Crítica


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Sinopse

Enquanto a comunidade local organiza a tradicional festa de São João, Joana e seu noivo, João, sofrem com a chegada de Júlia, a arrogante filha do patrão de ambos.

Crítica

Nunca é muito saudável focar no lado negativo das coisas, ainda mais se estivermos diante de uma produção nacional – a qual sabemos bem das dificuldades enfrentadas até sua realização. Mas também não podemos ser cegos, e por maior que seja a vontade de procurar apenas os pontos positivos, essa tarefa, quando aplicada ao gaúcho Noite de São João, é bastante árdua. A produção apresenta um resultado decepcionante, conseqüência de uma série de decisões equivocadas que terminam por provocar nada mais do que constrangimento ao espectador.

Baseado em Senhorita Júlia, peça teatral escrita pelo sueco August Strindberg no final do século XIX, Noite de São João transpõe essa trama para o início do século XX numa fazenda no interior do Rio Grande do Sul. Lá temos a jovem Júlia (Fernanda Rodrigues) que chega ao local, vinda da cidade grande, justamente numa noite de comemorações da data do título. Arrogante e autoritária, ela logo irá se envolver amorosamente com o capataz João (Marcelo Serrado), que por sua vez está noivo da criada Joana (Dira Paes). Como pano de fundo temos um painel político fracamente desenhado, em que relações de poder e exploração são confrontadas entre estancieiros e peões.

Enquanto os quesitos técnicos (direção de arte, fotografia, trilha sonora, figurinos, edição, efeitos visuais) são irregulares, com alguns poucos destaques, em relação aos méritos do roteiro, da direção e das atuações chegar a um consenso é mais fácil. Afinal, há pouco o que se destacar nestes quesitos. Noite de São João apresenta um ritmo lento e pouco consistente, repleto de vazios inexplicáveis e situações de menor interesse, que acrescentam pouco ao que se está discutindo. Sergio Silva, realizador do interessante Anahy de las Misiones (1997), escorrega feio na condução deste trabalho seguinte, demonstrando pouco controle sobre o elenco e também na condução da narrativa, optando na maioria das vezes por caminhos equivocados e de efeitos nada gratificantes.

Porém, nada é tão triste quanto o desempenho apresentado pela protagonista Fernanda Rodrigues, estrela de novelas da Globo e que no cinema havia feito apenas pequenas aparições em Simão: O Fantasma Trapalhão (1998) e em A Partilha (2001). A garota investe em um estilo de interpretação exagerado, afetado e nada convincente. Serrado, Melhor Ator no Festival de Gramado, poucas vezes consegue ir além do mediano, enquanto que a veterana Araci Esteves deve ficar feliz por sua presença em cena ser bastante reduzida e torcer para que ninguém lembre dela ao término da projeção, de tão embaraçosa que é esta participação. Dira Paes, conhecida como “musa do cinema regional brasileiro”, não chega a comprometer, mas também não apresenta nenhum momento digno deste status.

Noite de São João é, em uma análise mais apurada, um episódio de embaraço para os envolvidos. Os próprios realizadores chegaram a admitir isso, mesmo que por outras vias, ao decidirem reeditar o material filmado após a tímida passagem do longa pelo Festival de Gramado (onde, apesar dos kikitos inexplicavelmente ganhos, obteve uma fria recepção da crítica). Soma-se a isso o fato da produção não ter conseguido uma parceria com grandes distribuidoras para chegar às telas, optando, então, por seguirem por um caminho mais alternativo e independente. É um esforço que merece ser respeitado, pena, no entanto, que esse empenho nos bastidores não se reflita no que é visto na tela.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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