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Sinopse

Uma manifestação pacífica de estudantes contra atitudes do governo ucraniano se tornou um cenário de horror. Durante 93 dias a luta por direitos civis no país foi coibida de maneira covarde e brutal pela polícia.

Crítica

Um grupo de pessoas, a maioria estudantes, ocupou em outubro de 2013 a Praça Maidan, localizada no coração de Kiev, capital ucraniana, como forma de demonstrar repúdio pela decisão do então presidente, Viktor F. Yanukovich, de não avançar com as tratativas para a inclusão do país na União Europeia. Tudo começou com uma convocatória nas redes sociais, que resultou na presença expressiva de gente disposta a permanecer acampada enquanto as reivindicações não fossem ao menos ouvidas. As coisas tomaram proporções surpreendentes nos 93 dias em que duraram os protestos, sobremaneira após a intervenção da Berkut, a polícia de choque local, responsável por uma onda de violência, sangue e mortes. Winter on Fire: Ukraine’s Fight for Freedom documenta esses dias de tensão, exaltando a importância das manifestações, mas, sobretudo, a tenacidade do povo que fez valer sua voz depois de muitos traumas, feridos e mortos, naquilo que, por vezes, assumiu contornos de batalha campal.

Anti-government protests in Kiev

O diretor Evgeny Afineevsky alterna depoimentos posteriores, que dão conta das situações com certo distanciamento temporal, e testemunhos colhidos na urgência dos fatos, nas diversas frentes organizadas para manter os protestos em pé. Isso confere dinamismo e amplitude à narrativa que, assim, é construída como um mosaico de pontos de vista – também no que diz respeito à imagem, já que foram utilizadas mais de 20 fontes -, subjetividades essas encadeadas pelo olhar do diretor, inequivocamente orientadas por suas inclinações ideológicas. O componente emocional é muito forte, ainda mais quando são mostrados os protestos, em princípio pacíficos, tornando-se violentos em virtude dos recorrentes confrontos com a Berkut, cujos métodos são expostos na tela com evidente revolta. Vemos seguidamente atos covardes, como o espancamento de ativistas caídos no chão. Até oito policiais agridem gente tombada, já vítima de ferimentos, alguns graves, deflagrando, assim, a perversidade, tanto a literal do humano quanto a metafórica do Estado.

As pessoas relembram, com um misto de pesar e orgulho, os sacrifícios feitos para libertar a Ucrânia de um ditador disfarçado de presidente democrático. Afineevsky faz questão de ressaltar o clima de unidade que pautou as manifestações. Representantes de diversas religiões comentam, por exemplo, não só a própria adesão ao movimento, mas também o respeito vigente às demais crenças. De maneira análoga, as diferenças políticas foram minimizadas, já que até mesmo o representante maior do partido de oposição se viu pressionado para não ceder às chantagens oficiais, às artimanhas de um governo capaz de, em meio aos atos, instituir uma lei que praticamente criminalizou a luta pública por melhorias. Os policiais são apresentados como autômatos investidos de autorização para usar força bruta. Todavia, vez ou outra, a câmera se detém brevemente num olhar confuso que escapa por debaixo da balaclava e dos capacetes que deveriam sustentar ordens sem receios.

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Winter on Fire: Ukraine’s Fight for Freedom cresce dramaticamente na medida em que o diretor sublinha a brutalidade dos soldados. Eles passam das bombas de efeito moral, com fins de dispersão, ao uso de munição de verdade, com a qual vitimaram fatalmente, segundo dados oficiais, cerca de 130 pessoas, isso se contar o contingente de feridos e desaparecidos. Evgeny Afineevsky celebra a tenacidade do povo ucraniano, vitorioso contra um presidente que havia tentado anteriormente ascender ao posto mais alto do executivo por meio de um golpe eleitoral. É uma afirmação do poder das utopias, mas, principalmente, a constatação de que existe uma força nem sempre valorizada, surgida da união, algo certamente incapaz de parar balas e outros artefatos bélicos, mas imprescindível para pressionar os representantes eleitos a colocarem a coletividade acima de anseios particulares, a pensarem no povo como uma extensão de si, não penhorando seu futuro em troca de benefícios a um seleto bando de canalhas

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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