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Sinopse

Dois soldados britânicos resolvem explorar os países vizinhos à Índia, país então sendo dominado pela coroa inglesa. Eles decidem ir ao inóspito Kafiristão, onde pretendem conquistar o sucesso e viver como reis.

Crítica

É preciso pouco para reconhecer um grande diretor. O talentoso não é aquele que realiza uma boa adaptação de Shakespeare, mas quem faz a mais simples história ser comparada às do bardo. No caso de O Homem que Queria ser Rei, projeto que levou muito tempo para sair do papel, John Huston se inspirou no mundo imaginativo e intrigante do americano Rudyard Kipling, conseguindo realizar um dos trabalhos mais divertidos da sua filmografia.

O início leva o espectador a prestar atenção na terra estranha que lhe é apresentada. Ao transitar do plano aberto para o fechado, a câmera naturalista faz questão de ressaltar não se tratar de um local qualquer, em algum ponto do Ocidente. A forma estranha com que se come ou se corta o cabelo, as ruas lotadas e sem organização, são os indícios a prender a atenção desde o primeiro momento. Passamos, então, à figura de Kipling (Christopher Plummer), surpreendido por um homem maltrapilho, supostamente desconhecido. No diálogo mantido, fragmentado e lacunar, seremos remetidos para a história que, como a peça faltante, explicará o presente. É preciso pouco para reconhecer um grande diretor. Conduzir a expectativa do público em poucas cenas, como na descrição acima, é tarefa árdua. E John Huston prova estar em grande forma. Sean Connery e Michael Caine são Daniel Dravot e Peachy Carnehan, soldados ingleses a serviço na Índia. Descontentes com as oportunidades oferecidas pelo exército, decidem deserdar rumo às terras pouco desbravadas do Kafiristan. Lá, onde 32 deuses são adorados, planejam conseguir respeito e reconhecimento, a fim de se tornarem reis.

Acostumados a associar o diretor aos épicos que evidenciam a tensão entre os desejos e limitações humanas (O Falcão Maltês: Relíquia Macabra, 1941, ou O Segredo das Joias, 1950, por exemplo), não podemos nos deixar enganar pelo plot simples e quase ingênuo aparentado pelo texto de Kipling. Se por um lado Huston abre mão da trajetória pesada por que seus personagens passam durante  suas obras mais conhecidas, aqui a despretensão da história é tratada na medida para que as duas horas de filme não se limitem ao riso fácil, mas sem deixar que a crítica ao projeto colonialista europeu vire uma tese amarga. A preocupação do roteiro, feito pelo diretor em parceria com Gladys Hill (O Pecado de Todos Nós, 1967) está em acomodar a crítica ao imperialismo sem sacrificar a aventura na qual o público embarcará. Espécie de Coração das Trevas bem-humorado, o filme aposta em substituir a sombra de Joseph Conrad pela zombaria, fazendo com que a ironia – presente desde o título – seja uma chave de leitura para os que não estão dispostos a ficar na camada superficial.

As aventuras pelas quais os personagens passam permitem exercitar o melhor estilo do diretor. Cenas grandiosas, movimentos de câmera grandiloquentes e a construção de um imaginário particular (como em Moby Dick, 1956, ou em O Tesouro da Sierra Madre, 1948) são as forças motrizes, tradicionais companheiras de Huston. Com especial atenção, porém, destacam-se a direção de arte de Alexander Trauner e os figurinos de Edith Head, profissionais premiados inúmeras vezes. Entre o desbravamento de uma montanha, o enfrentar de uma nevasca e a lida com um povo desconhecido, Daniel e Peachy seguem o percurso do homem comum. Visível a todos menos a quem a percorre, a busca é o ridículo e por que sucumbirão.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Tem formação em Filosofia e em Letras, estudou cinema na Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Acumulou experiências ao trabalhar como produtor, roteirista e assistente de direção de curtas-metragens.
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