Crítica


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Sinopse

Anna é uma menininha que passa a sofrer de dores crônicas. Examinada no hospital, seus pais são informados de que ela sofre de uma doença grave, rara e sem cura. Inconformada, a mãe de Anna, Christy, passa a mover todos os recursos da família para encontrar uma solução para o problema, até que, à beira de desistir, a garota sofre um acidente: ela cai de uma árvore, despencando por metros antes de sofrer uma batida na cabeça que deveria ter sido fatal. Porém, ela não só sobrevive, como, quando reexaminada em função da queda, os médicos descobrem que ela também está curada da sua doença, o que deixa tanto eles quanto a família incrédulos. Logo o caso está na mídia e todos parecem querer clamar a autoria da cura milagrosa para si.

Crítica

Se alguém aí viu o trailer de Milagres do Paraíso, por favor, faça um favor a si mesmo e poupe duas horas da sua vida. Afinal, o filme estrelado por Jennifer Garner nada mais é do que uma versão estendida de todos os acontecimentos já exibidos no formato reduzido. No entanto, é preciso ser justo: até mesmo aqueles que desconhecem a peça de divulgação não precisarão mais do que alguns minutos de história para adivinharem com bastante precisão tudo que irá acontecer durante o desenrolar da trama. Não há sutileza alguma na forma como tais eventos são percebidos, e ninguém no elenco parece estar interessado em entregar algo além de reações extremas e imediatas, sem profundidade ou reflexão. Há apenas uma coisa a ser feita: olhar para cima – que é o que todos em cena fazem ininterruptamente – e torcer para que tudo termine o quanto antes.

A família Beam vive feliz em sua casa, um sítio afastado da cidade, onde o marido veterinário cuida de seus animais e as três filhas passam seus dias brincando por um gramado sempre verde, enquanto a mãe cuida de todos com um olhar benevolente. Tementes a Deus, vão todos os domingos à Igreja agradecer pelo que possuem, rezar para que tudo continue cada vez melhor e conjugar com seus vizinhos e amigos. A situação começa a mudar, no entanto, quando Anna, a filha do meio, apresenta sinais de uma estranha doença que médico algum consegue identificar. Intolerância à lactose? Dificuldade de digestão? Simples dor de barriga? Todos os diagnósticos são cogitados, ao mesmo tempo em que a criança fica cada vez pior. Onde está Deus nesse momento que não os ajuda? Tal cenário só pode ser resultado de muitos pecados, talvez da mãe, quem sabe do pai, ou até mesmo da pequena menina.

Sim, a tal conclusão somos induzidos pela diretora Patricia Rigen, a mesma que há pouco forçou toda a e qualquer barra para arrancar emoção de uma história que todo mundo conhecia seu desfecho em Os 33 (2015). Como os estereótipos não surgem por acaso, a diretora mexicana investe no melodrama barato e exagerado que se tornou marca registrada da produção audiovisual de seu país, expondo a todo instante pais em desespero, radicais com questionamentos limitados, e profissionais da ciência autoritários e arrogantes. E quando não há mais a quem recorrer e todos parecem já ter perdido a fé que tanto louvavam, o inexplicável acontece: a menina cai de uma árvore e, do nada, acorda curada. Como isso foi possível? Simples, Deus Lhe apareceu para resolver o problema.

Tal explicação parece simplista demais, mas infelizmente é exatamente da forma como se desenrola em cena. E aqueles que por acaso reclamarem de spoilers neste texto, saiba que nada aqui comentado já não era deixado bastante explícito tanto no trailer apontado no começo quanto no próprio livro escrito por Christy Beam, a mãe da menina e no qual este filme é baseado. Ou seja, se tudo é narrado de acordo com a voz dos próprios envolvidos, é quase impossível esperar uma visão mais crítica ou um mínimo de distanciamento. Pois então, assim temos como resultado um longa manipulador e maniqueísta, em que só se curam os que Nele acreditam, enquanto os demais – independente da idade, sexo ou doença – não tardarão e perecer. Irascível, não?

Um dos pilares de qualquer manual para roteiristas afirma que “se toda história, ao ser contada, precisa soar verossímil, a realidade não possui esse mesmo compromisso”. Ou seja, por mais que os protagonistas desse episódio afirmem que foi exatamente assim que lhes sucedeu na vida real, isso não significa que ao ser adaptada como um conto de ficção tal formato deva prevalecer. É preciso buscar uma lógica, uma maneira de conectar-se com o público através da identificação, e não sob um discurso dogmático e impositivo. Milagres do Paraíso é catequese para os convertidos, que talvez funcione como relato de vida para aqueles que saibam de antemão o que aqui irão encontrar. Para todos os demais em busca de algo que soe minimamente como entretenimento, a frustração será quase garantida.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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