Crítica
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Sinopse
Um professor encontra um filhote de cachorro abandonado em uma cidade desabitada e decide adotá-lo. A dupla cria um forte laço de amizade e afeto a ponto do cão acompanhar seu dono até a estação todos os dias. No entanto, após uma fatalidade ocorrer com o professor, o cãozinho se vê perdido.
Crítica
Após versões no Japão (A História de Hachiko, 1987) e até nos Estados Unidos (Sempre ao seu Lado, 2009), eis que chegou a vez dos chineses terem um Hachiko para chamarem de seu; Hachiko: Para Sempre, de Ang Xu. Como se percebe, a história do cãozinho fiel ao seu dono tem atravessado décadas e gerações, e por mais que não tenha gerado uma febre imediata – entre o primeiro e o segundo filme o intervalo foi de 22 anos, e para esse longa mais atual foram necessários outros 14 anos – sua permanência na memória afetiva de cinéfilo e admiradores é, no mínimo, impressionante. Afinal, não há grandes diferenças entre uma adaptação e outra – e, é preciso ser sincero, são também semelhantes a todas as histórias de animais de estimação (cães e gatos, principalmente) e seus relacionamentos afetuosos com os proprietários (ou ‘papais’ e ‘mamães’, como muitas vezes os próprios se auto intitulam) superando adversidades e o passar do tempo. E se por um lado o tiro é certeiro e quem aqui se dirigir sabe exatamente o que encontrará pela frente, por outro o descontrole no uso de ferramentas manipuladoras terminam por prejudicar uma experiência mais racional – e, portanto, menos emocional.
Ang Xu não tinha ainda dez anos de idade quando A História de Hachiko foi lançado. É provável, portanto, que o seu contato com essa trama tenha sido primeiro por meio do longa estrelado por Richard Gere, assim como muitos dos espectadores brasileiros que agora irão se confrontar com essa mais recente leitura. É importante frisar a diferenciação pois é perceptível em Hachiko: Para Sempre um esforço de comunicação com o público, deixando um tanto de lado a fidelidade da trama a ser desenvolvida. Ou seja, os personagens podem ser chineses, assim como o idioma falado por eles, mas a forma de filmar e conduzir os acontecimentos é por demais hollywoodiana. O uso de flashbacks no desenrolar dos eventos para criar uma falsa tensão relativa a algo que todos já sabem de antemão, um atrito desnecessário entre os protagonistas que serve apenas para gerar uma torcida da qual se conhece o resultado (é fácil apontar o campeão quando já se viu o jogo) e uma demonstração de entrega e ternura que é quase impossível se posicionar contra: por grande parte do enredo, Hachiko é visto ainda filhote, e somente um coração por demais embrutecido para não se comover frente às travessuras de um pequeno peludo de quatro patas.
Mesmo sendo essa uma história que tem comovido gerações, alguns apontamentos precisam ser feitos. A maior fonte de envolvimento dos espectadores com o episódio aqui narrado não se dá pela conduta ou postura dos personagens humanos, mas, sim, pela forma como Hachiko, o cachorro adotado quase ao acaso e criado por um pai de família com o mesmo ardor – se não maior – que esse cuidou dos próprios filhos, irá se comportar frente a maior das ausências: a daquele que tem como fonte principal de afeto e atenção. Todos os dias, o professor Chen (Xiaogang Feng, considerado um dos maiores nomes do cinema chinês contemporâneo, atuando tanto na frente como atrás das câmeras, como diretor, roteirista e produtor) tem como hábito ir a pé até a estação de teleférico mais próxima de sua casa, para de lá se dirigir até a faculdade onde dá aulas. Ainda que a contragosto desse, Hachiko se habituou a acompanhá-lo nesse trajeto, e por ele aguardar, voltando ao mesmo ponto onde se despediram para reencontrá-lo no final do dia. Porém, como o animal irá reagir quando seu dono falecer?
Alguns empecilhos vão sendo apresentados pelo enredo, de uma forma até mesmo episódica, oferecendo ao todo uma estrutura meio novelesca. Chen e Hachiko se encontram ao acaso, quando o homem se depara com o cãozinho abandonado prestes a ser atropelado pelo ônibus que o leva durante a última etapa de sua jornada diária ao trabalho. Depois, vem a resistência da esposa, Li (Joan Chen, o nome mais “internacional” do elenco, por assim dizer, tendo atuado em produções hollywoodianas, como o oscarizado O Último Imperador, 1987, a cultuada minissérie Twin Peaks, 1989-1991, ou o sucesso de bilheteria O Juiz, 1995, ao lado de Sylvester Stallone), que é contra a presença de cães em casa devido a um trauma de infância. Por fim, há uma característica típica do longa onde essa história se passa: a China, país conhecido, entre tantos outros motivos mais nobres, por ter uma população habituada a se alimentar de carne de... cachorro! Li obriga o marido a dar Hachiko em adoção, e um dos primeiros candidatos a aparecer pega o bichinho com a clara intenção de transformá-lo no jantar daquela noite. Uma visão que pode causar impacto no espectador brasileiro, mas que, felizmente, é abordada com discrição pelo realizador.
Se não há surpresa no desenrolar dos acontecimentos, não se pode fazer vista grossa, por outro lado, para duas decisões um tanto controversas de Ang Xu. Primeiro, tem-se uma onipresença da insistente trilha sonora composta por Lin Li. O compositor veterano teve seus primeiros trabalhos no cinema ainda no início dos anos 1960, e seguiu na ativa produzindo com bastante intensidade até 1982, quando deu início a um hiato que só foi interrompido agora, quatro décadas depois, com Hachiko: Para Sempre. Fica claro que não se manteve atualizado nesse meio tempo, e as composições que oferece são em sua maioria reiterativas, melodramáticas e disputando constantemente com a imagem a condução das emoções, como se o que é visto não fosse suficiente. E se desgraça pouca é bobagem, o final piegas e espírita, com um reencontro pós-morte em um céu cor-de-rosa, se encarrega de jogar a última pá de cal sobre o caixão. Há momentos bonitos e outros verdadeiramente comoventes, é impossível negar. Mas nada que já não se tenha visto antes – e melhor.
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