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Sinopse

​Boêmio. Provocador. Sedutor. Revolucionário. Além de idealizador do Pasquim, Tarso de Castro foi um dos maiores jornalistas do Brasil. Ao investigar sua vida, a recente história do país e o retrato de uma geração que viveu sonhos extraordinários vêm à tona.​

Crítica

Até quem não é estudioso do mundo da imprensa, mas já passou dos 40 anos, conhece a irreverência do jornalista gaúcho Tarso de Castro. Nascido em Passo Fundo, tido como celebridade no bairro de Ipanema, no Rio de Janeiro, ele é lembrado em depoimentos que oscilam entre a paixão e o ódio. As sensações que causava nas pessoas, seja nas cotidianas ou mesmo nos leitores dos seus sempre ácidos textos, são reflexos de sua personalidade. Talvez por isso, produzir A Vida Extra-ordinária de Tarso de Castro exigiu dos realizadores um misto de liberdade, poesia e organização.

O documentário dirigido e roteirizado por Leo Garcia e Zeca Brito chega ao espectador de mansinho, ao som da canção Detalhes, de Roberto Carlos. O romantismo exacerbado da letra que parece descrever Tarso em seus tempos de juventude, cabeludo e sedutor, é interrompido pela entrada da imagem do repórter Ernesto Varela, personagem de Marcelo Tas no programa Olhar Eletrônico, da TV Gazeta, inquirindo Tarso sobre sua fama de polêmico. O jornalista desconversa e parece mais interessado em mencionar os dotes físicos de uma das moças presentes no recinto. Essa fala dá uma ideia da maneira como Tarso de Castro encarou a vida e a carreira: sem preocupações com ofensas, e perdidamente apaixonado por garotas que acabara de conhecer.

A mistura de entrevistas despojadas, fotos, imagens de arquivo e também algumas cenas de filmes brasileiros que foram sucesso na época mais produtiva da carreira de Tarso, os anos 60, não é apenas para sintonizar o espectador com o período que o documentário abrange. São pedaços de ficção que traduzem a realidade do personagem dissecado. A inserção de excertos de Todas as Mulheres do Mundo (1966), clássico do diretor Domingos Oliveira, faz pensar se não houve inspiração nos arroubos amorosos de Tarso para a criação do personagem interpretado por Paulo José. Ambos são paradoxos ambulantes, confundindo inclusive as pessoas mais próximas. Se para a mãe e a ex-mulher ele é definido como um homem caridoso, para alguns de seus amigos, como o cartunista Jaguar, ele era genial, mas sem um pingo de caráter. O número grande de desafetos conquistados fez com que Tarso fosse quase apagado da memória de um dos jornais mais importantes do país. Apesar de ter sido crucial à criação de O Pasquim, Tarso de Castro não se faz presente em pesquisas sobre a publicação, devido a sua briga com Millôr Fernandes e Paulo Francis, um dos assuntos centrais do documentário.

A Vida Extra-ordinária de Tarso de Castro segue a linha de um exemplar contemporâneo, Torquato Neto: Todas as Horas do Fim, de Eduardo Ades e Marcus Fernando, por igualmente associar um personagem insólito da cultura brasileira a trechos de importantes filmes do nosso cinema. É quase como um caderno de anotações em que a arte se mistura com a vida. No caso de Tarso de Castro, não havia linha divisória e a redação de jornal era a extensão do bar, que, por sinal, era a sua casa. Nesses locais ele fazia amigos, inimigos, descobria histórias, garantia a manchete do dia seguinte e bebia muito uísque. Ah, e falava bastante ao telefone. A ideia de colocar alguns entrevistados usando um aparelho celular durante as entrevistas foi uma sacada bem-humorada que com certeza seria aprovada por Tarso.

Sem julgar ou sugerir que seu personagem deva ser endeusado, A Vida Extra-ordinária de Tarso de Castro nos convida a pensar se tanto o jornalista quanto os seus companheiros de noitadas e redações iriam reagir nesse tribunal sem lei que tornou-se a internet. Uma pergunta difícil de responder, assim como é árduo definir Tarso de Castro.

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é jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Com diversas publicações, participou da obra Uma história a cada filme (UFSM, vol. 4). Na academia, seu foco é o cinema oriental, com ênfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questões fílmicas e antropológicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands.
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