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Sinopse

Cabo Rosinha está sendo acusado de ter matado um menino durante uma Blitz em um colégio. Sua esposa, Heloísa, tenta descobrir a verdade sobre o ocorrido. A população está indignada com o caso.

Crítica

O sobrenome já indica: Bosco e Rene Brasil são, de fato, parentes. O primeiro é tio (e padrinho) do segundo. Bosco Brasil é nacionalmente reconhecido pelo seu trabalho como dramaturgo. Escreveu novelas como As Pupilas do Senhor Reitor (1994), Torre de Babel (1998) e Tempos Modernos (2010), marcou presença no teatro em títulos como Budro (1994) – vencedor dos prêmios Shell e Moliére – e Cem Gramas de Dentes (2008) – premiado no Circuito Sesi – e estreou no cinema com o roteiro de Tempos de Paz (2009), baseado na peça de sua autoria Nova Diretrizes em Tempos de Paz (2001) – reconhecida pela APCA – que lhe rendeu um troféu do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Ou seja, sua experiência é mais do que comprovada. Rene Brasil, por outro lado, é um afilhado aplicado, e após dirigir os curtas Ressaca (2009) e Máscara Negra (2010) – ambos premiados no Brasil e no exterior – agora estreia no formato longa com Blitz, um drama policial que não esconde sua vocação teatral. E essa característica joga tanto a favor como contra o resultado exibido em cena.

O protagonista de Blitz é o cabo Rosinha, interpretado com bastante entrega por Rui Ricardo Diaz, o homem que já foi Lula (Lula: O Filho do Brasil, 2009) e o Marechal Rondon (Rondon: O Desbravador, 2016) na tela grande. Aqui ele demonstra a mesma determinação e comprometimento dos seus personagens históricos para viver um homem bastante comum, porém envolto por uma situação extraordinária. Nas primeiras cenas, o acompanhamos, ao lado de colegas, durante uma revista em um grupo de estudantes. O clima é tenso, e quando tudo parece indicar que algo dará errado, é exatamente aí que os problemas acontecem. Um tiro se ouve. Um aluno está morto. A culpa recai sobre Rosinha. Mas seria ele o culpado?

A partir desse momento, o filme estabelece seu campo de atuação: o marido, ao chegar em casa, encontra a mulher decidida a abandoná-lo. Ele sente os olhares da vizinhança que o julgam, o condenam, o repudiam. Ela está cansada do medo, da insegurança, do desprezo que sente somente por estar ao lado daquele homem. Mesmo assim, deixá-lo não é tão fácil. Afinal, os dois compartilham uma vida. Há muito em jogo. E não apenas no presente, mas também no passado. As dificuldades do começo do relacionamento, o início da vida a dois, as conquistas e os sofrimentos que enfrentaram juntos. Seria justo ela permitir que ele enfrente as consequências da opinião pública sozinho? E o que ele tem a dizer a respeito? Já é tarde demais para mudanças de opinião, ou ainda há tempo para um novo ponto de vista?

Rene é feliz ao colocar sua história nas mãos de dois atores competentes: além de Diaz, o espectador é presenteado com uma performance superlativa de Georgina Castro (Corpo Elétrico, 2017), talvez no seu primeiro papel de maior destaque no cinema. Os dois possuem química juntos, revelando uma sintonia de olhares e gestos. É fácil acreditar neles enquanto casal, assim como também é perceptível a angústia de um e o sofrimento da outra. O diretor, no entanto, decide ir além, e por não se contentar com algo mais simples – a existência ou não de culpa do protagonista – ele aumenta o escopo da discussão, incluindo questionamentos que vão desde o embate entre verdade e mentira, coragem ou fraqueza, justiça ou covardia. Permite-se, portanto, que a esfera mais íntima ultrapasse os limites do embate entre essas duas pessoas. Ao mesmo tempo em que amplia-se a discussão, ela também se perde em uma falta de foco.

Mesmo com menos de 90 minutos de duração, Blitz também carece de uma edição mais objetiva. Com uma montagem mais direcionada, sem perder tempo em flashbacks caricatos que pouco acrescentam ao debate proposto – a participação do padre, que antes é como um anjo, para depois renegá-los sem direito a perdão, deveria servir como crítica, mas apenas reforça estereótipos batidos – a mensagem teria tudo para ser mais eficiente. O cenário estava montado, e propício para ressonar com força na audiência. Do jeito que está, mantém seus maiores méritos, porém envolvidos por distrações menores mais redundantes do que elucidativas para o debate em desenvolvimento. E as reviravoltas de última hora, assim como os esclarecimentos necessários, se fazem presentes meio que a tropeços. Tem seu valor, é evidente, mas mais do que provocar real impacto, o que se percebe é um potencial que merecia ter sido melhor explorado.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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