Crítica


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Sinopse

No mundo da arte contemporânea de Los Angeles, artistas de elite e grandes colecionadores pagam um preço alto quando o artístico e o comercial colidem.

Crítica

Há uma tese bastante frágil na base de Velvet Buzzsaw. Sobre ela, o longa-metragem constrói paulatina e tropegamente as suas fundações quebradiças. Antes, um preâmbulo cuja função é apresentar a fauna específica que transita nas vernissages, exposições, em suma, nos chamados grandes circuitos artísticos. Nele, conhecemos Morf (Jake Gyllenhaal), crítico de arte tipificado, de modos afetados que apontam à filiação a clichês tão surrados quanto ineficientes, pois nutrientes de estereótipos. Isso é espelhado na observação das demais figuras, todas evidentemente exageradas e encaixadas invariavelmente nos arquétipos desse habitat em torno do qual gravitam ideais de poder e elitismo. O desinteresse do protagonista por seu atual namorado e a concomitante paixonite pela amiga Josephina (Zawe Ashton) não é mais que uma bomba de fumaça insossa e dispensável. O máximo que essa dinâmica gera são certos momentos de revelação do âmago mesquinho de personagens que utilizam as posições conquistadas para promover pequenas vinganças pessoais e contentas.

Velvet Buzzsaw, aos poucos, vai desvelando seu um tanto ingênuo conceito fundamental, especialmente pelo desenvolvimento floreado de algo tão simples (imediatamente nas raias do simplório) e rudimentar. O contato com a obra de um autor até então desconhecido, que causa verdadeiro frisson entre os profissionais envolvidos em galerias, museus e afins, traz consigo um efeito colateral danoso, de proporções gradativamente trágicas. O que ali se insinua é confirmado adiante. O longa-metragem do cineasta Dan Gilroy é uma crítica franzina à monetização dos objetos artísticos, uma reprimenda pretensamente feroz, principalmente direcionada àqueles que parcamente se preocupam com beleza, lirismo e/ou transcendência, pois interessados tão e somente nos mecanismos que permitem valorização. Essa traição da função elementar da arte é castigada por meio de uma série de atentados contra os personagens que, de alguma maneira, se beneficiam de um mercado altamente lucrativo e escuso. Além dos pilares tênues, prevalece a falta de coragem, ou indecisão, quanto ao horror.

Embora Velvet Buzzsaw rapidamente deflagre a presença literal de uma força destrutiva emanando dos quadros do pintor da vez, o realizador demonstra-se claudicante diante da necessidade de assumir a sua produção como um filme de gênero, hesitando demasiadamente sempre que parece estabelecer uma ordem terrífica para mediar a tal vendeta da arte contra os mercadores que a subvertem fazendo dinheiro. Somada a essa incerteza, uma sucessão de subtramas desinteressantes, um par delas envolvendo a vida pessoal do protagonista, causam uma dispersão altamente contraproducente. As pessoas perdem substância no decurso da trama, sendo reduzidas a modelos exterminados consecutivamente, num processo moroso e previsível, uma vez identificado o caminho pelo qual acontece a desforra com traços místicos e de idealismo. Tudo se esvai a conta-gotas, permanecendo num terreno sem personalidade, com mortes aos borbotões e sem impacto.

Um exemplo da debilidade de Velvet Buzzsaw, sobretudo no que tange à essência da gente envolvida nesse meio escuso e reprovável, é Rhodora Haze (Rene Russo), a galerista pragmática, um exemplo a ser seguido na concorrida área, mas que no passado era descontente com a ordem vigente, uma agente contrária ao sistema que, então, foi devidamente cooptada por seus encantos e cifras. O mesmo pode ser dito de Josephina, alpinista social com arroubos de paixão, ou seja, supostamente merecedora do que “a arte” lhe impinge em dado momento do filme. Para completar o pacote, Gretchen (Toni Collette), funcionária de museu, mas seduzida pelas possibilidades financeiras que a circundam, e Damrish (Daveed Diggs), o independente, parte de um coletivo logo corrompido igualmente pelo canto da sereia. São todos vultos rasos e sem complexidade, que estão ali apenas para perecer diante da nobreza daquilo que apodrecem com seus comportamentos. É uma pegada bem tola e utopista, especialmente para quem antes realizou o ótimo e cético O Abutre (2015).

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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