Um Conto do Destino

12 ANOS 118 minutos
Direção:
Título original: Winter's Tale
Gênero: Drama, Fantasia, Mistério
Ano:
País de origem: EUA

Crítica

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Sinopse

Durante um inverno rigoroso, Peter Lake, um mecânico irlandês, decide roubar uma imensa mansão. Ele tem certeza que a casa está vazia, mas acaba encontrando uma garota no interior. Quando descobre que ela está prestes a morrer, nasce uma história de amor entre os dois.

Crítica

São tantos os problemas de Um Conto do Destino que é até complicado saber ao certo por onde começar. Se o tom adotado pelo diretor de primeira viagem Akiva Goldsman – vencedor do Oscar pelo roteiro de Uma Mente Brilhante (2001) – para narrar essa trama fantástica é ingênuo e antiquado, em nada colabora o fato do filme ter chegado aos cinemas quase dois meses após o Natal (época naturalmente mais propícia para enredos mais melodramáticos e emocionais) e no final da estação – afinal, a tradução direta do título seria ‘Um Conto de Inverno”. Soma-se a isso interpretações canhestras do elenco principal – Russell Crowe, particularmente, está constrangedor – e efeitos especiais quase amadores e temos o início da explicação do porquê do seu gigantesco fracasso nas bilheterias – com um custo de US$ 60 milhões, arrecadou pouco mais do que um décimo desse valor no seu final de semana de estreia!

A tagline do filme vendida no pôster é “esta não é uma história real, e sim um amor real”. É curioso verem se apropriar com tamanho entusiasmo de uma expressão que indique realidade quando nada – absolutamente nada – é verossímil em Um Conto do Destino. E, por outro lado, há muito pouco amor também – ao menos não no sentido romântico, pois esse é logo descartado e substituído por outro mais atemporal, humanístico por assim dizer. A questão em debate aqui é a luta do Mal contra o Bem, que se estabelece a partir do momento em que percebe-se que um milagre está prestes a acontecer e um emissário de Lúcifer deverá fazer tudo ao seu alcance para impedi-lo, enquanto um Juiz não muito parcial deve se esforçar para manter o rumo dos acontecimentos nos seus devidos lugares.

Colin Farrell – sempre esforçado, porém deixando cada vez mais evidente sua inabilidade em escolher projetos relevantes – é o filho de imigrantes irlandeses abandonado pelos pais em Nova York, ainda bebê, quando estes são mandados de volta para a Europa vítimas de tuberculose. Criado por si só, é ajudado por algumas almas boas até ser acolhido por Soames (Crowe), o emissário do Diabo. Quando este percebe que o jovem está inclinado para o bem, apesar de todos os seus esforços, decide mandar matá-lo, o que só não será possível graças a um cavalo branco com poderes mágicos (sim, acredite!). Em sua fuga, ele conhece – e se apaixona por – Beverly Penn (Jessica Brown Findlay, do seriado Downton Abbey, 2010), uma jovem à beira da morte. A relação dos dois, no entanto, terá repercussões mais de cem anos depois, já na Nova York atual, quando Peter Lake (Farrell) seguirá perambulando até conseguir realizar o que lhe está destinado – e, para tanto, contará com a ajuda da jovem mãe e jornalista interpretada por Jennifer Connelly.

Akiva Goldsman, ao decidir adaptar o romance homônimo de Mark Helprin, esqueceu que o sucesso literário não é garantia de que o mesmo efeito se repetirá nas telas. Nem contando com a ajuda de amigos como Crowe e Connelly (protagonistas do citado Uma Mente Brilhante) ou Will Smith (estrela de Eu, Robô, 2004, e Eu Sou a Lenda, 2007, ambos textos de Goldsman, e de Hancock, 2008, produzido pelo diretor) – em presença mínima e quase inexplicável, pois mais distrai do que colabora – o cineasta consegue prender a atenção do público. Muito disso se deve ao fato dos personagens serem estereotipados – ou é muito ruim, ou muito mau, sem meios-termos – e a trama, previsível e problemática, repleta de desvios sem sentido e soluções que não impulsionam seu desenvolvimento. A decisão de ambientar a história em dois espaços de tempo distintos também contribui na sua já complicada percepção.

Mas nem tudo está errado em Um Conto do Destino, e há um único momento de real emoção quando a veterana Eva Marie Saint – vencedora do Oscar por Sindicato de Ladrões (1954) – entra em cena. Mesmo em uma participação sem muito sentido – que idade a personagem tem? 110? – e de pouco significado, ela consegue injetar um sentimento contagiante, que faz o espectador perdoar – ainda que por poucos instantes – toda a bobagem melosa explorada até aquele ponto. Sua aparição, no entanto, é um alívio tão impressionante que, em sentido contrário, só reforça o imenso desperdício em que consiste esta obra como um todo. É o típico filme que, em última análise, se fosse uma produção nacional, apenas atrairia um público em busca de mensagens religiosas espíritas ou evangélicas. Como tem um elenco hollywoodiano e grande orçamento, até tenta disfarçar essa intenção. Mas nem toda tentativa é válida.

Robledo Milani

é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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