Crítica


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Sinopse

Juan mora isolado no pequeno povoado de pescadores de Palmar de Ocoa, onde trabalha como caseiro na propriedade de uma família endinheirada da capital. Sua rotina pacata será interrompida pela chegada sem aviso do filho do dono e seus amigos. No transcurso do fim de semana, Juan terá de tomar decisões que irão afetar o resto da sua vida.

Crítica

Os cenários paradisíacos da República Dominicana enchem a tela de beleza em O Homem que Cuida. O mar de cor magnífica, a suntuosidade das casas de veraneio na beira da praia, tudo está ali disposto para mostrar que os espaços privilegiados abrigam condutas espúrias, especialmente as da classe mais abastada em relação aos personagens periféricos do longa-metragem. O protagonista é Juan (Héctor Aníbal), caseiro que corta um dobrado para cuidar da propriedade opulenta do homem a quem chama de “Don” no telefone com flagrante subserviência. O problema do filme de Alejandro Andújar não é exatamente a falta do que falar, ou mesmo a irrelevância dos alvos em que mira, mas a forma absolutamente desajeitada de engendrar os fios da trama em função da crítica aspirada. Não são raras as intervenções de coadjuvantes mal posicionados no enquadramento, sem contar as interpretações pífias de praticamente todo o elenco. Julietta Rodriguez, como Karen, é a “menos pior” nesse quesito.

Em O Homem que Cuida a precariedade salta aos olhos. Do roteiro à encenação, falta pulso firme para evitar momentos constrangedores, como a reação exagerada da mulher solicitada a retirar-se de uma propriedade privada. Se tal comportamento viesse carregado da indignação por conta do deque particular estar num local, em princípio, público, ele seria justificado. Infelizmente não é o que acontece.  Karen, a enfezada que sai em desabalada carreira quando repreendida, volta na companhia de Rich (Yasser Michelén), de longe o sujeito mais patético do filme. Todas as atitudes desse filhinho-de-papai estereotipado são para contrapor a idoneidade de Juan, empregado que obedece a todas as ordens, até as mais absurdas, sem pestanejar. Determinadas sequências são absurdas, como a mudança repentina – e passageira – de atitude de Karen após o primeiro banho de piscina. Ela não se define como vítima daquele entorno que deflagra o abismo entre os estratos sociais, tampouco como mau caráter.

O único que “se salva”, pois praticamente canonizado, é efetivamente Juan. Alejandro Andújar estofa a trajetória desse protagonista com um sem número de infortúnios para valorizar ainda mais a sua tenacidade diante das humilhações. As interações com a ex-exposa, grávida de outro homem, são apenas outro tijolo na construção de uma índole ilibada, sem a qual não haveria, ao menos, um contrapeso tão marcado. O Homem que Cuida chega a ser risível nas tentativas de encarar Rich, o filho do patrão, ferinamente. O problema pode ser dividido igualmente entre as debilidades da encenação e o desempenho praticamente amador do elenco. Yasser Michelén não consegue camuflar a falta de talento ao conceber uma figura propositalmente arquetípica. Suas caras e bocas são insuficientes para criar, sequer, uma relação de repulsa ao comportamento covarde e sintomático. A masturbação à luz da lua é um dos instantes em que percebemos, porém, a esfera conceitual como o maior problema.

De expressão engessada, Héctor Aníbal não logra êxito no esforço visível de apresentar a passividade como um sintoma incontornável das hierarquias constituídas pelo dinheiro. Do lado dos jovens ansiosos por diversão, nem que seja à custa da humilhação alheia, as incongruências são óbvias e frequentes. Difícil é levar a sério alguma situação do longa, porque Alejandro Andújar é incapaz de extrair das relações vigentes o sumo de algo para além da superficialidade predominante. Mais próximo do fim, ocorre uma cena de estupro tão mal realizada que nem dá para ter certeza se o ato foi consumado ou não, embora a violência, de qualquer maneira, tenha sido registrada. Cada nova pessoa adicionada na ciranda maniqueísta, marcada por um embate claudicante entre ricos e pobres, contribui com um patamar distinto de equívoco neste drama demasiadamente inconsistente e bastante precário.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
2
Edu Fernandes
6
MÉDIA
4

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