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Sinopse

Querendo ascender socialmente no Brasil dos anos 1960, Antonio resolve se mudar com a família para Brasília, a nova capital brasileira ainda em construção. Logo, se aproxima do ativismo político e da luta dos trabalhadores.

Crítica

Após Renato Aragão e Xuxa Meneghel terem deixado de lançar seus filmes – muitos alguns dos maiores sucessos de bilheteria da história recente do cinema nacional – a produção cinematográfica brasileira tem se ressentido de projetos voltados ao público infantil. Agora, se pensarmos em histórias sérias pensadas para este espectador ainda em formação, os casos serão ainda mais raros. Portanto, apenas por este caráter educativo e singular em nosso cenário o quase épico O Outro Lado do Paraíso já se justificaria. O diretor André Ristum, no entanto, não deveria ter se contentado apenas em assumir essa posição diferenciada. Talvez com um maior trabalho criativo e um viés mais instigante na condução de sua trama, tivéssemos, enfim, um longa que se tornasse referencial no gênero. No entanto, tudo que se consegue é um capítulo prolongado de uma novela televisiva – plasticamente impecável, porém carente de profundidade.

A estrutura é semelhante a de um conto de fadas - inclusive narrado por uma desnecessária locução em off. Garoto do interior tem em seu pai um herói, uma figura que beira a idolatria de um mito infalível. Sua missão é encontrar Evilath – lugar que, segundo a Bíblia, seria o paraíso na terra. O incansável sonhador acredita estar na direção certa ao ficar sabendo da construção de Brasília (estamos na metade do século XX), e para lá decide seguir, levando consigo a esposa e os três filhos. Um mundo novo se descortina aos olhos da família. Porém, uma vez instalados na cidade-satélite de Taguatinga, perceberão que o sonho dourado não brilha tanto como esperavam. Se deparam com um Brasília à beira de um golpe militar, com injustiças sociais gritantes, com desamparo, sem educação e falta de estrutura. Tudo isso, claro, amenizado até a medida certa para ser compreendido pelos olhos de uma criança.

O estreante Davi Galdeano, como o jovem Nando, é o verdadeiro protagonista, e muito se deve a este ponto de vista o caráter excessivamente didático assumido por O Outro Lado do Paraíso. O garoto é competente ao construir um tipo sensível, porém nunca frágil, com o qual nos identificamos e torcemos. O problema maior está, no entanto, no roteiro, que se exime em elaborar situações mais complexas, mantendo-se na superfície dos conflitos. Embates entre sindicalistas, militares e comunistas/socialistas até são percebidos, porém nunca discorridos com maior propriedade. Estão ali, mais como elementos do cenário do que como propulsores da história. Desempenhos corretos como o do sempre intenso Eduardo Moscovis e da revelação Camila Márdila (surpreendente em Que Horas Ela Volta?, 2014) chamam atenção, enquanto que os eficientes Flavio Bauraqui e Jonas Bloch pouco possuem a seu favor, servindo apenas como apoio de fundo.

A fotografia de Hélcio Nagamine e a trilha sonora de Patrick de Jongh – ambos parceiros do diretor também em Meu País (2011) – reforçam o caráter publicitário da produção, seja pelo tom asséptico que produzem ou pela presença constante, servindo apenas para reiterar os elementos já vistos na tela. O Outro Lado do Paraíso deve suas qualidades mais ao texto de Luiz Fernando Emediato (autor do livro em que o filme se baseia) e menos ao trabalho de Ristum, que constrói um longa fácil de se assistir e bonito de ver, porém insípido nas emoções que provoca. Não há problema algum em ser simples em sua concepção e almejar emoções mais básicas e imediatas, mas não se deve nunca confundir essas intenções em um resultado simplório e desprovido de características que resistam a uma análise mais detalhada. Afinal, o pior crime é justamente ser pertinente pelo tema que aborda, mas descartável pelo formato que entrega.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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