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Sinopse

O cineasta Jafar Panahi dirige um táxi amarelo pelas ruas de Teerã, entrevistando passageiros sobre platitudes, mas também acerca da constituição social do país e da situação política do mesmo.

Crítica

Jafar Panahi conseguiu em Táxi Teerã um momento digno de entrar na memória do cinema. Assim como Ettore Scola representou meia década da França no salão de O Baile (1983), o diretor iraniano levou para dentro de um táxi todo um país permeado pelas inúmeras contradições do regime no Irã.

O filme abre com um plano estático, no qual a câmera, colocada junto ao vidro dianteiro do carro, traz para a tela a riqueza e o caótico das buzinas, pessoas, carros e sinais de trânsito. Logo percebemos se tratar de um filme de Panahi, em que a observação é prioridade frente à ação. Seguimos acompanhando a rua até que três passageiros aleatórios embarcam no taxi (compartilhar o carro parece ser uma realidade banal no país) e a câmera volta-se para dentro do veículo. Em pouco tempo, dois dos passageiros, que descobriremos se tratar de uma professora e um ladrão, começam a divergir sobre a pena de morte e a lei Sharia. Quando os dois descem do carro, o terceiro homem reconhece o motorista, até então oculto.

Diretor e aqui também ator, Jafar Panahi conduz o táxi pelas ruas de Teerã com a naturalidade de quem sabe que o que precisa ser feito para compreender o seu país é observá-lo de perto. Sem julgar ou confrontar nenhum dos passageiros, Panahi contempla a diversidade ao circular levando os mais diversos tipos, do ladrão ao vendedor de filmes proibidos, da sobrinha jovem que precisa filmar seguindo as “recomendações" do Islã às mulheres que correm contra o tempo para não contrariar a vontade divina e entregar dois peixes antes do meio-dia.

Impressiona como o diretor domina o fluxo narrativo, apesar do controle apenas parcial das situações. Um carro com poucos lugares transforma-se no palco que permite ao absurdo das situações resultar em um misto de lástima e humor, como no caso da mulher que insiste para obter a cópia do testamento do marido atropelado por uma bicicleta. A combinação não diminui a qualidade com que Panahi nos transmite os paradoxos da sociedade iraniana.

O poder da imagem é outro tema caro a Panahi. Presente do testamento registrado em vídeo à gravação da sobrinha para um trabalho de escola, a força das imagens portáteis, das câmeras não oficiais, é reverenciada por um diretor que aprendeu a usá-la do pior modo possível – à força. Os celulares, as câmeras que cabem no carro ou nos bolsos, revolucionaram a comunicação, tanto por permitir o irrestrita liberdade de expressão, quanto por denúncia a censura a ela.

Em determinado momento de Táxi Teerã, o passageiro é um jovem aspirante a cineasta que, ao reconhecer o seu motorista, prontamente pede-lhe dicas para criar seus próprios filmes. A cena existe para dar conta de uma das várias situações do longa, mas é simplesmente impossível não remeter ao início da carreira de Panahi. Ao olhar para trás, enxergamos a estética de O Balão Branco (1995), delicada e simbólica como os contos persas, acabar transformada no gradual questionamento político de O Círculo (2000), Ouro Carmin (2003) e Fora de Jogo (2006). Os tempos sombrios chegariam em seguida. A posição do diretor, favorável à democracia, resultaria em perseguição por parte do regime iraniano, nas restrições aos seus filmes e, por fim, na sua própria prisão. Foi a adversidade quem produziu o fênix Isto não é um filme (2011) e o claustrofóbico Cortinas Fechadas (2013), retrato de um espírito incomodado. Por isso, ver Panahi dar conselhos ao jovem é algo quase tão importante quanto vê-lo à luz do dia nas ruas de Teerã – quase.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Tem formação em Filosofia e em Letras, estudou cinema na Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Acumulou experiências ao trabalhar como produtor, roteirista e assistente de direção de curtas-metragens.
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