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Sinopse

Os amigos Lynn, Jeff e Victor decidem fazer uma viagem de fim de semana para a floresta. Quando descobrem uma mala de dinheiro, precisam fugir de um criminoso desesperado para recuperar seus bens.

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Três amigos se encontram, após um tempo sem se verem, para praticarem rafting rio abaixo. Ao pararem quilômetros adiante, se deparam com um desconhecido. Trocam algumas palavras, e cada um segue seu caminho. O trio escolhe acampar por ali mesmo, mas logo se desentendem e a garota, ao se afastar, encontra 8 milhões de dólares em sacolas abandonadas. Separados, um dos rapazes reencontra o trilheiro, que ao ficar sabendo do dinheiro, passa a caçá-los, pois afirma que o montante é todo dele. Bom, não há muito mais além dessa resumida sinopse em O Preço da Ganância, filme de Lucky McKee (que antes dirigira o bem mais divertido Todas as Cheerleaders Devem Morrer, 2013) feito a partir do roteiro dos estreantes Jared Butler e Lars Norberg. Tudo nele é tão simples e direto que, desprovido de maiores ambições, até não chega a ser dos mais frustrantes, pois desde o princípio o espectador estará ciente que não há muito o que se esperar desse conjunto.

Diante de uma estrutura narrativa tão básica, é de se espantar a quantidade de drama que os responsáveis por essa história conseguiram inserir na trama, ao mesmo tempo em que demonstram preocupação próxima a zero para desenvolvê-las à contento. Pra começar, vamos nos direcionar ao suposto triângulo amoroso. Victor (Ellar Coltrane, bem distante dos tempos de Boyhood: Da Infância à Juventude, 2014) gosta de Lynn (Willa Fitzgerald, de O Pintassilgo, 2019, a mais careteira do trio), que já gostou dele também, mas agora está curtindo mais ficar com Jeff (Jacob Artist, de Pássaro Branco na Nevasca, 2014, o típico gostosão sem cérebro). Ela, no entanto, guarda suas próprias mágoas em relação aos dois, a ponto de fazer declarações do tipo: “éramos tão amigos quando crianças, mas daí eu cresci, ganhei peito e bunda, e vocês passaram a me ver apenas como um corpo a ser possuído”. E é contra essa objetificação pessoal que busca justificar os seus atos assim que acha a grana perdida, por mais aleatórios e incongruentes que eles possam parecer.

Enquanto Victor fica se fazendo de vítima, se recusando a interagir com os outros dois por perceber que não tem mais chances com a antiga paixão (então, por qual motivo decidiu passar o dia com eles?), Jeff é não mais do que o bobo alegre que concorda com tudo que lhe é proposto e parece acreditar ser possível viverem felizes para sempre, mesmo frente às mais variadas discussões. Os dois, no entanto, não passam de adereços ao lado da jovem que é o centro das atenções de ambos. Ela que despreza um e acolhe o outro, mas sempre na medida dos seus interesses. Quando de posse de uma fortuna inesperada, apenas um deles levanta a voz da razão – é óbvio que há um dono em busca do que foi extraviado, ou seja, se quiserem ficar com aquilo, estarão comprando uma confusão com a qual não terão como lidar. É quando entra em cena o personagem de John Cusack, que é o oposto de tudo visto até esse momento: ele é pura reação, um tipo linear e sem profundidade, que quer apenas recuperar o que acredita ser seu por direito. E não que deseje o mal de ninguém, apenas não hesitará em eliminar qualquer um que se coloque no seu caminho.

John Cusack já foi um dos grandes nomes de Hollywood, talvez não tão relevante quanto Nicolas Cage, mas, assim como o sobrinho de Francis Ford Coppola, também costumava levar multidões aos cinemas ao mesmo tempo em que era reconhecido por seu envolvimento com um cinema mais autoral e independente. Bom, essa relação entre os dois se faz importante, pois desde a virada da última década, ambos parecem ter perdido o rumo de suas carreiras. O último longa que Cusack estrelou como protagonista a ser lançado nos cinemas foi a superprodução 2012 (2009), e desde então já se passaram mais de dez anos. De lá pra cá, ocasionalmente se envolveu em projetos de prestígio, assinados por cineastas como David Cronenberg ou Spike Lee, mas a maioria dos seus trabalhos foram produções genéricas que acabaram passando longe da tela grande. Não causa espanto algum perceber que dois deles, aliás, contam também com a presença de Cage no elenco.

O Preço da Ganância, portanto, é apenas mais um desses casos, um título que só encontra ressonância por estar sendo lançado em VoD e streaming exatamente numa época que, com os cinemas fechados, o espectador se vê sem maiores opções. É o típico jogo do gato-e-rato, com a moça maquiavélica à frente do grupo em fuga e um maníaco assassino no seu encalço. As perseguições entre eles são pouco inspiradas – quando encontram túneis para se esconderem, ao invés de investir na claustrofobia e no aumento da angústia, tudo que o diretor consegue e tornar tudo ainda mais risível, pois aquele que deveria ter fobia de lugares assim acaba sendo o primeiro a ser eliminado. Redundante e nada original, é uma aventura passageira que em nenhum momento consegue se elevar além do descartável. Muito pelo contrário, vai fechando todas as portas que poderiam lhe oferecer algum respiro de criatividade, resignando-se com o mais batido e previsível. E assim, sem entregar nada além do prometido – e, na maioria das vezes, nem isso – se revela um exercício de desgaste, enfadonho e pouco inspirado.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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