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Sinopse

O excêntrico magizoologista Newt Scamander chega à cidade de Nova York com sua maleta, um objeto mágico onde ele carrega uma coleção de fantásticos animais do mundo da magia que coletou durante as suas viagens. Em meio a comunidade bruxa norte-americana, que teme muito mais a exposição aos trouxas do que os ingleses, Newt precisará usar suas habilidades e conhecimentos para capturar uma variedade de criaturas que acabam ficando soltas.

Crítica

Como desprezar o valor dos números? Exatos cinco anos se passaram desde a estreia do último longa da saga Harry Potter (Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 2, 2011), dez desde o lançamento deste mesmo livro e quinze desde o início deste jornada na tela grande, com Harry Potter e a Pedra Filosofal (2001). Com quase US$ 8 bilhões em caixa (apenas com os filmes, deixando de lado livros, videogames, parques de diversão e toda a parafernália que acompanha o personagem), é quase impensável imaginar que havia se chegado, enfim, ao... fim. Então, após um breve período de respiro, o mundo mágico criado pela escritora J. K. Rowling está de volta aos cinemas com Animais Fantásticos e Onde Habitam, filme que é menos uma prequel (uma trama que se passa antes dos eventos mostrados nos longas anteriores) e mais um spin off (uma história paralela ao que conhecemos sobre esse universo). A grande questão, no entanto, é se essa aventura se justifica além dos evidentes motivos puramente mercadológicos. A resposta, uma vez conferida a produção, infelizmente é bastante óbvia.

Estamos em 1926, algumas décadas antes de Harry Potter receber a visita de Hagrid para levá-lo à Escola de Magia Hogwarts. Deixa-se de lado também a Inglaterra e muda-se o cenário para os Estados Unidos. Quem acaba de chegar ao porto de Nova Iorque é Newt Scamander (Eddie Redmayne), jovem que foi expulso da mesma Hogwarts alguns anos antes (o único professor que o defendeu foi... Alvo Dumbledore) e que hoje leva a vida procurando a pesquisando a vida de animais e outros seres mágicos. Quanto mais exóticos, na sua opinião, melhor. Há um grande preconceito contra eles, e a prática mais comum é eliminá-los. Scamander prefere entendê-los e, assim, aprender com eles. Seu objetivo final é escrever um livro didático a respeito – este mesmo volume, como já se sabe, receberá o título Animais Fantásticos e Onde Habitam, se servirá como material de sala de aula de Harry e seus colegas no futuro.

Curiosamente, a obra existe também nas nossas livrarias: foi escrita por J. K. Rowling e lançada como complemente aos sete tomos sobre a jornada de Potter. Nele, no entanto, não há um enredo – é exatamente como seria um livro didático. Portanto, a tarefa a ser desempenhada não era exatamente uma adaptação, e sim a recriação de algo original a partir de um argumento bastante escasso. Temerosa do que fosse surgir a partir de diretrizes tão amplas, a própria Rowling resolveu assumir uma nova função: pela primeira vez, assinou também o roteiro do filme. No entanto, se por um lado pode ocorrer de autores transporem suas obras de um meio para outro com competência (um bom e recente exemplo é o que Gillian Flynn fez com seu Garota Exemplar, 2014), sabe-se de antemão que casos assim são raros e bastante específicos. Exatamente o que acontece por aqui.

Rowling parece tão excitada de retornar a este mundo que lhe é tão familiar, porém sob um diferente ponto de partida, que acaba deixando de lado arquétipos narrativos fundamentais, como a jornada do herói ou a construção do seu antagonista. Scamanter chega a Nova Iorque com uma maleta recheada de bichos mágicos. Uma pequena confusão libera um ou outro destes seres, o suficiente para que a confusão se instaure. Há algo mais sério a preocupar o Ministério da Magia, no entanto: uma ameaça muito poderosa e aparentemente invisível tem se manifestado, causando destruições e mortes. Caso seja revelada, os humanos ficariam a par da existência dos bruxos e magos, e teme-se que tal revelação leve as duas comunidades à guerra. Porém, ao invés de uma investigação séria a respeito do que está acontecendo, mais simples parece ser culpar o novato e suas criaturas.

O Newt Scamander de Eddie Redmayne combina os mais notórios maneirismos do ator, como seu jeito estranho de evitar olhares e fala pausada, como visto em seus trabalhos mais conhecidos: A Teoria de Tudo (2014) e A Garota Dinamarquesa (2015). O pescoço arqueado para o lado, a vista enviesada e trejeitos afeminados lhe dão mais o ar de esquisito e desajeitado do que o de herói de ocasião, como parecia ser a intenção. É de se perguntar se uma figura como essa seria capaz de se aproximar e reunir tamanha coleção de bestas. Sua colega, a ex-auror Tina Goldstein, recebe uma interpretação sem ânimo de Katherine Waterston. Se a ligação entre os dois nunca chega a dar química, fica fácil para os coadjuvantes cômicos – o ‘no-maj’ (não mágico, ou como os ingleses chamam, ‘trouxa’) Jacob Kowalski (Dan Fogler), e a leitora de mentes Queenie (Alison Sudol, da série Transparent, 2014) – roubarem a cena. A cada entrada dos dois a atenção da plateia é naturalmente capturada, a ponto de que o grande desenlace romântico acaba sendo o deles, e não o dos protagonistas.

Outros problemas no elenco vão sendo percebidos com o desenrolar da história. Colin Farrell, como o braço direito da Sra. Presidente, cria um personagem tão antipático que logo fica evidente ter outras intenções além daquelas reveladas de início. Tipos como Samantha Morton (líder da seita Nova Salém), Ezra Miller (um dos filhos da fanática), Ron Perlman (um elfo traficante) e Jon Voight (empresário dono de uma cadeia de jornais) acabam sendo tão mal utilizados que suas presenças nunca chegam a se justificar, funcionando mais como distrações ao espectador do que como um elemento motor da trama. Por fim, há o que se dizer sobre os efeitos especiais, que além de pouco originais, servem mais para afastar do que para proporcionar um sentimento de imersão na audiência. É tanta coisa sendo jogada na direção do público – e tão pouco a ser explorado na profundidade dos cenários ou dos ambientes criados – que a redundância termina por gerar grande desconforto. Talvez o único momento que foge desse desgaste seja a primeira visita ao interior da maleta, uma passagem realmente encantadora, ao contrário de outras desnecessárias, como a caça ao hipopótamo gigante pelo zoológico, por exemplo.

David Yates, realizador protocolar dos quatro últimos longas da saga Harry Potter – e também do constrangedor A Lenda de Tarzan (2016) – não apenas reprisa sua performance sem inspiração neste Animais Fantásticos e Onde Habitam, como também já se confirmou na condução de suas já anunciadas quatro sequências (serão cinco filmes ao todo, sendo o segundo previsto para 2018). A notícia, ao invés de causar regozijo, apenas aumenta a frustração em torno do desgaste de um universo que aparentemente teria muito a oferecer, mas que diante do que aqui é visto parece ter se contentado com mais do mesmo. Há poucos animais fantásticos neste filme – a trama central não diz respeito a nenhum deles – e muito menos se descobre onde eles habitam (não há viagens exploratórias e nem jornadas repletas de perigos). Tem-se, apenas, um jogo de ilusões que nem chega a ser tão misterioso assim, e mesmo as regras anunciadas sobre ele logo são quebradas. Percepção essa que serve, acima de tudo, para indicar o pouco caso de seus realizadores com o conteúdo que tinham em mãos.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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