Crítica


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Sinopse

Pavel volta à sua cidade natal para comparecer ao funeral da mãe. No entanto, logo as velhas rusgas com seu pai, Vasil, se tornam novamente evidentes. Mesmo assim, eles trilharão um caminho estranho em busca de respostas.

Crítica

O luto é um momento volátil, no qual nem sempre as emoções expressadas são as que revolvem as entranhas de quem fica. Antes que fechem o caixão da sua esposa de longa data, Vasil (Ivan Savov) é tomado de excitação. O desejo de fotografar a falecida até a tampa ser colocada no ataúde passa por um nervosismo que assume contornos inesperados. Pavel (Ivan Barnev), o filho, sente-se constrangido com o comportamento paterno, incomum àquela cerimônia solene. Adiante, ele se mostra intimidado diante do expansivo patriarca. “Você sabe que não consigo contraria-lo”, diz à esposa por telefone, com isso dando pistas do vínculo tensionado, prestes a sofrer uma mutação. O Pai é um filme afeito a sutilezas. As entrelinhas sempre têm mais a dizer do que palavras e demais manifestações explícitas. Os gestos são vitais à exposição das dificuldades.

Os cineastas Kristina Grozeva e Petar Valchanov optam pela rarefação. Ora pai e filho estão interagindo, ora têm breves distanciamentos que nos permitem acessá-los individualmente. Gradativamente, percebe-se que, a despeito das discrepâncias, eles agem de modos análogos, guardadas as devidas proporções. Vasil fica obcecado para descobrir o que a esposa queria dizer antes de morrer. Concomitantemente, Pavel tenta confortar o pai. É como se a dor por ter perdido recentemente a mãe lhe chamasse a atenção à necessidade de estimular um elo até ali interditado pela suposta incompatibilidade. O Pai passa do ponto no que tange às lacunas, não por lançar mão demasiadamente delas, mas por nem sempre oferecer estofo suficiente para preencher os espaços vazios. A equivalência entre os protagonistas é clara, às vezes beirando o esquematismo.

Há uma substituição gradual de diferenças por semelhanças. Já a geleia de marmelo com gerânios é um símbolo superficial. A iguaria motiva o comportamento excêntrico que quase encrenca Pavel, sujeito consumido, essencialmente, pela pretensa falta de bom senso de seu genitor enlutado. Uma vez respondida a questão aparentemente fundamental para que o enredo seja amarrado, o doce adquire outros papeis. No fim das contas, esse elemento é um macguffin, ou seja, simplesmente um dispositivo para fazer determinadas coisas acontecerem, como a imprudência do mais jovem e a porta de entrada à verdade para o idoso desnorteado. Apesar da breve duração, menos do que 90 minutos, O Pai se demora um bom tanto nas transições entre os indícios. Além disso, algumas questões não encontram respostas e tampouco sustentação.

Um desses apontamentos gratuitos é a decisão de Pavel de compensar os iminentes danos de uma mentira contando outra ainda mais cabeluda e passível de coloca-lo em maus lençóis. Dentro dessa perspectiva de costura dos atos do filho como reflexos diretos dos meneios paternos, e vice-versa, igualmente soa como desperdício o tempo investido nos telefonemas visando amenizar uma crise profissional. Mera adição de tensão. O Pai, então, é um filme com muito a dizer, e mais, que sabe a quais ferramentas recorrer para deixar seu andamento menos refém das obviedades e dos lugares-comuns. No entanto, Kristina Grozeva e Petar Valchanov permitem a criação de um vácuo improdutivo entre as situações principais, passando apressadamente por algumas delas, isso ao apresentarem dinâmicas óbvias, como a conjuntura que faz Pavel se aproximar de Vasil no plano conceitual. Que eles são farinha do mesmo saco a gente já entende lá pela metade, mas os realizadores insistem nisso, repetindo-se sem variações para deflagrar a afinidade insuspeita.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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