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Sinopse

A jovem Nada está de novo em sua casa, ou pelo menos é o que achava. De volta ao Líbano, ela percebe que é uma estrangeira em seu próprio país, mas ainda há um lugar que ela pode chamar de lar: uma casa abandonada em ruínas e assombrada pela presença de seu avô que desapareceu misteriosamente durante a guerra civil.

Crítica

Trabalhando novamente com a temática do exílio e do retorno ao lar, abordada anteriormente no documentário Pays Rêvé (2011), a cineasta libanesa Jihane Chouaib realiza sua primeira incursão na esfera ficcional com De Volta, que acompanha a história de Nada (Golshifteh Farahani), uma jovem que, após anos vivendo em Paris, regressa ao Líbano para visitar a tia-avó doente, Nour (Mireille Maalouf). Chegando ao pequeno vilarejo onde passou parte da infância, Nada decide se instalar na antiga casa do avô, um local abandonado, cercado por memórias afetivas e mistérios que remontam ao período sombrio da Guerra Civil local. Um ponto de partida que carrega traços da própria trajetória de Chouaib, cuja família deixou o Líbano para viver no México e depois na França, bem como da de Farahani – impedida de entrar em seu país, o Irã, e que também reside atualmente em território francês.

Os conflitos particulares derivados de tal situação se encontram no centro do longa, tomando conta da protagonista. Recebida com olhares desconfiados pelos vizinhos – por ser mulher, solteira e já não falar mais o árabe com perfeição – Nada experimenta uma sensação de não pertencimento, sendo tratada como intrusa, uma estrangeira em sua própria terra, algo que se intensifica também em virtude do passado nebuloso de sua família. Das paredes em ruínas aos cartuchos de munição jogados no chão, vistos quando a jovem adentra a casa do avô pela primeira vez desde sua partida, Chouaib deixa claro que a violência, de algum modo, assombra o cenário. Uma marca da qual todos parecem ter ciência – do mesmo modo que a tia, antes de morrer, afirma ser de conhecimento geral uma sangrenta história de vingança – exceto Nada.

A recusa da personagem em enxergar tais sinais se dá pelo fato de esses soarem incompatíveis com a doçura que envolve suas lembranças - ilustrada de forma literal nos primeiros flashbacks em que a pequena Nada observa o avô pelas frestas de uma trincheira improvisada formada por sacos recheados de balas e açúcar. É o desejo inatingível de reviver essa memória idealizada que a impulsiona a lutar pela preservação da imagem que guarda do avô, simbolizada pela casa, fazendo com que contrarie o irmão, Sam (Maximilien Seweryn), enviado pelo pai, sempre ausente, com o intuito de cuidar da venda do imóvel. A princípio, ele também compartilha do sentimento saudosista da irmã – regressando à infância ao dormirem sob a cabana de lençóis – contudo, aos poucos, se mostra mais realista e mudado, hoje capaz de confrontar Nada que, quando criança, sempre acabava impondo suas vontades.

Tendo um pilar de sustentação sólido no talento e versatilidade de Farahani, cujos traços do rosto mesclam uma beleza delicada à impetuosidade necessária na composição de uma personagem que luta para se impor tanto como mulher quanto como uma legitima cidadã de sua terra, Chouaib constrói uma narrativa de atmosfera evocativa, explorando cuidadosamente o ambiente da casa em ruínas. As passagens noturnas, com iluminação de velas, ou sequências como a da queima de fogos de artifício, denotam a habilidade da cineasta no estabelecimento de um clima ao mesmo tempo intimista e denso – já que os fantasmas do passado escondidos no armário buscam se libertar. Apesar disso, nem sempre Chouaib consegue ultrapassar essa construção atmosférica para extrair o máximo de força dos conflitos levantados.

O ato central, em especial, por vezes soa repetitivo, sem que a trama, de fato, evolua. Chouaib ainda opta por, até o final, manter ligeiramente turva a fronteira entre a realidade e a fantasia das recordações de Nada, o que leva a várias questões inconclusivas, nem sempre surtindo o efeito desejado. Ainda assim, De Volta se mostra eficaz na exploração de temas com os quais é possível se identificar facilmente, mesmo para quem nunca viveu uma situação de exílio, como o da dificuldade de aceitação das mudanças. O diálogo de Nada com uma garota de origem palestina refugiada de guerra, e que vislumbra uma volta para casa, sintetiza bem essa qualidade do longa, com a cineasta parecendo apontar para a constatação de uma inevitabilidade universal.

O desfecho, porém, ainda que carregado de melancolia, não deixa de trazer algo de reconfortante – presente na revelação feita pelo jovem vizinho que demonstra um interesse particular pela protagonista – sugerindo que na manutenção da memória, da inocência do olhar infantil, há um sentimento que nunca irá se perder. Um sentimento como aquele ostentado por Nada e Sam de que, não importa onde estiverem, sempre carregarão um pedaço de sua terra e da história de seu povo.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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CríticoNota
Leonardo Ribeiro
6
Robledo Milani
6
MÉDIA
6

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