Crítica


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Sinopse

Na casa isolada que compraram recentemente, Matt e Kate descobrem uma sala capaz de lhes conceder um número ilimitado de desejos materiais. Todavia, do que ambos mais sentem falta é de um filho!

Crítica

Este thriller chegou ao Brasil, curiosamente, com dois nomes. Uma plataforma de streaming decidiu chamá-lo apenas de A Sala, enquanto que os demais canais de distribuição o batizaram como O Quarto dos Desejos. Basta assistir ao longa do diretor Christian Volckman para perceber que, ainda que o primeiro título procure ser uma tradução direta do original The Room, o segundo apelido é muito mais apropriado. E nem devemos nos focar na confusão do canal que, mesmo utilizando o mais simples A Sala, opta por, nas legendas em português, empregar o termo ‘o quarto’ sempre que algum personagem se refere ao tal ‘the room’. Sinal de esquizofrenia ou a mais básica falta de atenção? Um pouco dos dois, provavelmente. Mas, no caso, o que está em discussão é um cômodo – sala ou quarto, tanto faz – que, uma vez lá dentro, tudo o que se pede se torna realidade. A premissa é instigante. É de se lamentar, no entanto, que seja desenvolvida de forma tão displicente.

Kate (Olga Kurylenko) e Matt (Kevin Janssens, de Vingança, 2017) formam um casal que, decidido a abandonar a correria de Nova Iorque, se muda para um casarão no interior que adquiriram a preço de banana. Ao chegarem, percebem que há muito a ser feito no local para torná-lo, no mínimo, habitável. Mas os dois não estão preocupados. Ela é tradutora, ele é pintor. Tudo o que precisam está dentro daquelas paredes e, mais importante ainda, eles têm um ao outro. Ou assim o espectador é levado a acreditar. Afinal, há algo faltando. E não irá demorar para que essa carência se torne evidente. Porém, ela só se manifestará com força justamente quando se vislumbra a possibilidade de saná-la. Se trata de uma necessidade antiga, há muito explorada, mas agora adormecida, quase esquecida. Quando se deparam com uma porta secreta e com o potencial miraculoso que lá dentro encontram, aquela chama antiga volta a se manifestar.

No meio da reforma, em certo momento, já cansado, Matt confessa para si mesmo: “como gostaria de uma nova garrafa”, pois queria seguir bebendo. Uma instabilidade elétrica se sucede, e quando as luzes voltam, uma bebida cheia aparece como mágica na sua frente. Ele até pode estranhar no começo, mas logo abraça a surpresa, e em dois toques estará pedindo para que materializem quadros de Van Gogh e Da Vinci, roupas extravagantes e a maior infinidade de tranqueiras que imaginar. E, claro, dinheiro – muito dinheiro. Essa, aliás, será a primeira solicitação de Kate, quando é chamada para testar as possibilidades recém-descobertas. Porém, quando percebe que qualquer coisa que desejar irá se tornar realidade, aquele antigo sonho volta à tona: a vontade de ter um filho. Segundo os médicos, não há impedimentos físicos entre eles. No entanto, já tiveram duas tentativas anteriores, e ambas terminaram em abortos.

Depois do excesso, é natural que venha a ressaca. Quando, enfim, deixam passar o êxtase da novidade e começam a pensar no que agora possuem em mãos, começam a se preocupar com as consequências dos seus atos. É quando a história daquela casa ressurge: os antigos proprietários foram assassinados, e o desconhecido culpado pelo crime se encontra em um hospital psiquiátrico nas redondezas. Sua única declaração, que se tornou manchete nos jornais, foi: “o quarto me obrigou a fazer isso”. Sem descobrir muito com o estranho, Matt terá outro problema em mãos: e esposa fez o inimaginável, e pediu por um bebê: Shane. Mas há dois fatos que eles só ficam sabendo depois. O primeiro: tudo que o quarto entrega, só existe dentro da casa, pois assim que sai dos seus domínios apodrece em questão de instantes. E o segundo: para que algo – ou alguém – criado pelo quarto possa sobreviver no exterior, é preciso que ocupe o lugar do criador. Ou seja, aquele que fez o pedido precisa morrer para dar espaço ao que gerou.

Bom, se as teorias expostas em O Quarto dos Desejos parecem um tanto aleatórias, é porque de fato o são. Nada faz muito sentido, e dentro de um contexto fantasioso como o perseguido pela trama, isso nem faria muita diferença, caso houvesse uma mínima lógica interna a ser respeitada. Mas não é o que se verifica. Kurylenko está exagerada, sem uma direção a seguir, enquanto que Janssens tem desempenho apagado, e a inconstância do seu personagem se torna irrelevante após certo ponto. O pior, no entanto, é o descaso com que o potencial do quarto é abordado, principalmente pela capacidade de gerar qualquer coisa – absolutamente qualquer coisa – que lhe for solicitada, incluindo aí uma nova realidade. Estes conceitos até chegam a ser tangenciados, mas nunca aprofundados de acordo com o que poderia ser esperado. No final das contas, tem-se apenas para um filme de terror psicológico que não assusta e nem provoca qualquer tipo de reflexão, seja pelas ideias distorcidas de promove, como também pelo modo desajeitado que as explora em cena.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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