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Sinopse

O amor e o tempo que passa, numa Cuba onde o tempo parecia não passar. É um retrato de um mundo prestes a desaparecer para sempre, às vésperas de uma mudança radical e imprevisível. Histórias de amor de três casais cubanos, filmadas ao longo de duas décadas.

Crítica

A cineasta Alice de Andrade entrevistou cerca de 40 casais cubanos para o seu curta-metragem Luna de Miel, nos idos de 1992. Os tempos na ilha comandada por Fidel Castro eram distintos, principalmente, pois lá vigorava um embargo econômico que perdurou por mais de 50 anos. Decida a capturar as mudanças pelas quais o país caribenho vem passando rapidamente após o fim das restrições norte-americanas, a realizadora resolveu regressar e conversar com três das duplas outrora perscrutadas, criando Vinte Anos. Quanto aos casamentos, as conjunturas encontradas também são diferentes, com pares duradouros e alguns desfeitos e/ou reconfigurados. Imageticamente, é fácil distinguir passado e presente, porque eles surgem com texturas e formas singulares/indicativas. Discorridos os momentos iniciais, dos reencontros com os protagonistas de antes – apresentados de formas diversas –, há a pulverização do olhar, numa tentativa de abranger as complexidades de uma realidade na iminência de sua alteração definitiva/definidora.

Na metade inicial, Vinte Anos segue um protocolo mais ou menos desenhado pela voz da cineasta/narradora, partindo exatamente das experiências dos casais nos anos que separam o curta do longa. É visível a emoção das pessoas que recebem Alice com entusiasmo, o mesmo demonstrado quando elas assistem aos seus discursos pretéritos, cheios de idealismo e da vontade de construir uma trajetória. Todavia, esse procedimento, repetido diversas vezes ao longo do filme, se mostra meramente ilustrativo e curioso, justamente pela ausência de notáveis variações. Ocasionalmente, o foco se estreita na relação dos filhos com as filmagens dos pais, mas esparsamente há ambiente suficiente para que tal dinâmica determine algum viés. A câmera passeia um tanto a esmo por Havana, capturando questões cotidianas, como a tentativa de um rapaz empreender a construção de um parque de diversões, algo visto como sintoma, mas não encarado com qualquer profundidade. A questão temporal também é algo problemática.

Apesar de se chamar Vinte Anos, o documentário não se detém, no que diz respeito ao retorno, exatamente em duas décadas desde o curta-metragem. Alice de Andrade monta seu novo filme a partir de fragmentos retidos em diversas circunstâncias. Esse vai e vem cronológico é costurado de maneira claudicante, nem sempre com o estabelecimento de uma dialética entre as instâncias. O painel, contudo, é suficiente para entendermos a transição propiciada pela abertura de Cuba, com o registro de uma aquecida especulação imobiliária, contrastante com os mutirões de antigamente, que garantiam moradia para todos. Ideologicamente falando, não há um posicionamento claro, pois a intenção da cineasta é observar de que maneiras as pessoas reagem às mudanças. No homem que garante o sustento colhendo ervas e plantas medicinais à família que migrou aos Estados Unidos em busca de novas oportunidades vê-se uma influência latente da configuração social.

Combalido pela reiteração, Vinte Anos também carece de tônus, sobretudo do meio em diante, quando parece ter esgotado suas principais ideias, assim que a análise dessa terra gradativamente substituída por sua versão inclinada ao capitalismo arrefece com a representatividade dos casais que deveriam funcionar como epicentros narrativos. Outro elemento subaproveitado é a nova geração, no mais das vezes encarada como propensa a evadir, dona de outros anseios, não raro encontrando prosperidade no exterior. No que tange à religiosidade, outros componente frequente, a amostragem da qual se vale a cineasta Alice de Andrade permite a constatação de uma pluralidade, pois há, por exemplo, evangélicos convertidos e devotos dos orixás africanos. Mas, esse é outro traço encarado superficialmente, tido como significativo à constituição identitária, porém somente pincelado, como boa parte dos demais.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
5
Robledo Milani
5
MÉDIA
5

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