A categoria de Melhor Filme Internacional, que até poucos anos atrás se chamava Melhor Filme em Língua Estrangeira – mas que todo mundo conhece por Melhor Filme Estrangeiro e ponto – apresenta uma curiosidade neste ano: o grande favorito é o representante de um país… cuja língua oficial é o inglês, tal qual os Estados Unidos! Mas, claro, não houve engano nenhum nesse sentido. Apesar de sua origem, a trama é em sua maior parte falada em alemão, polonês e até em iídiche. E falando no idioma germânico, o vencedor do ano passado está mais uma vez entre os selecionados, porém a gangorra se inverteu, e agora sua presença é não mais do que uma surpresa – curioso, hein? Ainda assim, a Alemanha pode se dar por contente por estar duplamente representada, pois Wim Wenders, um dos maiores cineastas alemães de todos os tempos, é diretor do escolhido do Japão! E entre um título que conta com toda a estrutura de promoção da Netflix nos bastidores e outro que está concorrendo em outras quatro categorias – inclusive na de Melhor Filme – não fica tão fácil assim apontar o com mais chances de vitória. Confira nossas apostas!
Indicados
- Eu, Capitão (Itália)
- Dias Perfeitos (Japão)
- A Sociedade da Neve (Espanha)
- A Sala dos Professores (Alemanha)
- Zona de Interesse (Reino Unido)
FAVORITO
Zona de Interesse (Inglaterra)
Jonathan Glazer, diretor e roteirista de Zona de Interesse, é um velho conhecido dos cinéfilos de plantão. Afinal, foi responsável por longas como Sexy Beast (2000) – que rendeu uma indicação ao Oscar para sir Ben Kingsley – e o drama Reencarnação (2004), com Nicole Kidman, além do tenso Sob a Pele (2013), no qual Scarlett Johansson aparecia como uma alienígena sedenta por novos corpos. A recente investida, no entanto, é a mais bem-sucedida de sua carreira, tendo sido premiada no Festival de Cannes, de ter recebido nada menos do que nove indicações ao Bafta, ao Critics Choice, seis ao European Film Awards, três ao Globo de Ouro, ao Satellite, ao Gotham, no Film Independent Spirit Awards e em dezenas de premiações regionais de críticos, além do National Board of Review e na Sociedade Nacional dos Críticos de Cinema do EUA. Sua maior pedra no sapato, na maioria dessas premiações, é que batia de frente com Anatomia de uma Queda (2023), longa francês que é, de fato, a produção internacional de maior destaque nesta temporada. Porém, como a França fez o favor de escolher outro título para representá-la nessa disputa – o gastronômico O Sabor da Vida (2023), que não conseguiu a indicação – o caminho ficou livre para Zona de Interesse, enfim, fazer a festa! Só para constar, concorre ainda em outras quatro categorias: Melhor Filme, Direção, Roteiro Adaptado e Som.
AZARÃO
A Sociedade da Neve (Espanha)
Nunca duvide do poder da dona Netflix, não é mesmo? Ainda mais se o filme for inspirado em um trágico episódio real, que já ganhou adaptações anteriores, porém nunca com a mesma dose de realismo e apuro técnico como a dessa dirigida por J.C. Bayona – outro nome de forte entrada em Hollywood, pois assinou sucessos como O Impossível (2012) e Jurassic World: Reino Ameaçado (2018), por exemplo. A Sociedade da Neve é ambientado entre o Uruguai e o Chile, na maior parte na Cordilheira dos Andes, mas como se trata de uma produção espanhola, é por esse país que aparece na disputa. Presente em quase todas as premiações da temporada – Bafta, Critics Choice, Globo de Ouro, Satellite – não ganhou quase nada (perdia sempre para Anatomia de uma Queda), ainda que na Espanha tenha se destacado, com cinco vitórias (inclusive Melhor Filme) no Círculo de Críticos de Cinema Espanhóis, treze indicações ao Goya, premiado no Festival de San Sebastian, melhor filme europeu nos Prêmios Gaudi, duas vitórias (inclusive Melhor Direção) nos Troféus Feroz e melhor filme não andaluz nos Premios Carmen. Como se percebe, santo de casa pode, sim, fazer milagre. Mas será que tem força suficiente para esse impacto alcançar o ouro hollywoodiano? Para constar, está concorrendo também na categoria de Melhor Maquiagem e Cabelos.
SURPRESA
A Sala dos Professores (Alemanha)
O país que mais vezes ganhou o Oscar nessa categoria é a Itália, com 14 vitórias. Eu, Capitão, no entanto, até foi indicado ao Globo de Ouro e ao Satellite, além de premiado no Festival de Veneza, mas sua participação aqui é mais de prestígio do que qualquer outra coisa. O Japão, por sua vez, ganhou em cinco ocasiões – a mais recente foi com Drive My Car, em 2022 – mas ao que tudo indica Wim Wenders irá, mais uma vez, bater na trave – conta com três indicações anteriores, todas em Documentário em Longa-Metragem, um deles uma coprodução brasileira (O Sal da Terra, 2014, codirigido por Juliano Salgado), e mesmo assim nunca ganhou. E o que dizer, por sua vez, de A Sala dos Professores? O filme dirigido por Ilker Çatak foi exibido em uma mostra paralela (Panorama) do Festival de Berlim (ou seja, não se qualificou para a principal), mas foi ganhando repercussão à medida em que ia circulando (levou 5 troféus no German Film Awards – o “Oscar” da Alemanha – inclusive o de Melhor Filme). Nos Estados Unidos, foi indicado ao Satellite e apontado com um dos melhores estrangeiros do ano no National Board of Review… e só. Sua presença por aqui, portanto, foi a que mais causou espanto, ainda mais por ter superado fortes concorrentes, como Folhas de Outono (Finlândia), O Sabor da Vida (França), Terra de Deus (Islândia) ou Tótem (México). Então, só por ter sido lembrado, já tem mais do que comemorar!
ESQUECIDO
Retratos Fantasmas (Brasil)
O representante brasileiro nem havia sido pré-selecionado para a shortlist, quando a Academia divulga uma fase intermediária, com 15 títulos semi-qualificados (na final, sobram apenas cinco, os que estão na lista no início deste artigo). Mas como não reclamar da falta de sensibilidade dos votantes da Academia que esnobaram o muito interessante documentário assinado por Kleber Mendonça Filho, um dos mais ativos cineastas contemporâneos do nosso país? Exibido fora de concurso no Festival de Cannes e na sessão de abertura do Festival de Gramado, trata-se de uma obra bastante pessoal para o diretor, além de uma carta de amor ao cinema enquanto paixão que atravessa tempo e espaço. Caso tivesse sido selecionado, seria motivo de orgulho para qualquer um. Não foi dessa vez, infelizmente. Mas isso fala mais sobre a visão limitada destes que não viram nele um concorrente de respeito, do que sobre nós, que apostamos em um título longe do convencional e que mostrou que a produção nacional pode, sim, investir num olhar mais amplo e apaixonado. Perdem eles, afinal.
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