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Sinopse

Duas senhoras acompanham o girar do redemoinho no sertão mineiro. Uma delas sente a morte do marido, mas sem chorar. A outra carrega no tambor a alegria do seu povo.

Crítica

O tempo não para. Quem para somos nós!” Essa frase, pronunciada no início de Girimunho por Dona Bastú, uma das protagonistas, dá o tom do que irá vir em seguida. Afinal, estamos diante de um filme feito para poucos espectadores, e mesmo esses encontrarão certas resistências no processo de absorvê-lo. Mas não por sua dificuldade. Muito pelo contrário, aliás. O diferencial, aqui, é a simplicidade. Tudo é tão absurdamente simples que deixar passar uma ou outra coisa não será um erro proposital. Mas poderá complicar toda a percepção da obra.

Dirigido pelos estreantes Helvécio Marins e Clarissa Campolina (antes, os dois haviam realizado apenas documentários e curta-metragens), Girimunho se passa no meio do sertão mineiro, num local onde o tempo parece, definitivamente, ter parado. Mas seria mesmo culpa do tempo, suspeito onipresente, ou seriam as pessoas as responsáveis por essa sensação de esquecimento e torpor? Quem, de fato, parou? O filme começa numa festa religiosa, algo próximo a um batuque. Depois desse “agito”, música e alegria se tornam elementos escassos naquelas paragens. Nem a morte do marido, no dia seguinte, parece comover Dona Bastú. E se a vida dela parece congelada, ao menos resta esperança às netas, que anseiam por conhecer novos horizontes, ou à vizinha, tão acomodada quanto ela, mas esperta como poucos, preocupada com o que o dia seguinte pode oferecer.

Exibido em diversos festivais ao redor do mundo, Girimunho já passou por Veneza, Toronto, San Sebastian, Mar del Plata, Nantes, Roterdã, Nova York e Havana. No Brasil, foi exibido pela primeira vez na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, seguindo depois para o Festival do Rio, para a IV Janela Internacional de Cinema de Recife e para a Mostra de Tiradentes. Durante todo esse celebrado percurso, ganhou o Prêmio Especial do Júri e o de Melhor Filme pelo Júri Jovem no Festival de Nantes, na França, o Prêmio Especial do Júri em Havana, Cuba, e uma Menção Honrosa em Veneza, na Itália. Indicativos mais do que suficientes da relevância do trabalho, que se destaca do atual cenário tanto pela ousadia linguística quanto pelo visual, seco e verdadeiro. As cores são fortes, os sentimentos são reprimidos e os sonhos são esquecidos. Ou apenas deixados de lado, guardados até o momento certo.

Co-produção entre Brasil, Espanha e Alemanha, Girimunho não poderia ser mais nacional. O próprio título é uma referência pátria, pois remete ao redemoinhos formado pelo vento com a poeira das estradas abandonadas no meio dos campos secos. Com cenas de extrema beleza – como a despedida das roupas no Rio São Francisco – e muita economia verbal, é um daqueles casos que mostra muito exibindo pouco. A poesia está nos detalhes, nos olhares, na singularidade de cada expressão. Nem todos perceberão esse cuidado, cada intenção ou mesmo o que está escondido por baixo da superfície. E talvez seja justamente isso o maior mérito deste trabalho. Pois como diz Dona Bastú, “a gente não começa e nem acaba, a gente vive”. E ponto final.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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