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Sinopse

Bill Munny, um pistoleiro aposentado, volta ativa quando lhe oferecem 1000 dólares para matar os homens que cortaram o rosto de uma prostituta. Neste serviço dois outros pistoleiros o acompanham e eles precisam se confrontar com um inglês, que também deseja a recompensa e um xerife, que não deseja tumulto em sua cidade.

Crítica

Os Imperdoáveis foi realizado como a grande despedida de Clint Eastwood à frente das câmeras. Envolvido cada vez mais com seu trabalho como diretor, o astro escolhera esta trama, mostrando o lado nada glorioso do Velho Oeste, para aposentar sua carreira de ator de uma vez por todas, no gênero que lhe rendeu seus maiores sucessos. Hoje sabemos que, felizmente, veríamos o ator em (muitos) outros trabalhos. Mesmo assim, é fácil entender o porquê dele ter tentado aposentar o chapéu com esse filme. Além de viver um grande personagem, o longa possui diversos temas trabalhados em faroestes do passado, mas colocados na tela de forma crua, destituindo do gênero o heroísmo de outrora. Um trabalho sério, muitíssimo bem construído. Um verdadeiro crepúsculo para os cowboys do passado.

Com roteiro de David Webb Peoples (Blade Runner, 1982), Os Imperdoáveis traz Clint Eastwood como o assassino aposentado William Munny. Em sua juventude, o pistoleiro era conhecido pelo sangue frio e por sua crueldade. Hoje, viúvo e pai de dois filhos, Munny não parece ser a sombra daquela figura do passado. Sua falecida esposa conseguiu consertá-lo, como sempre conta, o livrando da bebida e endireitando seu caminho. Com a perda da mulher e com sua criação de porcos indo de mal a pior, o agora fazendeiro não consegue resistir ao chamado de uma grande quantia em dinheiro. O jovem pistoleiro Schofield Kid (Jaimz Woolvett) oferece metade de uma recompensa de mil dólares caso Munny o ajude a matar dois cowboys que retalharam uma prostituta no vilarejo de Big Whisky. Munny declina da oferta de início, mas decide aceitar a parceria – não sem antes convidar seu antigo colega, o bom de mira Ned Logan (Morgan Freeman). O que o trio não sabe é que a recompensa anunciada pelas prostitutas despertou a atenção do xerife da cidade, Little Bill (Gene Hackman), que não permitirá assassinos em sua Big Whisky. Exemplo disso é o tratamento dispensado ao pistoleiro English Bob (Richard Harris), que aparece no vilarejo atrás da recompensa e recebe uma lição dolorida do xerife. Agora, Munny, Logan e Kid estão em rota de colisão com Little Bill – e o confronto pode despertar o lado mais feio dos velhos assassinos.

Belissimamente fotografado por Jack N. Green, Os Imperdoáveis é, em seu visual, um Faroeste com F maiúsculo. Mesmo desconstruindo diversos conceitos do western, Eastwood não esquece de colocar seus “heróis” cavalgando ao longe, com apenas suas silhuetas aparecendo. Essa é só uma de tantas cenas capturadas caprichosamente pelo diretor de fotografia do filme. Merecem elogios também a equipe de direção de arte, que constrói uma impecável cidade do Velho Oeste.

Vencedor de 4 Oscar, incluindo Melhor Filme e Diretor, Os Imperdoáveis acabou não levando uma estatueta totalmente merecida: Melhor Roteiro Original. O trabalho de David Webb Peoples é precioso no script deste desmistificado western. A forma como o roteirista constrói cada cena, cada personagem, meticulosamente encaixando toda a ação, é impressionante. O filme tem aquele tipo de roteiro que vai se revelando ao espectador aos poucos, mostrando a máxima hollywoodiana de que nenhuma cena está lá por acaso, mas sem martelar este fato de forma óbvia. Então, quando vemos Little Bill dizer o quanto é difícil mirar e atirar de forma eficiente em um momento de tensão, não nos parece um aviso do que está por vir. Parece apenas um velho xerife gabando-se na frente do interlocutor. No conflito final, descobrimos o quanto aquela cena era importante para o entendimento do impressionante número de mortos abatidos por apenas um pistoleiro.

Outro bom exemplo disso é a forma sistemática como William Munny tenta convencer a si mesmo e aos outros de que não é mais o mesmo homem de antigamente. O fato de ele não matar há onze anos e não colocar uma gota de álcool na boca por um bom tempo o deixam certo de que os tempos de loucura e assassínio terminaram. No entanto, basta uma reviravolta na história para que Munny se convença de que, no fim das contas, um homem é o que ele é. Ao receber uma notícia com pesar, o ato reflexo de Munny é tomar um gole de whisky e procurar vingança. Os ecos do homem do passado retornam a galope e o assassino aposentado recebe uma nova chance de sacar sua arma.

Essa mudança de William Munny é muito bem caracterizada por Clint Eastwood. O ator capricha na falta de jeito do personagem no início do filme. Observamos que sua pontaria não é mais a mesma, seu jeito com o cavalo, idem. Estas são algumas das desconstruções de Eastwood em Os Imperdoáveis. Seu protagonista está longe de ser a figura imponente do passado. Ele cai do cavalo regularmente, ele não acerta seus tiros, ele fica doente. Ou seja, não é mais aquele personagem intocável de antigamente.

Além desta decadência do homem do Velho Oeste, outro assunto em voga em Os Imperdoáveis é a violência. Sejam assassinos, sejam homens da lei, a violência sempre está presente naquele lugar. O xerife da cidade não tem dúvidas ao espancar qualquer homem que carregue uma arma para dentro de Big Whisky, utilizando-se da força para trazer a paz (uma linha de pensamento que vemos ainda hoje para tentar justificar guerras e invasões). O roteiro é hábil em evitar o maniqueísmo, deixando de fora a figura do mocinho e do bandido. Tanto o xerife quanto os assassinos – ou os cowboys que desfiguram a prostituta – tem seu lado bom e mau. As ações de cada um dentro da história é que os colocarão na situação que lhes cabe.

Com um time de atores veteranos capitaneados pelo próprio diretor, Os Imperdoáveis conta com atuações impecáveis. A cena final entre Munny e Little Bill certamente ficará para a história como um dos grandes duelos do western. Assim como o próprio filme, que ganhou um lugar especial em qualquer lista dos melhores longas-metragens – não só do gênero, como de todos os tempos. Indiscutivelmente um dos melhores filmes assinados por Clint Eastwood, Os Imperdoáveis é a despedida perfeita do ator/diretor do gênero que lhe deu uma carreira bem sucedida no cinema. Dedicado aos seus mestres Sergio Leone e Don Siegel, o filme é uma bela homenagem e uma prova concreta de que o cineasta aprendeu com os melhores.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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