Crítica


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Sinopse

Samuel tem sua vida transformada quando uma ex-namorada o procura e deixa sob sua responsabilidade sua filha, Glória, um bebê de poucos meses. Incapaz de cuidar de uma criança recém nascida e determinado a devolvê-la à sua mãe, ele viaja a Londres para tentar encontrá-la, sem sucesso. Oito anos depois, enquanto Samuel e Glória vivem em Londres e se tornaram inseparáveis, a mãe da criança volta em suas vidas para recuperar a filha.

Crítica

Um homem mulherengo e sem muitas responsabilidades certo dia acorda com uma bonita garota batendo à sua porta. Com ela, um bebê, que anuncia ser filho dele. A surpresa só não é maior porque no instante seguinte ela dá um jeito de ir embora, deixando a criança com ele. A vida tal qual ele conhecia está, portanto, terminada, e uma nova, com muitos mais compromissos e obrigações, está prestes a começar. Essa história não é nova e muita gente já a viu antes, tanto em longas similares (quem lembra de Presente de Grego, 1987, no qual Diane Keaton tinha que se virar com um bebê inesperado?) quanto na referência imediata Não Aceitamos Devoluções (2013), do qual Uma Família de Dois é uma refilmagem direta. Afinal, se o clássico da Sessão da Tarde Três Solteirões e um Bebê (1987) já se tratava de um remake hollywoodiano do francês 3 Homens e um Bebê (1985), agora é a vez da França dar o troco. E a resposta é igual até na qualidade do resultado, tão mediano hoje quanto três décadas atrás.

O que salva Uma Família de Dois do descaso imediato é a presença contagiante de Omar Sy como protagonista. O astro que despontou no irresistível Intocáveis (2011) desde então tem tentado uma carreira internacional, mas suas participações em blockbusters como X-Men: Dias de um Futuro Esquecido (2014), Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros (2015) e Inferno (2016) são absolutamente esquecíveis. Ao contrário do que temos percebido em seus trabalhos em casa, como nos interessantes Samba (2014) e Chocolate (2016). Dessa vez, ela está novamente à vontade como esse folgado que acaba se mudando da ensolarada costa francesa, onde levava uma vida de excessos, para uma nublada Londres após se descobrir tendo que se virar como pai solteiro. Sem formação, mas incrivelmente ágil e desprendido, acaba caindo nas graças do produtor de cinema Bernie (Antoine Bertrand, de Meus 533 Filhos, 2011), que o leva para trabalhar como dublê. Com uma atividade profissional diária que mais parece uma grande brincadeira, ele consegue fazer da infância da pequena Gloria (Gloria Colston) uma diversão sem fim.

A questão é que Omar Sy é hábil em levar seu personagem além do óbvio estereótipo. Este é um homem com um problema em mãos, e por mais que ame sua filha, também precisa aprender como criá-la no dia a dia. E isso o leva a alguns deslizes, como a mentir a respeito da origem da mãe da garota – que, de acordo com a fantasia que inventa, é uma espiã internacional que vive em missões secretas ao redor do mundo e, por causa disso, nunca pode visitá-la. Tudo muda, é claro, quando, mais de dez anos depois, Kristin (Clémence Poésy, de Harry Potter e o Cálice de Fogo, 2005) decide reaparecer, dizendo-se recuperada da vida desregrada que levava e pronta para voltar a fazer parte da criação da filha. Uma coisa, no entanto, é estar de volta em cena. Outra, bem diferente, é querer a menina para si e levá-la para morar consigo em Nova York, lutando judicialmente pela guarda da criança com o pai.

Provavelmente, este é o grande tropeço do longa de Hugo Gélin (mais conhecido por ter sido o produtor do divertido A Gaiola Dourada, 2013). Ao contrário do seu protagonista, que maneja bem as nuances do tipo de defende, o realizador não parece muito satisfeito com as mudanças impostas à narrativa – que já estavam presentes no original – e promove essas transições sem muito cuidado. Assim, da comédia leve partimos para o drama de tribunal sem muito aviso. O pior, no entanto, é quando uma doença se faz presente, promovendo um segundo tom, mais próximo, dessa vez, ao melodrama barato. E assim, o que já havia começado de modo duvidoso, termina num discurso quase constrangedor e previsível, que nem mesmo o carisma de Omar Sy é capaz de salvar.

Sucesso de público da França e uma das grandes apostas da produção daquele país neste ano para um melhor alcance no exterior, Uma Família de Dois tem seus bons momentos que, infelizmente, não são suficientes para se mostrarem acima do conjunto final. Com um elenco afinado – além de Sy, Bertrand é outro destaque, e suas intervenções são invariavelmente um ponto luminoso na trama – e uma menina literalmente apaixonante no centro da ação – Colston é um verdadeiro achado – o filme ganharia pontos se não ficasse tão preso àquele em que se baseia e buscasse trilhar um caminho mais diferenciado. Falta ao diretor mais ousadia neste sentido. Assim, preso a um cenário que o deixa engessado, o longa frustra por não atender as expectativas levantadas e por naufragar em suas próprias ambições. Principalmente por colocar Omar Sy no mesmo patamar do mexicano Eugenio Derbez, autor e ator da versão anterior – e qualquer um que tenha um mínimo de familiaridade com os dois sabe que há, literalmente, um oceano entre eles.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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