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Sinopse

Uma jornada no universo dos fundadores do cinema, os irmãos Louis e Auguste Lumière. Imagens inesquecíveis e um olhar único da França e do mundo da Era Moderna através de 114 breves filmes dos irmãos franceses que foram restaurados em 4K e montados para celebrar o legado dos Lumière.

Crítica

 “Existem mais de cem lugares nos quais você pode colocar a câmera, mas apenas um deles é o certo”. A afirmação atribuída ao grande John Ford, e defendida pelo francês Bertrand Tavernier, norteia toda a concepção deste Lumière! A Aventura Começa, documentário de Thierry Frémaux, do qual Tavernier é produtor, que visa não somente o resgate da obra de Louis e Auguste Lumière, considerados os pais do cinema, mas, acima de tudo, a alteração (correção) da noção do público a respeito da mesma. Atual diretor do Festival de Cannes, e também do Instituto Lumière, em Lyon, Frémaux estreia como realizador celebrando a carreira dos irmãos – ao apresentar as versões restauradas em 4K de seus filmes – e buscando elevá-los para além da posição de inventores da tecnologia, o cinematógrafo, estabelecendo-os, também, como pioneiros na criação das bases da linguagem cinematográfica.

Dentro dos filmetes de cinquenta segundos de duração dirigidos pelos Lumière – em especial por Louis – é possível notar, como bem aponta Frémaux, um apurado senso estético, uma preocupação com o posicionamento ideal da câmera, como exaltado por Ford, que vai de encontro à percepção errônea de muitos sobre o cinema da dupla ser constituído de registros aleatórios da realidade que os cercava. Ao longo do documentário, Frémaux prova justamente o oposto, expondo como os filmes de Louis e Auguste, que trafegam entre o documental e o ficcional, refletiam sua a visão particular sobre essa realidade – moldada pela composição dos quadros, pela exploração da profundidade de campo, do movimento dos elementos filmados etc. – escondendo uma complexidade profunda sob sua aparente simplicidade. Para fundamentar tal ponto de vista, Frémaux adota uma estrutura também bastante simples, que o leva, inclusive, a colocar nos créditos: “Um filme composto e narrado” ao invés “dirigido” por ele.

Pois essa é a função que assume, realizando uma colagem – a composição de um quadro amplo através da seleção de fragmentos – de 108 dos quase 1.500 filmes produzidos pelos Lumière entre 1895 e 1905, para exemplificar seus atributos como criações cinematográficas. Dividido em capítulos que ressaltam características específicas, o longa traz um rico conteúdo informativo/didático, repleto de fatos históricos, sendo, contudo, seu viés interpretativo aquilo que o engrandece. Em sua narração, Frémaux analisa detalhadamente cada filme, fazendo com que o elaborado trabalho dos Lumière se revele em meio à suposta trivialidade das imagens. Além do impacto causado à época pela novidade, obras como A Saída dos Operários da Fábrica Lumière (1895) ou A Chegada de um Trem à Estação (1986), já denotavam o cuidado dos Lumière com a construção dos planos e a ideia da transmissão de sensações.

Em um tom sempre bem-humorado, Frémaux aponta, por exemplo, a criação do “primeiro filme de suspense” nas imagens dos passos de um bebê que aprende a andar, e reafirma a importância da dupla no estabelecimento, mesmo que por vezes involuntário, de signos da linguagem cinematográfica que permanecem até hoje. Nesse aspecto, os arquétipos da comédia ganham grande destaque, já que os irmãos dedicaram boa parte de sua produção a esquetes de humor, como O Regador Regado (1895), talvez o mais conhecido deles. Para Frémaux, nesses registros de menos de um minuto é possível também encontrar elementos que iriam refletir posteriormente na obra de vários cineastas emblemáticos – de europeus como Eisenstein e Visconti, passando por mestres asiáticos como Kurosawa e Ozu, e chegando aos norte-americanos como o já citado Ford ou mesmo James Cameron em seu Titanic (1997).

Além das afirmações embasadas, Frémaux também abre espaço para divertidas brincadeiras, como constatar que os Lumière são os criadores dos remakes – já que rodaram três versões distintas do seminal A Saída dos Operários da Fábrica Lumière – ou fazendo piada ao dizer que talvez tenham realizado também o primeiro filme de samurais – nas imagens feitas no Japão. O anseio por levar o cinematógrafo para o mundo, por sinal, é abordado com especial interesse por Frémaux, que toma o devido cuidado de citar os nomes de todos os operadores de câmera, bancados por Louis Lumière, responsáveis pelos registros do cinematógrafo nos quatro cantos do globo. Afinal, são eles os diretores desses filmes, os homens por trás da escolha primordial do lugar onde colocar câmera para captar momentos de beleza sublime, como o das crianças da antiga Indochina que correm atrás do carro, encantadas com a máquina de filmar.

Ainda que em determinados momentos esbarre na mera descrição literal das imagens vistas na tela, Lumière! A Aventura Começa cumpre com louvor sua proposta de valorização da obra dos irmãos precursores do cinema. Através de seu olhar apaixonado, Frémaux guia o espectador em uma jornada de imersão e reafirmação para alguns, e de descoberta para muitos, entregando um revigorante documento histórico e analítico – que de certo modo dá continuidade ao trabalho de Éric Rohmer em Louis Lumière (1968), documentário para a TV no qual o cineasta Jean Renoir e o fundador da Cinemateca Francesa, Henri Langlois, discutiam os mesmos temas tratados aqui. Uma emotiva declaração de afeto, que faz justiça aos Lumière como autores, se mostrando capaz de converter quem a assiste ao time dos “Lumieristas de sempre”, aos quais o longa é dedicado, como o próprio Renoir, Maurice Pialat e Martin Scorsese.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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Leonardo Ribeiro
8
Robledo Milani
8
MÉDIA
8

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