Crítica


6

Leitores


1 voto 8

Sinopse

Numa estrada deserta, a jovem Nish para num posto de gasolina para carregar a bateria de seu carro. Enquanto a carga não completa, ela vai ao Black Museum, um museu de beira de estrada que abriga "artefatos criminológicos autênticos". O dono do local, Rolo Haynes, a convida pra entrar e dar um passeio. Enquanto ela observa os artefatos, ele conta as histórias de alguns deles.

Black Mirror


Black Mirror :: T06


Black Mirror :: T05


Black Mirror :: T04


Black Mirror :: T03


Black Mirror :: T02


Black Mirror :: T01


Crítica

Havia uma força inerente aos episódios de Black Mirror no começo da empreitada. Ela vinha da sutileza com que a tecnologia se infiltrava nas histórias e ditava seus rumos mesmo sem assumir o protagonismo da trama. A partir desse conceito de um futurismo mundano, que podia encontrar efeitos colaterais na vida de qualquer pessoa, o seriado assustava e nos fazia terminar cada capítulo com um olhar suspeito ao redor. Qual dessas tantas tecnologias que nos cercam irão se voltar contra nós daqui a algum tempo? Será o celular? O leitor biométrico do banco? O microondas? A série já fez seus protagonistas reféns de sistemas de vigilância, de curtidas online, de status virtuais, de transmissões por streaming. Recursos que usamos abundantemente hoje, e que podem, amanhã, cercear a nossa liberdade. Esse é o grande erro de Black Museum.

Não se trata de um roteiro ruim. Nem um pouco. Há um clima de road horror quando Nish (Letitia Wright) para seu carro para “abastecer” (com um painel solar, tipo de detalhe que compõe eficientemente o universo futurista da série) num antigo posto aparentemente abandonado. Lá, ela descobre a instalação que dá nome ao episódio, uma exposição permanente de objetos com histórias sombrias por trás. O guia e dono do museu, Rolo Haynes (Douglas Hodge), parece ter trabalhado no desenvolvimento de vários deles, e sai contando para Nish os casos que fizeram com que alguns dos mais peculiares viessem parar ali – o que basicamente estrutura o capítulo como uma série de pequenos contos de horror.

Aí entra o problema. Embora todas as historinhas sejam cativantes e, de fato, bem incomodativas, nenhuma delas é minimamente pautada por algum tipo de tecnologia que temos em mãos hoje. Transferência de consciências e back-up de personalidades estão longe de se relacionar diretamente com qualquer coisa que possamos encontrar no dia a dia. E o pior, os problemas que elas causam para os personagens são todos exclusivistas, ou seja, acontecem com aquelas pessoas por uma série de fatores que se alinharam para tal. Não é algo que qualquer espectador possa pensar: “caramba, pode ser eu daqui a alguns anos”. Não há a reflexão, não há uma filosofia por trás, não são falhas subestimadas no sistema de funcionamento de um upgrade, são apenas projetos tecnológicos que deram muito errado, e que, aliás, eram arriscados desde o princípio.

Assim, os “contos” dentro do conto que é Black Museum, acabam parecendo mais com ideias de episódios, premissas que não ganharam a paciência de um roteirista para serem desenvolvidas apropriadamente. Entretanto, o capítulo funciona mesmo fugindo mais para a fantasia de horror. É uma narrativa tensa na medida em que a situação vai ficando estranha, com os personagens assumindo suas verdadeiras funções na trama. Mas não dá para dizer nem mesmo que a bandeira antirracista tem algum impacto, pois quando ela é levantada pelo projeto já é tarde demais para ser absorvida. Há outros desdobramentos mais cativantes que ofuscam a questão. A ideia em si, de um museu com tecnologias que deram errado, é mais Black Mirror do que as próprias tecnologias em si. Uma pena que este episódio final de quarta temporada decida mergulhar mais naqueles objetos estranhos e implausíveis do que no próprio conceito de expô-los ao público. Quais são as implicações sociais e, inclusive, legais disso? Vemos alguns lampejos disso, mas só.

Black Mirror tinha uma ideia tão boa e, pelo andar de alguns dos episódios dessa nova leva, isso foi transformado em uma caricatura, e a proposta inicial se voltou contra o próprio seriado. Assim, Black Mirror agora é algo que, como dizem os memes, “é muito Black Mirror”.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é formado em Produção Audiovisual pela PUCRS, é crítico e comentarista de cinema - e eventualmente escritor, no blog “Classe de Cinema” (classedecinema.blogspot.com.br). Fascinado por História e consumidor voraz de literatura (incluindo HQ’s!), jornalismo, filmes, seriados e arte em geral.
avatar

Últimos artigos deYuri Correa (Ver Tudo)

Grade crítica