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Sinopse

Moradora de um orfanato gerido com mão de ferro pela senhora Hannigan, Annie tem sua vida mudada ao ser escolhida para passar dias na mansão de um milionário. Ela acaba fazendo amizade com os funcionários locais.

Crítica

Depois de duas versões anteriores – uma lançada em 1982 e dirigida por John Huston e outra feita para a televisão em 1999 por Rob Marshall – o musical Annie volta às telas. E qual o diferencial deste novo filme para os anteriores? Além das situações apresentadas terem sido bastante infantilizadas, o que mais chama atenção foi o fato dos principais personagens deixaram de ser brancos para se tornarem negros. Para se ter uma ideia, se no original feito há mais de trinta anos a protagonista era interpretada pela ruivinha Aileen Quinn, tem-se agora à frente do elenco a talentosa Quvenzhané Wallis, atriz que aos nove anos de idade despertou a curiosidade do mundo inteiro ao estrelar o independente Indomável Sonhadora (2012). Para o seu estrelato, essa nova oportunidade até que vem a calhar. Mas de resto, nada mais se justifica.

Antes de mais nada, é preciso ter em mente os porquês por trás dessa produção. Há alguns anos o astro Will Smith decidiu premiar seus dois filhos menores, Jaden e Willow, com remakes de antigos sucessos. Para o menino o escolhido foi Karate Kid (2010), enquanto que para a garota a opção foi... Annie! No entanto, ocupada com sua carreira também como cantora (é dela o insuportável hit ‘Whip My Hair’) e com os atrasos para a liberação dos direitos do clássico para uma refilmagem, ela acabou ficando velha demais para o papel. Foi assim que se abriu espaço para Wallis, recém descoberta após sua passagem pelo Oscar. E o papai Smith se contentou com o papel de produtor do novo filme, tarefa que desempenha ao lado da esposa, Jada Pinkett Smith. A redução da interferência do casal no processo fica evidente na tela: ao invés de uma obra para todos os públicos, temos um longa voltado para uma parcela bem específica da audiência.

Annie é uma pequena órfã que mora com mais algumas meninas em mesma situação na casa da Sra. Hannigan (Cameron Diaz, pagando mico num papel que chegou a ser interpretado por Kathy Bates anteriormente), uma aproveitadora que apenas tolera as crianças para receber o dinheiro da ajuda do estado. As coisas mudam quando Annie esbarra em Will Stacks (Jamie Foxx), empresário milionário e candidato à prefeitura. O encontro dos dois acaba atraindo uma grande popularidade para ele, que vê sua posição nas pesquisas junto ao eleitorado melhorar do dia para a noite. Com isso, ele decide adotá-la, num primeiro momento pensando no retorno político. Mas é claro que logo a relação entre os dois se tornará especial, movida por sentimentos verdadeiros. Que, ainda mais óbvio, serão ameaçados por um golpe trapaceiro, mas nada radical a ponto que não possa ser corrigido a tempo.

Mesmo que o resultado nas bilheterias não tenha decepcionado, o novo Annie parece um filme deslocado do seu tempo. Wallis tem desenvoltura suficiente para sustentar a trama, mas essa, por outro lado, é fraca e sem reviravoltas ou acontecimentos minimamente interessantes. Tudo é bastante óbvio, e os exageros são tão escancarados que não permitem espaço para nenhum tipo de interpretação além da leitura mais evidente. Não há profundidade nos personagens, suas motivações são simplistas e ninguém parece estar minimamente preocupado em fazer qualquer tipo de esforço contrário. Bobby Cannavale – o assessor do candidato que se revela o maior vilão da história – em nada lembra o bom ator de filmes como Blue Jasmine (2013) e O Agente da Estação (2003), em uma interpretação caricata e difícil de engolir. Já a mocinha Rose Byrne adiciona mais um tipo sem sal nem pimenta ao seu currículo, pelo qual é difícil de torcer.

Para completar, o fato mais agravante: Annie é um musical de sucesso da Broadway. Infelizmente, o longa só está sendo exibido no Brasil em cópias dubladas em português. Ou seja, apesar de se tratar de uma produção de um gênero em que o talento vocal é fundamental para determinar seu sucesso, os espectadores brasileiros estão sendo privados de conferir as vozes originais dos intérpretes. No lugar, uma dublagem pouco inspirada, feita às pressas e sem maiores cuidados. Canções marcantes como It’s the Hard-Knock Life, Tomorrow e a nova Opportunity (indicada ao Globo de Ouro) deixaram de existir, e no seu lugar são ouvidas versões pobremente traduzidas e sem graça. Portanto, a recomendação é evitar esse filme nos cinemas com todas as forças. Aos fãs do original, o melhor conselho é aguardar o lançamento em home vídeo ou quando estiver disponível on demand. Ou então desligar totalmente o cérebro – e os ouvidos, de preferência – pois do jeito que aqui está sendo apresentado nada faz (muito) sentido.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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