Crítica


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Sinopse

Um ano após a volta de Will, tudo parece ter voltado ao normal. Mas a escuridão espreita sob a superfície, ameaçando toda a cidade de Hawkins.

Crítica

Não deve ser mistério para alguém. O primeiro ano de Stranger Things era muito mais um longa-metragem de aproximadamente sete horas de duração, dividido em oito partes, do que uma temporada de série usual. Portanto, não soa estranho que os irmãos Duffer pensem no segundo ano como uma continuação cinematográfica propriamente dita. Tanto que, na abertura e no material de divulgação, Stranger Things 2 foi utilizado, deixando clara a vontade dos Duffer de mostrar que as regras das sequências serão seguidas. Mais perigos, mais personagens, mais nostalgia. Com nove episódios, a segunda temporada da série da Netflix conseguiu superar a original, mesmo sendo mais frágil narrativamente em dados momentos.

Nessa continuação, retornamos à Hawkins e reencontramos os amigos Lucas (Caleb McLaughlin), Dustin (Gaten Matarazzo), Mike (Finn Wolfhard) e Will (Noah Schnapp) tentando viver suas vidas da forma mais normal possível após os acontecimentos do ano anterior. A ausência de Eleven (Millie Bobby Brown) na vida de Mike ainda afeta bastante o garoto, enquanto Will parece ter uma ligação ainda muito forte com o mundo invertido. Dustin e Lucas se encantam por Max (Sadie Sink), a nova menina da escola, que tem um meio-irmão violento, chamado Billy (Dacre Montgomery). No lado dos adolescentes, Steve (Joe Keery) e Nancy (Nathalia Dyer) passam por maus bocados em seu relacionamento, com a garota ainda sentindo a morte de sua amiga Barb. O ombro amigo de Jonathan (Charlie Heaton) a ajudará nesse momento. No núcleo adulto, Joyce (Winona Ryder) encontrou um novo amor, o nerd Bob Newby (Sean Astin), enquanto o xerife Hopper (David Harbour) serve de pai adotivo para Eleven – sim, a menina sobreviveu ao confronto final da temporada anterior e se manteve segura junto ao homem da lei. Todos buscam uma vida normal após as ocorrências fantásticas do passado, mas uma ameaça gigantesca, na forma de um monstro tentacular, não os deixará em paz.

O episódio de estreia, Mad Max, faz exatamente o que o primeiro ato de uma continuação costuma fazer: reapresentar personagens, nos colocando em contato com suas jornadas; introduzir novos rostos, que nos acompanharão no restante da história; e dar o pontapé inicial para o próximo mistério. A decisão de fazer com que se passasse um ano desde a última vez em que vimos as crianças é tão sábia como necessária. O elenco cresceu bastante e não seria possível fazer uma continuação direta. Os irmãos Duffer são inteligentes em fazer com que essa passagem de tempo seja trabalhada dentro da história. Após um ano daquele inferno, seria possível voltar totalmente ao normal? Joyce parece estar, pouco a pouco, voltando ao seu velho ser. Ela está mais cuidadosa com Will, mais protetora. Mas seus jeitos maniáticos diminuíram consideravelmente. Winona Ryder está encontrando sua personagem em um ponto mais tranquilo, algo que não a vimos na temporada anterior. A presença de Sean Astin como o novo namorado parece apenas um obstáculo para que ela não engatasse um relacionamento com Hopper. Ele demora a provar seu valor, mas tem um arco interessante no fim das contas.

Nathalia Dyer e Joe Keery (agora alçado ao elenco principal) retornam em grande forma nesta sequência. Os dois seguem como um casal, mas as marcas do passado não estão totalmente apagadas. A cena na casa de Barb é uma das melhores para exemplificar esse momento estranho na vida de Nancy. Ela sabe que a amiga não voltará, que ela está morta numa dimensão paralela. No entanto, a garota não pode contar isso para os pais de Barb, que se apegam a uma esperança vã de encontrar a filha. Esse peso na consciência de Nancy acaba por ser um combustível interessante para a trama e Dyer evoluiu muito nesse período. Keery cada vez mais se afasta do clichê do adolescente marrento e isso é uma excelente notícia. O ator virou um dos destaques da série pelo pareamento curioso que os realizadores da série bolaram para ele, servindo como um irmão mais velho para os garotos – em especial, para Dustin.

Por falar no menino, no núcleo infantil, é divertido retornar e ver que os atores continuam tão carismáticos quanto anteriormente. Gaten Matarazzo está radiante e seu personagem, Dustin, está curtindo muito os seus recém-nascidos dentes da frente. Lucas continua energético, sempre um pouco mais maduro que os demais. E Mike surge um menino problemático, que não conseguiu completamente superar a perda de Eleven. As cenas que os três dividem, agora junto de Will, são as que mais divertem. Não à toa, as crianças são as verdadeiras estrelas da série.

E Eleven? É emocionante acompanhar sua trajetória e observar que a menina enxerga em Hopper uma figura paterna. Embora não seja a relação mais ideal, visto que se encontra em cárcere privado, é ao menos uma forma dela contar com alguém que não quer usá-la para fins próprios. Hopper, por sua vez, ganha sua segunda chance. Depois de perder a filha para uma doença, Eleven surge como alguém que requer cuidados ainda mais especiais. Infelizmente, o trabalho do xerife não tem deixado com que ele se dedique tanto quanto gostaria à menina. Com um vocabulário mais articulado, mas ainda com dúvidas sobre o mundo, a personagem de Millie Bobby Brown é novamente um dos destaques. E David Harbour não fica atrás, dando muito coração à sua performance.

Os irmãos Duffer deram uma diminuída nas referências diretas aos filmes da época, embora apareçam aqui e ali algumas citações a Contatos Imediatos do Terceiro Grau (1977), Poltergeist: O Fenômeno (1982), Aliens: O Resgate (1986), Os Caça-Fantasmas (1984) entre outros. Muito mais do que se encostar nos clássicos do passado, os criadores da série agora podem gerar um universo bem próprio, dado o sucesso da primeira temporada.

Embora tenham perdido um pouco a mão ao incluírem um episódio desnecessário (o tão falado sétimo capítulo, que retira a ação de Hawkins e deixa toda a trama em suspenso), os irmãos Duffer mais acertaram do que erraram neste segundo ano. Um dos maiores acertos é a evolução dos personagens e a solução de mistérios. Temos várias respostas para perguntas da primeira temporada, mostrando que os criadores de Stranger Things não cometerão os mesmos erros de outros shows de suspense. Com um final redondo, com um gancho bem aberto para o próximo ano, os irmãos Duffer provaram que o sucesso da primeira temporada não foi sorte de principiante. Os criadores da série sabem o que estão fazendo e se cercaram de pessoas competentes para repetir e suplantar a mágica. Embora tenham demorado um pouco para dizer a que vieram, todas as inclusões do elenco funcionaram muito bem e os rostos conhecidos não deixaram a dinâmica cair. Mal dá para esperar o que os Duffer planejam para o próximo ano. O caminho está bem aberto, visto que os ganchos não os deixaram presos. Já na expectativa pelo ano 3.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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