiro, escrito por Mariana Pamplona, parceira habitual do diretor, prefere perder tempo em flashbacks pouco esclarecedores e ancorados em desculpas repletas de lugares-comuns (ele já foi um menino feliz, e mesmo assim acabou envolvido em contravenções, enquanto que seu braço direito, a enteada vivida por Bianca Bin, entrou para o mundo do crime por ter sido abusada pelo pai e ter sido obrigada a recorrer à violência para se livrar dessa situação).

Duas questões são pontuais, no entanto. Apesar do título, de avenida Paulista há muito pouco. Em nenhum momento se justifica a escolha dessa filial bancária, e além de duas ou três tomadas aéreas de drone, nenhuma outra referência geográfica é feita. Quanto ao assalto em si, esse também é abordado de modo superficial. A invasão soa relativamente banal – é de se espantar que não ocorram agressões do tipo diariamente por todo o país, a se tomar pelo que se vê aqui – e o tempo que passam lá dentro, a despeito de um ou outro recurso (o ar condicionado quebra, e o calor passa a ser desculpa para as tensões se elevarem), os embates entre eles soam tão gratuitos que quando passam a acertar suas desavenças na base da bala, desde tiros aleatórios até duelos ensaiados, para a audiência será impossível se importar com as ausências de um ou outro dos envolvidos, uma vez que ninguém parece ser particularmente relevante para que alcancem seus intentos.

Dessa forma, Assalto na Paulista tenta a todo custo se firmar como uma obra de gênero, inserido dentro de um histórico de títulos policiais com muita ação e altas doses de adrenalina, mas seus realizadores esquecem que, mais importante do que os eventos que enumeram – sejam eles fictícios ou não – é a profundidade destes personagens e a capacidade de identificação que geram com o espectador que acabará fazendo diferença. Reconhecer seus limites é o primeiro passo para que um artista ofereça o seu melhor. O segundo, claro, é se propor desafios, mas dentro de ambientes que lhes ofereçam segurança e respeito. Os nomes responsáveis por esse projeto fizeram melhor antes, e dessa vez se mostram confortáveis em ambientes já conhecidos e explorados que nada acrescentam aos seus históricos. Da mesma forma, também redundante será a experiência da plateia, que dessa incursão pouco – ou mesmo nada – conseguirá extrair de válido. Um desperdício mútuo, portanto.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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