Crítica


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Sinopse

Os dilemas de irmãs adolescentes vivendo uma fase de intensas descobertas. Dos 14 aos 21 anos, amores, dúvidas, decisões ora acertadas, ora equivocadas e as aventuras de uma geração.

Crítica

Para o adolescente, o mundo divide-se entre a facilidade infantil, à qual deixou de pertencer, e a independência adulta, a qual ainda não alcançou. Foi durante esse ingrato limbo existencial que me deparei pela primeira vez com Confissões de Adolescente, seriado exibido pela TV Cultura. Inspirado no livro de Maria Mariana, filha do cineasta Domingos Oliveira, depois transformado em peça e levado à televisão, a obra reafirma a trajetória de sucesso ao chegar aos cinemas pelas mãos de Daniel Filho, diretor responsável por Se Eu Fosse Você (2006) e Se Eu Fosse Você 2 (2009), duas das maiores bilheterias brasileiras. Como uma espécie menos centrada de Holden Caulfield, o personagem de J. D. Salinger em O Apanhador no Campo de Centeio (1951), o grande trunfo de Confissões de Adolescente não é o de fazer parte do imaginário de gerações – ainda que certamente o faça e eventualmente o ajude – mas na versatilidade com que retrata uma etapa inevitável e insuperável da vida. Para desdobrar a estrutura dramática, a história se baseia na família de Paulo (Cássio Gabus Mendes), o pai divorciado que tem de dar conta dos dramas das quatro filhas adolescentes: Tina (Sophia Abrahão), Bianca (Bella Carnero), Alice (Malu Rodrigues) e Karina (Clara Tiezzi).

Desde a abertura, Daniel Filho marca a diferença que o seu projeto carrega em relação às demais adaptações. Se em 1994, quando a TV Cultura passou a exibir o seriado, o mundo era pré-digital e o teatro sofre com a limitação da representação, no cinema há a tentativa de uma conexão profunda entre o comportamento das jovens e o meio de expressão. A linguagem, com a qual flerta no mesmo gênero Insônia (2012), tem no projeto de Filho um casamento, uma vez que as redes sociais dividem o espaço antes exclusivo dos protagonistas. Quando a tensão entre Tina e o namorado se encaminha para ser resolvida, o passado é revisto por uma linha do tempo virtual, e terá o desfecho somente após o atualizar de um status. Longe de ser místico ou ao acaso, o número de filhas de Paulo tem uma função dramatúrgica específica. Enquanto o pai sofre com o aumento do aluguel, Tina enfrenta o drama com o namorado e a perspectiva do primeiro emprego; Bianca mantém um relacionamento misterioso; Alice está às voltas com a primeira vez; e Karina encontra um pretendente estranho. Se a estrutura permitia à peça e ao seriado amplitude de situações e respiro dramático, no filme, a ferramenta deixa a desejar, impondo-se  como efeito colateral. Na tentativa de cobrir as quatro histórias, apenas o núcleo de Tina e Alice resultam eficazes e conseguem profundidade. Ao contrário das histórias de Bianca e Karina, excessivamente estereotipada e invariavelmente superficial, sente-se ali a transmissão de um conteúdo que permite o reconhecimento e o diálogo com o espectador.

Antes mesmo de vir à tela, o problema da diluição dramática era evidente. O seriado, ressalva seja feita, lidava bem com a circunstância por contar da sua extensão para articular o enredo, construindo-o episódio a episódio. Para Daniel Filho, a dificuldade não se resolveu com a opção videoclíptica de Diana Vasconcellos, que apenas repete a fragilidade da montagem de o bom Tempos de Paz (2009). Por outro lado, Vasconcellos fez o possível para trabalhar o material recebido do roteiro. Assinado por Sylvio Gonçalves e Matheus Souza, a dupla – que contou com inúmeras colaborações até a versão final do texto – tem o mérito de construir situações de humor que escapam do óbvio, mas acaba presa ao tema dos relacionamentos, como se o mundo adolescente, ainda que encontre nestes o seu apogeu, encontrasse aí a sua limitação. Diferentemente de Antes que o Mundo Acabe (2009) e As Melhores Coisas do Mundo (2010), filmes que transitam pelas descobertas sem que os personagens percam os resquícios de ingenuidade e do lúdico, Confissões de Adolescente se ressente da puerilidade comportamental em favorecimento de uma inflação do tema central.

A ideia de mesclar a direção experiente de Filho com nomes em ascensão, como o de Gonçalves e, principalmente, Souza, parece correta de antemão. É certo que os jovens trazem a atualização temática cuja ausência Confissões de Adolescente não suportaria. No entanto, como peças que por vezes não encontram o melhor encaixe, a combinação trouxe algumas distorções no tom do filme. Para quem conhece o trabalho de Filho e Souza, sabe que ambos lidam com o humor em registros diferentes. Contemporâneo e autorreferente, a cena irônica à série Crepúsculo está para o jovem tanto quanto a ida à lua, da personagem de Alice, está para o humor exagerado de Filho. A sobreposição dos dois estilos não tira o filme da rota, mas soma-se às turbulências de percurso a gerar instabilidade. Apesar da dispersão dramatúrgica, o elenco bem formado dá conta de uniformizar o tom das atuações. Mais exigidas, Sophia Abrahão e Malu Rodrigues tem evidente destaque nos papeis, em que os recursos de Malu ainda podem ser percebidos com fluência tanto para o drama como para a comédia. Do lado masculino, as escolhas foram menos criteriosas, os atores menos naturais e, exceto Pedro (Bruno Jablonski), mais padronizadas, resultando em personagens artificiais.

Evitar a nostalgia seria como evitar o passado. Apesar disso, Confissões de Adolescente é um filme que acerta em seguir adiante, sem olhar excessivamente para trás. As relações mantida com o elenco do seriado são mínimas – e Deborah Secco, como mãe disposta a levar o filho para perder a virgindade com uma “profissional”, é mais engraçado pela ironia de compartilhar a atriz de Bruna Surfistinha (2011) do que pela homenagem ou construção do personagem. Assim, Confissões de Adolescente segue seu próprio rumo. Adornado aqui e ali, como as transformações inevitáveis sofridas por qualquer personalidade, permite aos adolescentes entenderem uma das funções da arte, que é gerar reconhecimento e dividir experiências, resguardando, ainda, o frescor de um momento tão importante.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Tem formação em Filosofia e em Letras, estudou cinema na Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Acumulou experiências ao trabalhar como produtor, roteirista e assistente de direção de curtas-metragens.
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