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Sinopse

O chef de um restaurante estrelado, mas um tanto ultrapassado, vê toda sua clientela ir para um novo food truck em frente ao seu estabelecimento. Para piorar, ele é obrigado a aceitar uma auditora do banco que quer promover uma verdadeira revolução no restaurante. O nervosismo é tanto que leva o chef a perder o seu paladar.

Crítica

Se há algo realmente bom em Gosto se Discute é a confirmação do talento de Cassio Gabus Mendes. Mesmo atuando a partir de um roteiro completamente rocambolesco, diante de uma companheira de cena inexpressiva como Kéfera Buchmann, ele consegue construir um protagonista com quem minimamente nos importamos. Isso já é muito, especialmente se levarmos em conta o caráter anódino do longa-metragem dirigido por André Pellenz, um amontoado de situações desprovidas de peso dramático. Senão vejamos. O primeiro indício da desconjuntura dominante é a elipse que evidencia a abrupta e forçada queda do status do restaurante do Chef Augusto (Gabus Mendes). Num instante, é um lugar frequentado por personalidades como Mariana Ximenes, mas, no subsequente, pena para manter as portas abertas por causa da concorrência de um food truck com proposta gourmet em plena ascensão. É um salto e tanto, fruto da despreocupação flagrante com as minúcias e a básica verossimilhança.

A entrada de Cristina (Kéfera) na trama não ajuda a tornar as coisas melhores, ao contrário. A intervenção da representante bancária, símbolo da frieza dos interesses da instituição financeira, é apenas um pretexto para determinadas instâncias, como a necessidade de Augusto reavaliar-se como profissional e pessoa. A atriz é incapaz de acompanhar a contento o parceiro mais frequente, incorrendo viciosamente em expressões de espanto para denotar todos os estados de espírito, do que decorre uma sensação de pasteurização gratuita. Originalmente uma celebridade da internet, Kéfera não demonstra a que veio, ou melhor, apresenta um trabalho que deflagra inépcia à vivência de personagens com algum traço dramático, ainda que o filme seja atravessado por uma vontade (malfadada) de fazer comédia. Ela realmente destoa do conjunto, criando um ruído considerável à fruição de Gosto se Discute, algo agravado na medida em que Cristina é investida de imprescindibilidade ao todo.

Outra falha grave é a sucessão de vieses perscrutados sem densidade. O problema inaugural a ser resolvido é a dificuldade de relacionamento entre a empregada do banco e o restaurateur. Depois, surge a insólita perda de paladar, em virtude da crise nervosa – que abre espaço, infelizmente, à participação de um Paulo Miklos absolutamente caricato. A origem da rivalidade com Patrick (Gabriel Godoy) é igualmente tratada como um apêndice, e prontamente deixada de lado. Talvez, a abordagem mais gratuita seja a da pretensa singularidade de Cristina, com direito a presença dos pais e a conversa do ex-ficante com indiscrições acerca de detalhes de alcova. Gosto se Discute é como uma iguaria indigesta, feita misturando-se ingredientes aparentemente apetitosos e outros antecipadamente insossos. Sem demora percebermos que o resultado não deu liga. Apenas exceções bem esparsas se encarregaram de tornar a degustação menos intragável. É tão inofensivo quanto errático.

Gosto se Discute caminha inapelavelmente para um fim previsível, no qual determinadas complexidades são devidamente abrandadas a fim de pavimentar o caminho à conciliação. Especificamente como exemplar romântico, ele falha por conta da ausência de química entre Cassio Gabus Mendes e Kéfera Buchmann. Os demais personagens são meros coadjuvantes sem importância reconhecível, a não ser como escadas em momentos supostamente cômicos, mas que não funcionam como tal. O único componente que sobressai positivamente na realização de André Pellenz é a apresentação dos pratos, cujo capricho poderia, perfeitamente, ter inspirado a equipe criativa. Num ambiente gastronômico por excelência, o visual da comida aguça os sentidos, dando água na boca. Todavia, enquanto espectadores de cinema, saímos dessa experiência com a sensação indigesta de termos acompanhado um híbrido desajeitado, nem drama, tampouco comédia, refém da falta de inspiração quase geral.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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