Crítica


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Sinopse

Júlio aspira se tornar um grande ator, mas a maioria de suas empreitadas nas telas costumam dar errado. Quando o dinheiro aperta, resolve recorrer ao meio irmão, Beto, um obcecado roteirista de novelas que vive em reclusão, com quem não tem muito contato. O ator acredita que sua grande chance será concedida por ele, mas a relação entre os dois se torna a cada dia mais insustentável.

Crítica

Dirigido pelo experiente Francisco Ramalho Jr., O Galã é estrelado por Júlio (Thiago Fragoso), ator inexpressivo que enfrenta os naturais percalços da profissão. Devedor de vários meses de aluguel, ele está na luta para conseguir espaço a despeito da ausência de talento – algo citado/visto em diversos momentos, mas nunca esquadrinhado devidamente na trama, aliás, jogado convenientemente para debaixo do tapete. O tom é exagerado, com personagens se revezando em situações desprovidas de profundidade. Exemplo disso, o teste em que o protagonista encontra o seu “rival”, Raul (Fiuk), intérprete reconhecido, mas cujos modos esnobes anteveem o êxito final do mocinho que, obviamente, passa por uma transformação tão “milagrosa” quanto levianamente delineada. Canastrão de carteirinha, o postulante à fama faz caras e bocas sempre que deseja demonstrar toda a sua “capacidade”, prestando-se regularmente ao ridículo. Sem saída após ser despejado, busca abrigo na casa do seu meio-irmão, Beto (Luiz Henrique Nogueira), um renomado novelista.

O Galã deixa suas fragilidades expostas desde o princípio, não vigorando como peça cômica para consumo ligeiro, tampouco chegando perto de oferecer alguma espessura humana nos dilemas apresentados. Embora estejam em polos opostos, os irmãos precisam mutuamente de ajuda para ultrapassar obstáculos sérios. Raul, apesar do reconhecimento na área, é um sujeito cheio de neuroses, obsessivo por limpeza e absolutamente casmurro, tanto que não sai de casa há quase dez anos. O longa-metragem, no entanto, pretere todas as possibilidades de adensar essa reaproximação fraternal com benefício a ambos, apostando em ocorrências destituídas de relevância e, especialmente, de graça. O humor predominante é anêmico, sequer funcionando nos instantes em que Júlio exibe seu comportamento tipificado com a intenção de situar-se indevidamente na posição de celebridade assediada em público. Os eventos passam sem deixar marcas notáveis.

A presença de Christine Fernandes como Raquel, a psiquiatra vizinha de Raul, por quem este é apaixonado, também é mal articulada, instrumentalizada somente como uma motivação para que o homem vença seus medos e alcance a transformação necessária, constantemente telegrafada. A direção de Francisco Ramalho Jr. é displicente, não fornecendo bases sólidas o suficiente para que o elenco consiga, ao menos, dirimir a fragilidade do roteiro. Estritamente no que diz respeito às falas, O Galã é risível, porém involuntariamente, vide o episódio em que o personagem de Thiago Fragoso diz “não, vou comer outra coisa hoje” em resposta ao chamamento para jantar. Ele, ali, se refere a um encontro amoroso, assim aludindo infantilmente ao possível ato sexual com a vizinha, sem o mínimo timming cômico. Sua aproximação de Raquel igualmente beira o grotesco, com um atropelamento levando ao xaveco canhestro e à escrota “passada de mão” na desconhecida.

Em O Galã, impasses arraigados, como a desavença dos irmãos, são encarados como breves contratempos que anteveem a reconciliação apinhada de lugares-comuns. Fiuk faz participação especial, surgindo em cena para irritar Júlio, nem bem servindo de antagonista nessa fórmula surrada e carente de oxigenação. O desenvolvimento da trama é ingênuo, com reveses contornados facilmente, infortúnios complexos sendo reduzidos a meros inconvenientes passageiros e peças se encaixando forçosamente para permitir um final conciliatório, feliz e artificial. Levando em consideração que o filme se trata de uma comédia, a ausência de graça aparece como um das principais falhas, prontamente identificada, decorrência do texto preguiçoso, das interpretações burocráticas e de uma direção desajeitada que erra feio ao realizar uma sátira dos bastidores televisivos, ao exibir irmãos fazendo as pazes e, sobretudo, ao mostrar pessoas lidando com as suas questões.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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