Crítica
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Sinopse
Tian-tian, um garoto de oito anos, tenta durante o verão de 1997 encontrar quem roubou a bicicleta de sua avó. Porém, o impedimento de sua família vai lhe impor um dilema moral. Desapontado com a indiferença dos seus, ele embarca solitário nessa jornada de reparação, em busca de algo que lhe parece justo.
Crítica
Na superfície, Cavaleiro de Verão se trata de uma história de amadurecimento, filão conhecido pelo termo coming-of-age. Na primeira cena, o protagonista se depara com a rigidez da escola, o modus operandi quase decalcado do militarismo contido no filme que instiga a imaginação, porém noutra chave. A tentativa de evadir momentaneamente dessa austeridade vem da leitura da história em quadrinhos que fala dos feitos heroicos via mitologia. Todavia, tal subterfúgio é subaproveitado, sobretudo porque não ressurge com tanta importância no decorrer da trama. Aos poucos, prevalece outro traço vital do filme de Xing You, justamente a dificuldade de conciliações no convívio de gerações diferentes. Vêm à tona especialmente os ruídos de comunicação entre pais e filhos, os desencontros de anseios completamente diferentes, estes decorrentes de concepções de mundo às vezes diametralmente opostas. De certa forma, estamos frente a uma crise ocasionada pelas enormes transformações na sociedade chinesa. Pena o cineasta não desenvolver um dos vieses sem eclipsar o outro.
O menino vive com os avós, o tio e o primo da sua idade. A discrepância entre os moleques é sintomática. O principal é tímido, contrário a responder violentamente, mesmo quando vítima da perseguição de valentões. O outro é oposto, irascível, moldado pelo rigor desinteressado do pai um tanto sem perspectivas. Nessas camadas geracionais investigadas, alguns elementos são dispostos como nutrientes de uma complexidade emocional. O principal deles, a ajuda que o avô presta ao jovem filho do amigo, isso enquanto negligencia (por desistência) o próprio descendente direto que também precisa de uma colocação profissional urgentemente. No entanto, Xing You perde um pouco a mão ao fazer a esposa questionar o homem especificamente por essa conduta estranha, expondo a contradição verbalmente, desnecessariamente a reiterando. Por sua natureza simples e direta, a conjuntura seria completamente perceptível a partir dos gestos e das consequências. Assim como tem dificuldade para equilibra-se entre seus fios condutores, o filme às vezes teima em escancarar.
Outro exemplo da falta de confiança do realizador, tanto na própria capacidade de fazer-se entender por modos menos expositivos, quanto na inteligência do espectador à leitura, é a simbologia do rato preso na gaiola. As crianças vivem a expectativa de que o animal inconveniente seja capturado. A tortura do bichinho engaiolado, dentro da lógica distorcida de “dar o exemplo”, é refletida adiante no linchamento do rapaz pego roubando uma bicicleta. A relação é perfeitamente compreensível como parte do aprendizado dos meninos – inclusive sobre como responsáveis podem equivocar-se nesse processo pedagógico –, mas Xing You decide fazer com que uma das crianças mencione o episódio equivalente. Cavaleiro de Verão está preocupado em escapar aos lugares-comuns do filme de amadurecimento, indo além com sua leitura compassada da dissonância entre pais e filhos, dos abismos criados pelas transformações de noções basilares ao longo dos tempos. Entretanto, a insistência em sublinhar a mensagem tira dela sua força para além do professoral.
O termo asfixiante de Cavaleiro de Verão é a lição. As coisas giram em torno do acúmulo de gente que não sabe como lidar com seus filhos – corroborando isso, a professora fazendo sua confissão de inépcia. O menino que vive a expectativa da ligação dos pais no Japão é atravessado por esse emaranhado todo, obviamente, mas seu quinhão é compreender de que forma, ao crescer, é preciso equilibrar a necessidade de ser forte para sobreviver ao entorno agressivo e a não menos vital sensibilidade a fim de manter-se humano e íntegro. Infelizmente, Xing You pretere as sutilezas desse aprendizado com rotas divergentes, mas insuspeitamente convergentes, para reafirmar teses pré-concebidas. Mais do que estar aberto a absorver a heterogeneidade dos componentes, quiçá hipócritas, das jornadas distintas de pais, filhos e avós, o realizador é engessado pela vontade imperativa de dizer o que pensa sobre isso tudo. O elenco afinado e a relevância dos apontamentos garantem o interesse na ciranda com a qual é fácil identificar-se, a despeito das tantas particularidades.
Filme visto online na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em novembro de 2020.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 5 |
Francisco Carbone | 6 |
Ailton Monteiro | 6 |
MÉDIA | 5.7 |
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