Nascido Jaime Melo Jr., o paraense Jaloo atualmente é uma das principais figuras do cenário fonográfico independente do Brasil. Cantor, compositor e produtor musical, ele também dirige os próprios clipes. Em 2015, lançou seu primeiro álbum, #1, que não demorou para cair nas graças do público. Performático e criativo, Jaloo estreia nos cinemas em Paraíso Perdido (2018), longa-metragem de Monique Gardenberg, interpretando Imã, cantor da casa noturna que dá nome ao filme. A trajetória particular dessa “figura de luz” (definição da cineasta) é atravessada pela violência da homofobia, o que obriga seu avô, José (Erasmo Carlos), a contratar Odair (Lee Taylor), policial então incumbido de salvaguardar sua integridade física. O Papo de Cinema foi convidado para a rodada de entrevistas com o elenco, ocasião que sobreveio à cabine de imprensa. Jaloo chegou ao local discretamente, embora com figurino próprio à sua persona artística. Surpreendentemente tímido – ou nervoso – ele conversou gentilmente conosco sobre esse debute cercado de responsabilidades, afinal Imã é um dos pilares da trama. Confira este Papo de Cinema exclusivo, com o simpático e, agora, talentoso ator Jaloo.
Como foi receber esse convite para estrear no cinema?
Foi muito inusitado. Fiquei surpresíssimo e também, devo dizer, bem descrente, viu? Sou bastante metódico e realista. Virgem com capricórnio (risos). Quando a Monique veio falar do filme, tive medo. Será que me garantiria? Fiquei apaixonado assim que li o roteiro, mas assustado, porque o Imã é um super personagem. Apenas depois de fazer o teste comecei a acreditar. A Monique já tinha acreditado, pois logo após a cena ela disse: “é tu, mesmo”.
Você acredita que o viés performático dos seus clipes foi determinante para essa escolha?
Com certeza. A própria maneira de me relacionar com a câmera. A Monique enxergou um potencial que nem eu sabia possuir. Tem isso de você utilizar talentos, no meu caso, a questão de palco, de performar, a relação com a música, e coloca-los à disposição de outras ramificações artísticas. Por isso deu certo.
Estrear num filme tão marcado pela música facilitou?
Ah, com certeza. É uma zona de conforto para mim. Estou acostumado com isso de palco, cantar e entreter. Portanto, saber que o Paraíso Perdido tinha diversos números musicais me deixou bem mais tranquilo para fazer. Foi mais simples deixar de lado os meus medos.
Você costuma assistir a filmes, frequentar cinema?
Não sou exatamente “mergulhadão”. Não sou cinéfilo. É assim que se chama, né? Mas tenho filmes que guardo no coração, desde Meninas Malvadas (2014), para mim um verdadeiro clássico desse tipo de produção mais leve, a algo como Dançando no Escuro (2000), que é aquela coisa densa e sofrida. No geral, sou bem eclético.
E as dinâmicas de filmagem, as especificidades do set?
Especialmente no que diz respeito à música independente, a rotina de trabalho árduo é bem parecida (risos). E, assim como a música, o cinema no Brasil também é um sobrevivente. Foi foda essa dinâmica de set. Gastei muita energia, foi puxado e sofrido. Depois de fazer determinadas cenas, tinha vontade de arrancar a roupa e sair gritando pela rua (risos). Mas, quando está pronto, assim que acaba, já bate saudade. Quando você vê o trabalho finalizado, bate orgulho. É um sacrifício, de certa maneira, mas é isto: um passo para trás e dois para frente. Sabe aquela coisa de se doar para ganhar muito no fim? Pois é.
E a química com Humberto Carrão, haja vista que os personagens de vocês são tão íntimos?
Estabelecer isso foi bem tranquilo. Fiquei bastante apavorado no começo, com receio dele achar que eu estava tirando alguma casquinha (risos). Mas, logo nos entendemos, fomos nos descobrindo. Hoje em dia, é muito louco, tenho um carinho enorme por ele, coisa de irmão, mesmo. Quero saber se ele está bem. Esse tipo de aproximação proporcionada pelo cinema é muito louca. Existe uma alegria quando a gente se encontra. Fico muito feliz com tudo isso. Da mesma maneira, isso ocorre com, por exemplo, a Hermila Guedes e a Júlia Konrad. São as minhas meninas.
Seu personagem sofre uma violência infelizmente cotidiana. Como você percebe isso?
Fico muito contente com a abordagem porque, ao mesmo tempo em que o filme permite uma fuga da realidade, a instauração da fantasia por meio de toda aquela suntuosidade imagética, é legal mostrar que somos seres humanos. Nascemos, crescemos e morremos, como já dizem as cartilhas de ciências. Infelizmente também sofremos violência. Construir boa parte da trama a partir disso é simplesmente mostrar a natureza da vida. A vida é assim.
Podemos esperar mais Jaloo no cinema?
Olha, estou muito “jogado” no segundo disco. É uma loucura. Quero muito que aconteça, porque o Jaloo apenas existe por causa das músicas. Mas, claro, se rolar um convite e eu perceber que vale a pena, topo. De qualquer maneira, vou estudar atuação. Fiz o caminho inverso, né? (risos) Vou estudar para ter uma relação melhor com a câmera. Sou uma pessoa de backstage. Para você ter uma ideia, dirigi meus próprios clipes. Aliás, quando a Monique pedia minha opinião sobre as coisas, eu ficava meio “assim” (risos). Encabulado, mas extremamente contente.
(Entrevista concedida ao vivo, no Rio de Janeiro, em maio de 2018)
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