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Sinopse

Segue a primeira organização de forças especiais do Departamento de Guerra Britânico. Formada durante a Segunda Guerra Mundial pelo primeiro-ministro Winston Churchill e um pequeno grupo de oficiais militares, a unidade de combate ultrassecreta, composta por um grupo diverso de malandros e dissidentes, parte em uma missão ousada contra os nazistas usando técnicas de combate totalmente não convencionais e nada gentis.

Crítica

Mais Operação Valquíria (2008), menos Bastardos Inglórios (2009). Assim pode ser descrito Guerra Sem Regras, décimo quinto longa dirigido por Guy Ritchie – e o quarto desde o fim da pandemia de Covid-19 (outros três estão previstos para os próximos anos). O ritmo intenso do cineasta britânico parece ter afetado também seu espírito criativo, preferindo se ater a velhos parceiros de outras produções e a histórias que, por mais curiosas que possam se apresentar num primeiro momento, inevitavelmente acabam se encaixando em estruturas por ele mesmo já visitadas. Dessa vez, por exemplo, deixa de lado o submundo londrino (como na maioria de suas tramas) e opta por abraçar um episódio histórico (algo que também não lhe é inédito, visto o épico Rei Arthur: A Lenda da Espada, 2017). Porém, mais uma vez se propõe a narrar um conto de ladrões unidos por um bem comum e destinados a trabalhar em equipe, algo que tem feito desde Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes (1998), sua estreia há quase três décadas. Se ao menos tivesse aproveitado estes retornos a uma fórmula que lhe tanto agrada para aprimorar a técnica, talvez surtisse algum efeito. No entanto, o que se vê é uma condução preguiçosa e desleixada, como se os elementos reunidos, por si só, fossem suficientes.

Eis, portanto, as comparações que deram início a esse texto. Guerra Sem Regras, assim como os títulos estrelados por Tom Cruise e Brad Pitt, respectivamente, citados acima, também parte de um evento ocorrido nos bastidores da Segunda Guerra Mundial que tinha como interesse impedir os avanços de Hitler e sua política invasiva e destruidora. Porém, ao invés de abraçar a fantasia e investir na criatividade – o que exige uma excelência exibida com gosto por TarantinoRitchie se contenta em apenas recontar os passos daqueles que lhe precederam, como se percorrer os caminhos de uns fosse o bastante para a glória de outros. Afinal, sua intenção de oferecer luz aos esforços de uma turma que acabou sendo apagada, de uma forma ou outra, pelo tempo, é de fato notável. Mas se reconhecer tais feitos fosse apenas uma questão de justiça, qual a razão de apresentá-la como uma aventura mirabolante repleta de riscos e reviravoltas? A resposta é simples: há mais por detrás destas ações. É esta, enfim, a investigação que se mostra falha.

O Ministério da Guerra pouco Cavalheiresca, ou melhor dizendo, os que ficaram encarregados de um combate sem pompa, nem circunstância. São esses os protagonistas de Guerra Sem Regras. Tal qual o Esquadrão Suicida da DC Comics (ou, numa referência mais clássica, Os Doze Condenados, 1967, de Robert Aldrich), Gus March-Phillips (Henry Cavill, em zona de conforto, tendo menos destaque do que se poderia esperar) e asseclas são homens fora-da-lei, muitos já presos ou à espera de uma pena, que são convocados para realizar um trabalho que qualquer um mais correto ou obediente às leis e convenções jamais se sujeitaria. A missão é simples: atacar um porto na costa africana tomado pelos nazistas e afundar o maior dos navios inimigos, aquele responsável por abastecer os submarinos que poderiam impedir o avanço dos aliados norte-americanos pelo Atlântico (que, como a História comprovou, acabou sendo determinante para o final do conflito).

Os filmes de Guy Ritchie, uma vez desfeita a maquiagem e artimanhas narrativas que se encarregam de oferecer novas facetas a um mesmo modelo, se confirmam bastante similares. Alguns surpreendem, principalmente aqueles do início de sua carreira. Mas já faz algum tempo que o cineasta tem dado a impressão de atuar no piloto automático. Além de Cavill, ele agrega ao elenco outros nomes com os quais já havia trabalhado antes, como Cary Elwes e Henry Golding, ambos por demais apagados para gerar qualquer observação mais detalhada. Se há algum destaque é Eiza González (O Problema dos 3 Corpos, 2024), que revela comprometimento e intensidade como uma femme fatale nem um pouco disposta a ser subestimada. Entre os demais brutamontes, o grandalhão Alan Ritchson (Reacher, 2022-2024) parece ser o mais esforçado em alcançar algum tipo de versatilidade, enquanto que o show é mesmo de Rory Kinnear, completamente transformado – a ponto de estar irreconhecível – como um Churchill mais perturbador e maquiavélico do que aquele vivido por Gary Oldman em O Destino de uma Nação (2017) – o que, definitivamente, não é pouca coisa.

A despeito de um ou outro acerto – e dos tantos tropeços passíveis de observação que permeiam o desenrolar dos acontecimentos – Guerra Sem Regras é por demais formulaico para gerar algum tipo de apreensão por parte da audiência. Primeiro, há o fato desta ser uma iniciativa que deu certo – o final todo mundo conhece – e, portanto, deveria importar mais o durante do que o desfecho. Segundo, apesar dos nomes estrelados, são todos meras peças de uma engrenagem disposta de tal forma de se mostrar mais complicada do que de fato foi, tudo para potencializar os esforços dos envolvidos, como uma aventura fugaz da Sessão da Tarde, sem o devido peso do que estava em jogo. Em resumo, aos realizadores parece ser mais importante uma das mentes por trás desse fato ser a de Ian Fleming (em cena vivido por Freddie Fox, de A Casa do Dragão, 2024) – que, supostamente, teria se inspirado no sucesso desta empreitada para a criação do seu personagem mais famoso, o espião James Bond – do que o futuro do planeta como um todo frente a uma ameaça que visava dizimar povos e culturas. Ritchie continua sendo um contador de histórias habilidoso, mas que cada vez mais tem demonstrado dificuldade em encontrar projetos que, de fato, lhe motivem. Afinal, ele já fez isso antes – e melhor.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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