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Sinopse

Aos 40 anos, o professor François Foucault leciona no renomado liceu Henri IV, perto do Panthéon de Paris. Devido a uma série de eventos, ele é obrigado a aceitar a transferência de um ano para uma escola no subúrbio da cidade e teme que o pior possa acontecer.

Crítica

O Melhor Professor da Minha Vida é aquele tipo de título que, só de lê-lo, já se tem a ideia perfeita do filme inteiro. E no caso do longa escrito e dirigido por Olivier Ayache-Vidal, a percepção é correta. A fórmula do mestre que se vê diante de uma turma de alunos que o desconhece e aos poucos vai ganhando o seu respeito – e vice-e-versa – é seguida à risca, inclusive com mudanças de comportamento de última hora que até fazem sentido dentro de um contexto melodramático, mas que causam estranheza quando percebemos estarmos não apenas diante de uma produção francesa, mas uma estrelada pelo geralmente excelente Denis Podalydès, ator de prestígio e membro da tradicional Comédie-Française.

Há alguns anos, o cineasta Juan Jose Campanella, vencedor do Oscar por O Segredo dos seus Olhos (2009), ao ser homenageado no Festival de Gramado, foi questionado a respeito de qual era a chave do sucesso dos roteiros dos filmes argentinos, que geralmente acabam tendo ótima recepção por aqui. A resposta dele, no entanto, foi um balde de água fria – porém absolutamente sincera. Afirmou ele que na Argentina se fazem mais de 100 longas por ano – quantia similar à do Brasil – porém quantos destes estreiam por aqui? Dez, vinte, no máximo. Ou seja, os que viajam são os melhores, porém uma minoria, enquanto que os demais ainda encontram dificuldades para se comunicar com plateias mais amplas. Com a França, o caso parece ser similar. Até pouco tempo, o cinema francês tinha uma imagem única, como se fosse um estilo próprio: sisudo, intelectualizado, verborrágico. Porém, já faz alguns anos que a cinematografia deste país tem se firmado como a segunda estrangeira de maior presença por aqui, atrás apenas da norte-americana. Com tantos – e diversos – longas chegando a cada semana, a diversidade, consequentemente, aumenta. E abre-se espaço para casos como esse, bem-intencionados, mas não mais do que isso.

Podalydès (visto há pouco em Monsieur & Madame Adelman, 2017) é François Foucault, um professor de um dos mais respeitados colégios parisienses. Certo dia, em uma conversa aparentemente sem consequências – daquelas como todos nós temos a todo instante – ele admite que a situação das escolas das periferias é caótica em parte por causa dos professores, já que os mais conceituados que recusam a ir trabalhar longe dos grandes centros. O que não imaginava, no entanto, é que uma das suas interlocutoras era uma funcionária do Ministério da Educação, que não só gosta do que ouve como, acreditando ser uma vontade dele mudar esse cenário, o recomenda para uma experiência-teste, indicando-o para ser transferido para uma outra instituição de ensino, mais carente de regras rígidas e padrões elevados. Pode-se imaginar, é claro, o susto que ele leva quando percebe que aquilo que vislumbrava apenas em teoria estava, portanto, se tornando realidade.

O mesmo espanto terão os alunos ao conhecê-lo, em grande parte filhos de emigrantes, ou os colegas com quem passará a conviver, a maioria já cansada de uma batalha aparentemente fadada ao fracasso. Ao contrário de mostrá-lo revertendo as expectativas – ou, por outro lado, deixando-se contaminar pelo meio, em um estudo de caso poderia ser ainda mais interessante pela psicologia contrária – Ayache-Vidal prefere conformar-se com o óbvio, trilhando um caminho seguro. Escolhe-se, assim, um dos tantos novos estudantes a que ele passa a ensinar – obviamente, o mais inquieto e aparentemente enfrentando problemas mais graves em casa – para que esse elo entre mestre e pupilo se estabeleça. Há muito naquela classe para ser analisado – a postura feminina, a sexualização na adolescência ou o autoritarismo daquele em posição de poder são alguns exemplos – mas a trama restringe-se no esforço de um em mérito do outro. Aos demais, que se deem brioches.

É por isso que, ao invés de Les Grands Esprits – ou, numa tradução livre, Os Grandes Espíritos – o batismo nacional O Melhor Professor da Minha Vida acaba sendo mais apropriado. Afinal, mesmo que o ponto de vista seja o do educador, o centro do debate está na conduta de Seydou, o garoto interpretado pelo novato Abdoulaye Diallo. É mais ou menos aquela linha: “salve um que salvará todos”. Mas não precisava ser tão óbvio e didático. E se pensarmos que este é o mesmo país que já entregou filmes como Entre os Muros da Escola (2008), de temática similar e resultado muito superior, o que temos em cena é ainda mais incômodo – e menos inspirado. Com certeza deverá emocionar os mais sensíveis – e menos exigentes – mas é preciso ir além da superfície, pois se este é um filme acomodado com o pouco que alcança, é certo que este é um assunto que não pode ser discutido com tamanha leviandade.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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