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Sinopse

Com o casamento marcado, Paula decide organizar uma despedida de solteira nada convencional. Junto de seus amigos mais próximos, pretende passar uma noite na casa de uma celebridade da década de 80 que oferece chá de Ayahuasca para seus convidados. A experiência catártica acaba fazendo com que ela pondere algumas coisas em sua vida. A partir de então, Paula parte para a busca de sua identidade, na tentativa de ressignificar sua existência.

Crítica

Em termos de efetividade e potência, não há no decurso de Amor Líquido uma cena, sequer, próxima daquela que o inaugura. Nela, Paula (Paula Liberati) é vilipendiada por diversas intervenções simbólicas que visam apronta-la ao casamento. A maquiagem, o despir e o vestir com ares de brutalidade encontram ressonância no semblante angustiado da atriz. É uma bela metáfora do peso considerável que o vínculo traz à mulher. Todavia, após essa abertura figurativamente incisiva, o longa-metragem livremente inspirado nos escritos de Zygmunt Bauman oferece uma jornada enfadonha, marcada por circunstâncias que não se coadunam a fim de gerar discursos substanciais. Acossada pela dúvida do que fazer para pontuar sua despedida de solteira, isso na festa debilitada pela artificialidade, a protagonista decide aceitar a sugestão dos amigos presentes. Forma-se um grupo para experimentar o famigerado chá de ayahuasca, bebida enteógena produzia a partir de plantas.

O cineasta Vítor Steinberg propõe uma encenação engessada, penalizando o andamento da trama. Não há, também, densidade considerável no que tange às motivações dos personagens. Todos parecem absolutamente postiços e movidos por questões simplórias e/ou levianas, sem desenvolvimento. Diante de um guru que lhes explica os trâmites da viagem interior propiciada pela beberagem amazônica, nenhum deles vai além de observações ordinárias, sem qualquer peso dramático. Denominada como o Ato 1 de Amor Líquido, a primeira metade tem uma estranha conjunção de aspectos imagéticos heterogêneos, vide os planos filmados com lentes grande angulares sendo atrelados aos de morfologia completamente distinta, sem que haja motivo para a operação. O efeito do chá é diferente para cada um dos presentes. A uns, propicia visões eróticas, a outros, alucinações com a vida conturbada nas metrópoles. Todavia, pouco se encaixa, tudo soa aleatório demais.

Amor Líquido perde o pouco de sua relevância quando iniciado o Ato 2, com Paula desorientada após a vivência no interior. Sabemos de relance que ela desmarcou o noivado, permanecendo numa instância de indeterminação. Até esse ponto, os conceitos do autor polonês, que escreveu sobre a liquidez dos relacionamentos, são pifiamente acessados. A menção direta a eles ocorre na consulta da protagonista com um psicanalista, instante em que a afetação do longa se agiganta. Diante da paciente chorosa que externa dificuldades de readequação após o suposto episódio de iluminação, o profissional profere platitudes, recorrendo a lugares-comuns e a frases do tipo “se você conseguir colocar uma camisinha no pinto do rapaz e uma em seu coração, tudo certo”, para se referir à proteção contra vínculos passíveis de provocar dor. Na dinâmica registrada num simplório plano/contraplano, o realizador afunda o que até ali restara.

Vítor Steinberg tampouco dá conta de desenhar a confusão existencial de Paula quando esta engrena a sua guinada. Para amplificar o desconforto contraproducente, há a conversa entre três senhoras à beira da piscina, entre elas a grande Helena Ignez. O colóquio não leva a lugar algum, servindo tão e somente para esticar a duração do filme. Muito longe de fundamentar-se solidamente na liquefação dos amores a que Zygmunt Bauman se referiu como nenhum outro autor, a produção apresenta um caminho tortuoso, repleto de inconsistências que determinam a debilidade sobressalente. Não há explicação, por exemplo, para as “viagens” dos amigos serem equivalentes à da figura principal, uma vez que eles são completamente apagados do restante da trama, cabendo à Paula Liberati carregar o conjunto praticamente nas costas, inclusive contra os anseios diretivos incapazes de expressar a potência do que está na superfície, e, mais ainda, do presente no recôndito. Falta, além de tudo, tônus às personalidades e aos encadeamentos das incertezas.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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