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Sinopse

Um grupo inusitado de heroínas (ou seriam anti-heroínas?) formado por Arlequina, Canário Negro, Caçadora, Cassandra Cain e a policial Renée Montoya. Essas cinco fantabulosas mulheres precisam se unir para defender Gothan da ameaça de um criminoso que pretende destruir a cidade.

Crítica

Essa não é a primeira vez que as Aves de Rapina, populares nos quadrinhos, chegam ao audiovisual. No entanto, se a estreia foi na série de televisão Birds of Prey (2002), que teve lançamento discreto e durou apenas uma temporada, a transposição agora para os cinemas em Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa é cercada de muito mais pompa e circunstância. Primeiro que, após o sucesso de títulos como Mulher-Maravilha (2017) e Capitã Marvel (2019), o público parece estar mais disposto a conferir histórias de super-heróis estreladas por mulheres. E segundo, pois vem na esteira do impacto da personagem criada por Margot Robbie no frustrante Esquadrão Suicida (2016) – ela foi, basicamente, a única coisa boa que se salvou daquele filme (e a Maquiagem, inacreditavelmente premiada com o Oscar, mas isso é melhor esquecer). Sim, pois este filme é tanto uma sequência – está completamente conectada aos eventos mostrados previamente – como também uma trama de origem. A escolha dupla parece ser ambiciosa, mas acaba se saindo razoavelmente bem – ao menos, melhor do que o esperado.

A diretora Cathy Yan (premiada em Sundance pelo independente Dead Pigs, 2018) e a roteirista Christina Hodson (do divertido Bumblebee, 2018, mas também responsável pelos tenebrosos Paixão Obsessiva, 2017, e Refém do Medo, 2016), diante das tantas – e quase inúmeras – escolhas equivocadas de Esquadrão Suicida, ao invés de tentarem reinventar a roda, optaram por um caminho mais simples: partem de um universo já conhecido para desenhar novas possibilidades, ousando apenas dentro de um limite controlado. Aves de Rapina, portanto, começa exatamente no ponto em que vimos Arlequina (Robbie) pela última vez, sendo abandonada pelo seu ex-amante, o Coringa (o nome do vilão é citado diversas vezes durante a trama, mas, felizmente, em nenhum momento o arremedo desenhado por Jared Leto chega a dar as caras – é importante esclarecer que o cenário aqui é outro, diverso da realidade alternativa ilustrada em Coringa, 2019). Quando estava com o namorado, ela era praticamente intocável e livre para fazer qualquer maluquice. Uma vez solteira, todos os seus inimigos, que até então se viam obrigados a permanecer calados, se veem liberados para partirem em busca de uma vingança. É quando ela se dá conta que não poderá seguir atuando sozinha por muito tempo.

Neste ponto, já passado cerca de um terço do longa, o espectador nota que o filme é muito mais Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa e menos Aves de Rapina – ou seja, o subtítulo é mais sincero do que o batismo original, pois esse diz respeito a algo que só poderá ser conferido no final dos acontecimentos. Afinal, quem serão essas mulheres que formarão um grupo de vigilantes em Gotham City? Qual será o grau de envolvimento de Arlequina nessa ideia? E como Batman permitirá que tais eventos se sucedam bem debaixo do seu nariz? Bom, apenas duas dessas três questões serão respondidas. É quando os interesses se dividem entre a Caçadora (Mary Elizabeth Winstead), que se tornou uma assassina implacável após a morte dos pais, a oficial Renee Montoya (Rosie Perez, voltando a uma produção de maior visibilidade anos após sua indicação ao Oscar pelo drama Sem Medo de Viver, 1993), a única da força policial disposta a enfrentar um novo chefão do crime, a cantora Dinah Lance, também conhecida como Canário Negro (Jurnee Smollett-Bell, de Mãos de Pedra, 2016), que guarda uma herança talvez pesada demais para ela, e a adolescente Cassandra Cain (Ella Jay Basco, de séries como Grey’s Anatomy, 2013, e Veep, 2017). Aliás, é justamente nela em que as atenções se concentram.

E por quê isso? Pelo simples fato da jovem ladra não apenas roubar quase que ao acaso um valioso diamante, como termina por engoli-lo, pois acredita que essa será a única maneira de mantê-lo consigo. Isso não apenas a torna motivo de busca de Arlequina (que quer caçá-la), Montoya (que quer protegê-la) e Canário (que busca alertá-la dos perigos), como também do maior vilão da história, um adoravelmente histriônico Ewan McGregor – não fosse o enredo tão absolutamente feminino (algo digno de comemoração), o ator certamente estaria ainda mais solto e irresistível. Na pele do icônico Máscara Negra – ou Roman Sionis, como se apresenta socialmente – ele acaba servindo de ponto de conjunção para as protagonistas. Umas querem eliminá-lo, outras pensam em simplesmente se livrar dele, enquanto que as mais idealistas sonham com a possibilidade de colocá-lo atrás das grades. Diante de tantas intenções, chega a ser até um pouco frustrante e anticlimático o destino que o personagem recebe.

Este, no entanto, não é o único percalço da produção. A narração de Arlequina, que acompanha a história do início ao fim, chega a ser excessiva em alguns momentos - assim como a constante urgência para que tudo vire uma piada, mesmo que às vezes essa não faça o menor sentido. Da mesma forma, a idas e vindas temporais começam bem, para logo se tornarem repetitivas e desnecessárias – um recurso que, ao invés de original, se vê transformado em uma bengala incômoda. Mas Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa, felizmente, é mais do que isso. E muito se deve ao entrosamento do elenco feminino. Mais comportada do que se imaginava, Margot Robbie funciona bem como fio condutor não apenas do novo time, mas também confirmando seu imenso carisma e talento. E se figuras como Chris Messina e Ali Wong (Meu Eterno Talvez, 2019) acabam desperdiçadas, é porque há, mesmo, muitos elementos reunidos para garantir que, ao menos na média, o conjunto seja positivo. Se este era o objetivo, é com tranquilidade que se verifica que a missão foi cumprida. Mas ainda há muitos passos a serem dados para que o Universo Estendido DC nos cinemas se consolide. Felizmente, agora que elas estão assumindo o controle, talvez essa transição dos gibis para a tela grande se dê de forma mais efetiva.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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