Crítica
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Sinopse
São Paulo, meados da década de 1980. Agostinho, um decadente professor de física de um supletivo noturno, acaba se apaixonando por uma de suas alunas. Márcia, além de ser emocionalmente perturbada, é também soropositiva. Eles começam um relacionamento, e Agostinho decide arriscar seu casamento com Januária.
Crítica
Os personagens de Uma Noite Não é Nada têm nomes inspirados na nomenclatura dos meses. A partir disso, é possível pressupor que o tempo seria algo essencial para definir trajetórias, reveses e eventos cruciais da trama. Todavia, não é exatamente o que acontece, pois a cronologia desempenha um papel meramente funcional no novo filme de Alain Fresnot, pontuando, no mais das vezes, parcamente o crepúsculo. O decurso serve tão e somente para agravar condições de saúde inevitavelmente atreladas à proximidade da finitude e nada mais. O protagonista é Agostinho (Paulo Betti), professor de física num supletivo noturno, sujeito de fala demarcada por uma cadência bem particular. As pausas denotam certo embotamento sufocante. A fotografia esmaecida a cargo de Pedro Farkas estabelece a possibilidade de uma comunicação com o irreal, talvez um acesso facilitado à esfera do subjetivo, mas tampouco isso é bem aproveitado pela direção que frequentemente deixa o conjunto a mercê de um artificialismo contraproducente, o que dificulta o nosso pleno engajamento.
Uma Noite Não é Nada se fundamenta no envolvimento entre Agostinho e sua aluna Márcia (Luiza Braga), jovem imprevisível, ou seja, profundamente discrepante da monotonia que marca a vida do professor. Ela pede carona, ele prontamente concede. Ela se masturba em sala de aula, no fundo, furtivamente durante a lição. Ele consente com um olhar desejoso. Ambos se envolvem, mas com expectativas distintas. A jovem talvez para testar sua influência sobre aquele que, em virtude da posição de mentor, representa autoridade. O homem maduro facilmente engendrado pelos olhares maliciosos e os trejeitos sensuais da pupila. Alain Fresnot desenha esse jogo de sedução de forma simplória, inclinado a observar tudo prioritariamente da perspectiva masculina, sem, contudo, substanciar, sequer, motivações, ações e reações. A confusão entre introspecção e apatia cria um terreno metaforicamente parecido com a fotografia, ou seja, sem cor, vivacidade e pathos.
Ambientado em 1985, o filme trisca no leviano ao mostrar esse relacionamento secreto. A inabilidade da encenação está presente em cenas como a dos amantes se beijando, sem mais aquela, ao lado do carro, enquanto os alunos debandam da instituição. Não existe uma sensação de perigo iminente, algo intrínseco a, primeiro, um envolvimento extraconjugal e, segundo, às particularidades desse vínculo. Falta peso dramático a Uma Noite Não é Nada. Os acontecimentos se sucedem e deixam poucas marcas por conta da falta de densidade e tônus, isso ampliado pelas conveniências acumuladas, tais como a chegada de alguém sempre que personagens precisam entrar nos recintos aos quais não têm acesso. Determinados comportamentos, especialmente os de Agostino, passam longe de uma análise acurada, sendo apresentados com o misto de aquiescência diretiva e naturalização de violências contumazes. O homem com o bacalhau nas costas (do rótulo da Emulsão Scott) e o carrinho descendo as “escadarias de Odessa” são ruídos oníricos gratuitos.
Agostino, a certa altura, segue agarrando Marcia mesmo após os apelos para a interrupção do contato íntimo que flerta com a brutalidade. O embate descamba para a agressão física. Ela sorri depois de tudo, como se gostasse daquele tipo de hostilidade mediando seus elos afetivos. De forma semelhante, a menina não demonstra espanto ou reprovação ao ver o amante entrar no seu apartamento, cujo endereço não foi compartilhado. Mas a culminância dessa visão enviesada, cujo dado pernicioso diz respeito ao reforço de estereótipos perigosos, é a violação literal do corpo feminino vulnerável pelos efeitos de drogas injetáveis. O homem acredita que possui direitos para tal. O abraço subsequente, o acolhimento da moça indefesa que acabara de ser estuprada, não passa de uma forma torpe de aprovar aquilo que se faz “por amor”. Januária (Claudia Mello) é restrita a ser a esposa devotada, sem, ao menos, ter espaço, para além da função assistencialista, quando se descobre traída. Um filme bem condescendente com o olhar e o modus masculino.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 3 |
Edu Fernandes | 4 |
Francisco Carbone | 2 |
MÉDIA | 3 |
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