Crítica


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Sinopse

Uma agente do FBI e um negociador de reféns são chamadas para lidar com ladrões de banco. Enquanto o crime vai se desenrolando, outros elementos não revelados começam a se manifestar, revelando intenções que não haviam ficado claras.

Crítica

Mais de uma década atrás, Spike Lee dirigiu um filme com cara de projeto de encomenda, com o único e declarado propósito de mostrar seu valor dentro de uma indústria cada vez mais preocupada com números e contas. O Plano Perfeito (2006) se tornou o longa mais bem-sucedido financeiramente de toda a sua carreira, com quase US$ 200 milhões arrecadados ao redor do mundo. Obviamente, nos anos seguintes mais de uma proposta de continuação lhe foi feita, e todas, ao menos por ele, rejeitadas. Quando os executivos dos estúdios se deram conta que o cineasta preferia seguir investindo em propostas mais autorais – como o recente Infiltrado na Klan (2018), que lhe rendeu um Oscar – foi a vez da “fila andar”, como se diz por aí. E o resultado é esse O Plano Perfeito 2, que apesar de forçar laços para se declarar sequência do anterior, é basicamente uma refilmagem com atores menos conhecidos, uma realizadora pouco experiente no comando e um aparato de produção muito mais tímido. Ou seja, é o mesmo, porém pior.

Quando um filme faz sucesso, ao menos em Hollywood a tendência de seguir os mesmos passos que antes deram certo é declarada. Porém, ao invés de produzir um genérico qualquer, o que a diretora M.J. Bassett (de séries como Punho de Ferro, 2018, e Altered Carbon, 2020) se propõe é retrabalhar signos já existentes, partindo de uma cópia sem vergonha para um pastiche desajeitado. Se na trama anterior os policiais vividos por Denzel Washington e Jodie Foster precisavam descobrir o que o assaltante de bancos interpretado por Clive Owen realmente queria ao tomar uma agência bancária e diversos clientes e funcionários como reféns, agora a estrutura é basicamente a mesma. Afinal, de um lado estão o negociador de reféns (Aml Ameen, de Raízes de Sangue, 2018) e a agente do FBI (Rhea Seehorn, de Better Call Saul, 2015-2020) – mais uma vez um homem negro e uma mulher loira – e do outro quem assume o comando, agora, sim, invertendo o gênero, uma desconhecida que atende pelo apelido de “Mais Procurada” (“Most Wanted”, no original, que é o subtítulo do filme), papel de Roxanne McKee (que apareceu nas primeiras temporadas de Game of Thrones, 2011-2012, e no constrangedor Hércules, 2014).

Pois bem, quando os bandidos tomam conta do prédio, a primeira coisa que fazem é obrigar que aqueles que estavam no local e ficaram presos troquem de roupas e usem máscaras, para que todos tenham a mesma aparência. Assim que os policiais ficam sabendo disso, logo identificam o modus operandi, digamos. “Ah, estão copiando o roubo dos diamantes nazistas de anos atrás”, alguém afirma, como se lembrar de algo assim fizesse parte do seu dia a dia. É nesse ponto em que O Plano Perfeito 2 tenta desesperadamente estabelecer algum tipo de vínculo com a história de O Plano Perfeito. Fala-se muito a respeito de Dalton Russell (Owen), que na verdade teria usado um alias, e seu nome real seria outro. Eis então que a vilã de agora nada mais é do que irmã dele, e só teria se envolvido neste crime pois ele fora sequestrado. Ou seja, para tê-lo de volta, teria que fazer um novo serviço – e, mais uma vez, atrás das heranças milionárias de alemães da Segunda Guerra Mundial. Quanto ouro ou pedras preciosas os bancos norte-americanos são capazes de manter escondidos por tanto tempo?

Eis que, uma vez tão próximo do enredo já visto, não haveria como escapar de que essa relação se tornasse factual – ainda mais quando é dito que um importante personagem do outro filme é a verdadeira motivação por trás dos acontecimentos agora presenciados. Mas sem cachê – ou entendimento – para que ao menos Clive Owen voltasse a reprisar seu papel, a solução foi recorrer a fotos. Mas e no momento do sequestro, como criar a ilusão de que a mesma pessoa estava em perigo? Fácil, bastou colocar um dublê em cena, e cobrir o rosto dele com um saco. Se alguém compra resoluções muito mais espalhafatosas, um drible desse não deveria chamar atenção. Ou, ao menos, é o que os realizadores parecem acreditar. Afinal, esse é somente mais um indício das carências do projeto, tanto na parte técnica – as explosões e sequências de lutas e tiroteios são tão ensaiadas que qualquer sensação de verossimilhança se evapora em segundos – quanto na estrutura do roteiro, calcado do início ao fim naquilo já visto, sem apresentar nada criativo, além de inflado por diálogos forçados (como o ajudante que exige respeito no tratamento) e artificiais (todas as explicações desnecessárias que servem apenas para orientar o espectador desatento).

Por fim, a última pá é jogada por um elenco obviamente aquém do que aqui lhe é exigido. Ameen tenta criar a mesma malandragem de um Eddie Murphy dos anos 1980, mas o que consegue são momentos isolados de constrangimento. Seehorn, por sua vez, é tão dura e sisuda que não parece nunca se divertir – o que, numa trama tão mirabolante como essa, é o mínimo exigido. Já McKee se esforça para impor segurança e autoridade, mas a postura frágil e o alcance limitado das suas ações terminam por sabotá-la. Sem acrescentar absolutamente nada de novo a um gênero já bastante abatido, O Plano Perfeito 2 está longe de revelar qualquer tipo de planejamento, e atingir a perfeição é algo que nem em suas passagens mais inocentes consegue se aproximar. Se nem os fãs mais ardorosos de Spike Lee conseguem defender com muito empenho um filme com nítidas preocupações comerciais, o que dizer dessa versão pouco inspirada e ainda mais limitada?

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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