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Sinopse

Melanie conhece Mitch numa pet shop e se interessa. Ela o procura em Bodega Bay, Califórnia, cidade litorânea que começa a ser acossada por ataques brutais de pássaros que transformam o oásis num cenário de horror.

Crítica

Talvez seja tentadora demais, pois evidente, a leitura psicológica de Os Pássaros, um dos filmes emblemáticos de Alfred Hitchcock, modelo no que diz respeito à construção da atmosfera de suspense e, muitas vezes, de terror. A verdadeira guerra empreendida pelos pássaros que tomam de assalto a pequena Bodega Bay, cidade próxima à São Francisco, pode ser facilmente lida como uma espécie de projeção material do ciúme de Lydia Brenner (Jessica Tandy), mãe que vê a linda e afamada Melanie Daniels (Tippi Hedren) como ameaça, já que ela anda às voltas com seu filho Mitch Brenner (Rod Taylor). Aliás, o ângulo de percepção é oferecido quase de bandeja pelo próprio Hitchcock, numa determinada conversa entre Melanie e a antiga pretendente de Micth.

Contudo, são vários os elementos que, encadeados com precisão, conferem complexidade ao filme. Exemplo é o contraste marcado entre metrópole e interior, artifício aqui longe de ser banal, já que expõe no idílio costeiro uma dinâmica de relacionamentos regida por códigos morais um tanto retrógrados. Há, ainda, a criação da tensão sexual entre os protagonistas, de início numa loja de pássaros (em cena de igual teor de sutileza e eficiência) e gradual ao longo da narrativa, a posterior chegada de Melanie a Bodega Bay, o primeiro e aparentemente aleatório ataque de uma gaivota, a constatação de que fisicamente mãe e pretendente se parecem (mais psicologia na veia), entre outros. Tudo converge ao caos que logo se instalará.

Claro que a decorrência de mais de 50 anos faz com que os efeitos especiais soem datados. Entretanto, ater-se em demasia às “rugas” do longa pode provocar um desvio capital entre o espectador e o suspense. Para relativizar a importância de tais marcas do tempo, basta perceber que a força do filme se dá no engenho narrativo. Cada revoar de um pássaro ganha em significância para além da imagem “presente”, isso por que somos levados desde o início, e aos poucos, a perceber todo movimento aéreo como suspeito e até mesmo mortal. A cena na qual os corvos vão se reunindo, um a um, pousados no brinquedo no pátio da escola local, é prova disso. Em princípio nada demais, ainda que com aquele exagerado ajuntamento, mas de fato sentimos o temor latente, silencioso, uma vez que entendemos de antemão o perigo da espreita.

Outro fator a se ressaltar em Os Pássaros é a criação sonora, sobretudo no que diz respeito aos trinados das aves em ataque – mescla de arranjos orgânicos e experimentações eletrônicas –, componente responsável por amplificar ainda mais o que está sendo transmitido no plano das imagens. Aliás, em Os Pássaros sons e imagens não duelam por atenção, se complementam, cada qual em sua função de provocar as reações que o manipulador (no bom sentido da palavra) Hitchcock quer que tenhamos enquanto espectadores de sua criação. Uma refilmagem – como há algum tempo se anuncia – só atualizaria o que o filme tem de ordinário, ou seja, os pássaros em si, certamente muito mais verossímeis com os recursos tecnológicos de hoje, mas possivelmente nem por isso aterrorizantes em semelhante medida. Afinal, técnica sem recheio é só técnica.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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