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Sinopse

Sem querer, Victor envia um e-mail comprometedor ao seu chefe mala. Com a ajuda da crush do financeiro e de seu amigo sem noção, ele tem poucas horas para salvar seu emprego e lidar com um hacker picareta, um site pornô e um mascote chamado Sorrisinho.

Crítica

Entre outras restrições, a pandemia do Covid-19 impôs o distanciamento, desafio extra às equipes de cinema. Afinal de contas, como rodar um filme sem a preponderante interação presencial? Como Hackear seu Chefe tenta transpor essa barreira apropriando-se da dinâmica das telas, do formato screenlife, ou seja, do protagonismo das telas na comunicação remota via aplicativos e outros dispositivos de chamadas de áudio e vídeo via internet. O mais interessante no tecido narrativo urdido por Fabrício Bittar é exatamente a não conformidade com essa interatividade num plano superficial. Já que se faz necessário colocar os personagens dialogando virtualmente, o cineasta também se vale de diversos elementos caros à rotina cibernética, sublinhando a importância das ferramentas tornadas quase obrigatórias aos instados a home office. Tudo começa numa reunião de equipe repleta de arquétipos organizacionais. O chefe seduzido por jargões mercadológicos da moda e anglicismos; o guru encarregado de “limpar os chákras” da equipe; os jovens impetuosos meio de saco cheio da balela. Enfim, o painel é bem construído, com evidentes intenções cômicas.

Como Hackear seu Chefe é interessante pela brincadeira com os tantos componentes desse admirável mundo novo. Em determinado e-mail, o protagonista, Victor (Victor Lamoglia), escreve “meu pau” erroneamente ao querer se referir a “meu pai”. O erro de digitação bobo ensaia criar um efeito nocivo involuntário, exatamente pela mudança abrupta de sentido na troca de apenas uma letra da mensagem que deveria ser uma espécie de puxa-saquismo para evitar o esporro do patrão. Outra passagem passível de provocar identificação imediata com parte significativa do público é a dificuldade de sanar a ânsia do reCAPTCHA pela comprovação de que o sistema não é operado por um robô. A piada envolvendo o “clique apenas nas imagens com Roberto Carlos”, num painel que mistura imagens reais do cantor e de sósias, é uma das sacadas espertas que o filme acumula em prol do absurdo. A predominância de programas, agendas, reuniões que pipocam repentinamente, pesquisas no Google para saber coisas ora banais, ora estapafúrdias, é muito bem instrumentalizada.

Como Hackear seu Chefe é uma típica comédia de erros, na qual um equívoco leva ao outro e torna a missão/a vida dos personagens muito caótica. Incumbido de fazer uma apresentação nova à empresa, do dia para a noite, Victor acaba se embananando e compartilhando com a alta cúpula do escritório uma coleção de memes ofensivos que dá vazão ao asco sentido pelo personagem de Augusto Madeira (ator que está se especializando em fazer essa caricatura pitoresca de chefe antenado e proativo, vide a série Ninguém Tá Olhando). A decisão de hackear o patrão leva à necessidade de encontrar alguém capaz e vai desembalando outras circunstâncias engraçadas, como o striptease para arrecadar o dinheiro à operação, por meio do qual há a sacanagem com os fetiches em sites especializados. A contribuição financeira dos anônimos é condicionada por imitações pseudo-eróticas de Silvio Santos (?) e de um matuto caipira, situação bem trabalhada dentro da ideia do ridículo para entreter, mas também a fim de elaborar um chiste com a verdade. Até o ritmo é alusivo à atualidade.

A lógica interna de Como Hackear seu Chefe contempla pequenos esgarçamentos da realidade. Fabrício Bittar torce componentes para adequá-los à lógica deliberadamente exagerada, tais como o encontro conveniente da imagem da ex-namorada numa pesquisa essencial no Google. Há uma mensagem sob todo esse estrépito, a de que a amizade deve prevalecer mesmo em episódios praticamente incontornáveis. Contudo, o grande valor do longa-metragem é a utilização de peças vitais do nosso dia a dia rearranjado pela pandemia a fim de gerar empatia e graça. Tirar sarro de alguém no privado durante uma chamada coletiva, pesquisar a vida exposta de outrem nas redes sociais, enviar mensagens comprometedores sob efeito do álcool, ter medo de declarar-se após um pé na bunda homérico (e devidamente registrado à posteridade, outro indício dessa pós-modernidade conectada), são alguns dos exemplos bem encaixados nessa comédia saborosa. De quebra, a participação do veterano Nuno Leal Maia como o “tiozão sincerão”, cuja inabilidade tecnológica rende seus constrangimentos.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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